Cabo Verde: Docente brasileiro analisa cartas e sermões de Pe. Vieira para universitários
Silvonei José e Andressa Collet – Cidade do Vaticano
Ele é um dos grandes personagens do século XVII quando se trata de literatura e de política – por defender, por exemplo, os direitos dos escravos e dos índios através da evangelização: Padre Antônio Vieira tem uma extensa obra escrita, valorizada até hoje por traduzir o pensamento e a genialidade de um grande orador.
Seus sermões e cartas ainda hoje são objetos de estudo nas universidades. Leandro Garcia, doutor brasileiro em Ciência da Religião e professor na Universidade Federal de Minas Gerais, esteve em Cabo Verde em dezembro para o lançamento de um livro que ajudou a organizar e que, além da presença do Brasil naquele país, aborda a passagem do missionário por Cabo Verde.
“Vários projetos de arquitetura em Cabo Verde são do nosso arquiteto Oscar Niemayer, o nosso cantor Tom Jobim fez várias parcerias com cantores de Cabo Verde... E, de uma forma muito longínqua, no séc. XVII, o Padre Antônio Vieira, nosso grande missionário, numa viagem entre Portugal e o Brasil, exatamente no Natal de 1652, fez uma parada em Cabo Verde porque o navio dele foi atacado por piratas. E, nisso, a frota foi desviada até Cabo Verde, onde passou um mês por lá, período em que escreveu uma série de cartas, chamadas Cartas de Cabo Verde.”
O prof. Leandro, então, analisa essas dez grandes correspondências do jesuíta num ensaio publicado na edição diplomática da Embaixada Brasileira em Cabo Verde:
“Essas cartas são de importância histórica para a história de Cabo Verde e para a história inclusive da língua portuguesa difundida em Cabo Verde. Isso porque ele escreve para o bispo do Japão na época, que era jesuíta; para o superior da Companhia de Jesus, em Roma; para o superior provincial que estava em Lisboa. Esses três destinatários ficaram sabendo como era Cabo Verde, ou seja: aspectos humanos, de antropologia, de fé, de sincretismo religioso, do apreço pela música. Tudo narrado minuciosamente por Pe. Vieira nessas cartas que são imensas, de 20 páginas. Os primeiros grandes documentos sobre Cabo Verde são as cartas de Pe. Vieira.”
Além do lançamento da obra, o prof. Leandro também ministrou o curso “Epistolografia com Literatura” na universidade local (UNI-CV) sobre a presença do catolicismo na literatura brasileira e deu uma palestra sobre a presença de Pe. Vieira em Cabo Verde (“Antônio Vieira e o Mundo Colonial – entre o Brasil e Cabo Verde”).
“Para mim é uma das mais ricas expressões literárias que tivemos no Brasil e em Portugal, porque há uma certa briga entre os portugueses e os brasileiros a quem ele pertence. Eu vou chamá-lo de autor brasileiro porque 90% da produção literária dele foi no Brasil. E os sermões do Pe. Vieira são únicos! O Pe. Vieira, cronologicamente, está dentro do universo barroco e o pensamento dele é um pensamento muito complexo, muito marcado pelo ‘conceptismo’, que é um jogo de ideias, contrárias, pra se chegar a um denominador comum – isso é muito típico do barroco. Toda ‘sermonística’ do Pe. Vieira, que é um gênero da literatura, através dos sermões barrocos, e a epistolografia, ou seja, as cartas dele, são marcados por esse pensamento complexo, próprio do tempo dele. Isso porque o barroco não é a linearidade, o barroco é a complexidade não só de pensamento, mas artística também.”
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