Religiosa síria teme massacre de civis em Idlib
Marco Guerra e Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
O elevado nível de tensão na Síria reflete-se também nas relações internacionais, visto há muito o conflito ter deixado de ser um conflito local ou regional.
O Exército sírio, apoiado pelos russos e milícias xiitas, está prestes a lançar uma ofensiva contra o último bastião da oposição anti-Assad na Província de Idlib. O presidente estadunidense Donald Trump advertiu em um tweet que russos e iranianos cometerão um grave erro caso participem desta possível tragédia humana.
O desenrolar dos acontecimentos na Síria e na região, assim como as questões que serão tratadas na próxima sexta-feira em Teerã, no encontro de cúpula reunindo Rússia-Turquia-Irã também estiveram no centro dos colóquios em Damasco entre o presidente sírio e o ministro do Exterior iraniano Mohammad Javad Zarif.
Assad e Zarif afirmaram que “a pressão exercida por alguns países ocidentais sobre a Síria e Irã não irá dissuadi-los em defender os próprios princípios, os interesses de seus povos e a segurança e a estabilidade de toda a região”.
Teme-se massacre de civis
Sobre o apelo do Papa Francisco no Angelus do último domingo e a situação vivida em Idlib, o Vatican News entrevistou a Irmã Youla Girges, religiosa franciscana síria das Missionárias do Coração Imaculado de Maria, proveniente do povoado cristão de Gassanieh, atualmente controlado por rebeldes islâmicos:
R. – Há sete anos que o Papa não deixa de fazer apelos em favor do povo sírio. O Papa tem no coração toda a humanidade do povo sírio, todos civis. Sabemos que muitas comunidades cristãs ainda estão presentes no Idlib. Teme-se que, como em outros lugares, aconteçam massacres ... O primeiro interesse do Papa é oferecer uma vida digna para todos os civis que há sete anos estão nas mãos dos rebeldes extremistas. Portanto, é um apelo positivo para toda a comunidade internacional promover aquelas negociações de política e de paz, sem violência, sem que outras pessoas tenham que morrer.
A senhora é originária da Província de Idlib, conhece muito bem a região. Qual é a situação nessa área que o governo está preparando para retomar sob seu controle?
R. – Meu povoado, Gassanieh, foi tomado há 5 anos. Foi completamente ocupado pelo ISIS, agora não sabemos que fim levou, mas ao redor existem outros povoados cristãos onde até hoje ainda há comunidades cristãs com os frades franciscanos. Lá eles vivem sob o poder desses rebeldes, seguem sua lei, islâmica, certamente. No meu povoado não há mais cristãos, eles escaparam após o assassinato do padre François Mourad. Quando o mataram, as poucas pessoas que ainda permaneciam trataram de fugir, porque suas vidas estavam em perigo.
Depois de sete anos de guerra, que envolveram também muitas potências estrangeiras, fala-se até mesmo de “guerra por procuração. O que pedem os sírios?
R. - Eles estão cansados, porque não entendem o significado dessa guerra. Eles pedem a paz, pedem à comunidade internacional para intervir para o bem do povo sírio. Eu posso dizer que os cristãos viviam muito bem antes desta guerra. Hoje não, eles têm que viver uma lei que é estranha a nós, uma lei que proíbe ter propriedades, liberdade de expressão, de (celebrar) cerimônias, tudo o que desfrutavam com grande liberdade. Todas as áreas estão em suas mãos e esta é a situação na Província de Idlib, que ainda é ocupada pelos rebeldes.
É possível reconstruir esse mosaico de etnias e religiões que compunham a Síria?
R. – Eu penso que sim, porque com um senso de reconciliação entre nós, entre todas as etnias que foram atingidas, é possível. A guerra na Síria não é uma guerra contra os cristãos, mas contra os sírios. As vítimas são cristãos, muçulmanos, drusos, ismaelitas ... todas as etnias. Sabemos que a Síria era famosa por seu lindo mosaico e quando a paz retornar, poderemos reconstruir e continuar a viver juntos. De fato, em Damasco, nos últimos dois anos, criamos um projeto de apoio psicossocial para as crianças traumatizadas pela guerra, onde crianças cristãs e muçulmanas se reúnem para receber essa ajuda. Eu acho que o fermento que restou será motivo para um renascimento, um fortalecimento do cristianismo que nunca falhou.
Nestes anos, no entanto, houve um êxodo de cristãos. Qual é atualmente a situação da comunidade cristã?
R. - Tantos sírios partiram, não somente os cristãos! Fugiam dos bombardeiros, da violência que havia entrado em suas cidades. Já ouvi várias famílias dizerem que gostariam de voltar assim que a segurança e a paz voltarem à Síria. Nossa cultura é muito rica de vida social, é uma cultura de família. Muitas famílias me disseram que assim que tiver paz, elas voltarão, porque sua vida, nossa sociedade estão lá. Na Europa há outra mentalidade, outro modo de vida. Eu digo que a fé dos cristãos da Síria, durante estes anos de guerra, se fortaleceu mais. Se as pessoas resistiram, é por causa de sua fé. Todos os sírios, quer aqueles que permaneceram na Síria como os que estão fora, são os discípulos de São Paulo. Nós somos os herdeiros da primeira Igreja que começou em Damasco, então temos o dever de manter essa fé viva mais do que nunca.
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