Uganda. A história das ADF, grupo assassino que aterroriza os ugandeses
Cidade do Vaticano
As ADF (Forças Aliadas Democráticas) têm uma história complexa e também têm mudado de nome várias vezes. Foram fundadas por volta de 1995, com a fusão de dois grupos, cada qual com bases ideológicas diferentes.
Os primeiros membros da rebelião ADF haviam sido antes membros da seita Tabligh, ativa na Uganda desde pelo menos a década de 1970, e que havia iniciado a receber apoio financeiro do Sudão após a expulsão de Idi Amin em 1979.
Esta comunidade teve origem na Índia governada pelos britânicos no início do século XX, como movimento conservador para revigorar os valores e práticas islâmicas, pondo uma forte ênfase no trabalho missionário, chamado Tabligh. Enquanto a maior parte dos adeptos do Tabligh é contrária ao jihadismo, alguns dos seus membros por vezes têm aderido a grupos violentos.
Na Uganda, alguns membros da seita Tabligh associaram-se ao Salafismo, ao ponto de alguns membros terem ido à Arábia Saudita para estudar, graças a bolsas de estudo especiais. Entre eles estava Jamil Mukulu, que mais tarde se tornaria o líder do ADF. Nascido numa família cristã, converteu-se ao Islão na juventude e foi a Riad para estudar, voltando com uma visão militante do Islão.
Depois de ter sido preso pelas autoridades locais em 1994, Mukulu foi solto e fundou o Movimento dos Combatentes Ugandeses para a Liberdade (UFFM, sigla em inglês) em Hoima, oeste da Uganda, recebendo apoio do governo sudanês, na altura em forte desacordo com o governo da Uganda.
Quando os seus acampamentos foram invadidos pelo exército da Uganda em 1995, Mukulu fugiu para o Quénia, enquanto um outro líder da UFFM, Yusuf Kabanda, transferiu o grupo para o leste do então Zaire, hoje República Democrática do Congo. Aqui Kabanda formou uma aliança com o Exército Nacional para a Libertação de Uganda (NALU, sigla em inglês), um grupo rebelde ugandês com uma ideologia diferente em relação à primeira formação.
O NALU retomou a precedente rebelião ugandesa de Rwenzururu, cujo objetivo era restaurar o poder consuetudinário das comunidades Bakonjo e Baamba, no Uganda ocidental. Estes grupos étnicos estão respectivamente afiliados aos grupos étnicos Nande e Talinga do leste da RDC, com quem partilham idiomas e cultura.
Da união dos dois grupos nasceu a ADF-NALU, que se inseriu nas complexas dinâmicas do leste da RDC, tendo sido cooptada pelo Presidente zairense Mobutu Sese Seko para combater uma guerra por procuração contra o regime ugandês de Yoweri Museveni . Após a queda de Mobutu, as ADF-NALU tiveram de se deslocar ao agrupamento Bambuba-Kisika no norte da cidade de Beni, onde estabeleceram relações com a população Vuba. Muitos Vuba se uniram ao ADF-NALU, enquanto os líderes rebeldes se casaram com mulheres desta etnia, e iniciaram colaborações no campo fundiário e nos tráficos de ouro e madeira.
Depois de altos e baixos em 2007, a componente laica da rebelião ugandesa (o grupo NALU) abandonou a luta armada, graças a um acordo com o governo ugandês sobre o reconhecimento do reino de Rwenzururu. A liderança do ADF acentuou o impulso islâmico radical, adotando um regime estrito baseado na Sharia nas suas fileiras.
Em reação às operações dos militares congoleses para tentar neutralizar as ADF agora estabelecidas entre o Kivu do Norte e Ituri (duas províncias do Leste do Congo), estas responderam com represálias atrozes contra a população civil. Entre outras coisas, durante as incursões contra aldeias congolesas, várias crianças são raptadas para depois serem recrutadas para as fileiras das ADF, ao ponto de o grupo, embora continue a ter uma liderança de origem ugandesa, ter vários congoleses, entre soldados ainda crianças e outros que já se tornaram adultos.
Apesar da acentuação do caráter “islamista” do seu grupo, as ADF têm continuado a colaborar oportunisticamente com outros grupos armados locais, como a milícia Vuba, e mesmo por vezes com o exército congolês. Em 2019, o ADF anunciou a sua afiliação com o Estado Islâmico, dando-se uma nova sigla Madina a Tauheed Wau Mujahedeen (MTM, "A cidade do monoteísmo e daqueles que o afirmam") e divulgando vídeos de propaganda em Kiswahili, Uganda, árabe, francês e kinyarwanda, a fim de alcançar um público mais amplo na África Oriental.
As ligações entre o ADF e o Estado Islâmico não são apenas de tipo propagandístico. Até agora se tem pensado que este último se limitava a reivindicar algumas das ações da ADF definidas como a sua “província da África central” (ISCAP, em inglês). Mas um relatório da ONU publicado nos meados de junho de 2023 afirma que o Estado Islâmico "tem prestado apoio financeiro ao ADF pelo menos desde 2019, através de um complexo sistema de financiamento que envolve indivíduos em diferentes Países do Continente, vindos da Somália e passando pela África do Sul, Quénia e Uganda”.
Além disso, as ADF “têm enviado combatentes e/ou colaboradores em missão de reconhecimento para tentar alargar a sua área de atuação para além das províncias de Kivu do Norte e Ituri”, planificando ataques até à capital congolesa, Kinshasa – com agência Fides.
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