Quaresma: o jejum das redes sociais para crescer na fé
Andressa Collet – Cidade do Vaticano
Para o período da Quaresma, Adriene Bazilio, de Goiânia/GO, decidiu dar mais tempo para estar com Deus, não usando as redes sociais. Ela tem 38 anos, é casada, mãe de dois filhos, assistente administrativa e dona de casa. Não é a primeira vez que faz uma prática penitencial “para poder crescer no amor”, geralmente faz na alimentação: “creio que o crescimento da fé, através dessas práticas, se dá muito mais pela nossa intenção, do que pela escolha do que a gente vai se abster”.
Pausa para Facebook e Instagram
O período de 40 dias de penitência, oração e caridade rumo à Páscoa nos chama a encarnar um período concreto de conversão para podermos viver a beleza do mistério pascal. A escolha de fazer jejum das redes sociais é uma prática penitencial adaptada por muita gente hoje em dia para fortalecer o espírito e a nossa intimidade com Deus, como acontece há anos com o Pe. Arnaldo Rodrigues, da Arquidiocese do Rio de Janeiro:
“Já tem alguns anos que, durante o período da Quaresma, e também no período do Advento, deixo de utilizar algumas redes sociais, como o Facebook e o Instagram. Essa, dentre outras, é uma forma de fazer um pequeno sacrifício, para estar cada vez mais unido com a vida em oração a Deus e também um sacrifício em prol da Igreja e de todas as outras intenções que oferecemos neste período quaresmal. É importante fazer qualquer tipo de prática penitencial para fortalecer a nossa vida espiritual. É uma oportunidade, sobretudo para os jovens, e um conselho para aproveitar este momento para diminuir o uso: uma vez ao dia, ou a cada dois dias, ou uma vez a cada três dias ou uma vez por semana... Mas é importante lembrar que cada sacrifício que faço deve estar unido em oração, pedindo a Deus todos os dias a graça de Deus para poder cumprir.”
O silêncio que se abre com o jejum das redes sociais
Quem também abraça o jejum das redes sociais para fazer uma boa Quaresma e poder celebrar com muita alegria o mistério da Páscoa é Letícia Schäfer. Natural de Cruzeiro/SP, hoje ela mora em Berna, na Suíça, mas desde o Brasil, quando participava de um grupo jovem da sua paróquia, aceitou a sugestão de um padre local para ficar longe da mídia social: “foi ótimo manter esse silêncio interior que abriu tanta porta para a oração”, disse ela. Letícia é ex-funcionária dos Museus Vaticanos e atualmente trabalha numa ONG internacional (Mercy Ships):
“Além das redes sociais, eu procuro fazer o jejum físico das bebidas alcóolicas e das sobremesas. E às vezes é muito difícil porque você é convidado para um jantar, alguém te oferece um vinho, mas são muito pequenas as ofertas, fazem esse exercício interior de generosidade, de sacrifício. Eu também faço o jejum espiritual das reclamações, murmurações, de falar mal, às vezes de brigar com meu marido ou com alguém, e esse é o jejum mais difícil. Um sacrifício que realmente você sente a presença do Espírito Santo que te ajuda também a realizar esses propósitos. Cada um tem que fazer um exame de consciência antes da Quaresma, pra poder oferecer um sacrifício verdadeiro e fecundo a Deus.”
O tesouro da caridade que também transforma
Letícia já participa da missa todos os dias e busca rezar o rosário o ano inteiro. Durante a Quaresma ainda faz meditações, leituras bíblicas e confissões mais frequentes, além de se dedicar para o tesouro da caridade. Este ano, se propõe ao trabalho voluntário junto aos idosos:
“Junto à Igreja católica daqui eu vou dedicar uma hora da minha semana, pelo menos, para estar com os velhinhos abandonados, passear com eles, levar quem usa cadeira de rodas pra ver a cidade, ajudar a fazer compras no supermercado ou realmente só pra conversar. Eu aconselho muito esse ato de caridade concreto, porque é uma graça muito grande servir. Isso é o que eu me propus. Eu não tenho mais avós e a minha família tá distante no Brasil, mas quem tem oportunidade de ter o avô, a avó, procure passar tempo com eles. E é como o Papa Francisco sempre diz: eles nos dão tanta sabedoria e é uma sabedoria impagável.”
“Uma coisa faz crescer a outra”, o jejum e a penitência fazem crescer muito mais a abertura a Deus; e a oração alimenta a caridade e a caridade alimenta todo o resto, afirma Leticia. A intimidade com Deus acaba sendo o tesouro mais valioso que se ganha na Quaresma, um tesouro transformador:
O silêncio das redes sociais, por Letícia Schäfer
“Pode parecer estranho para alguns, mas a Quaresma é meu período favorito do ano. O quê? Você gosta do sacrifício? Ninguém gosta do sacrifício pelo sacrifício, mas pude provar em inúmeras ocasiões da minha vida os frutos maravilhosos que nascem do sacrifício, das ofertas de amor a Deus e ao próximo.
Há mais ou menos 5 anos eu tenho feito como um das minhas penitências de Quaresma o silêncio das redes sociais. Eu desativo meus perfis de Instagram e Facebook na quarta-feira de cinzas e só os reativo na Páscoa. No começo é sempre difícil, você sempre acha que perde algo, que não vai saber das últimas novidades ou das últimas notícias, mas com o passar dos dias esse silêncio fica agradável e abre espaço para um diálogo com Deus. Abre espaço para olhar para nosso coração e para Deus com mais frequência... Jesus foi ao deserto ter esse encontro com Deus e nos convida a fazer o mesmo, pois sabe o quão fecundo é esse encontro no silêncio. Nas redes sociais, por mais seletivos que sejamos, acaba sempre chegando informação demais.
Penitência e jejum, então, direcionados à oração, que transforma nosso coração e nos torna prontos para fazer atos de caridade mais autênticos e livres. Penitência e jejum caminham juntos, pois nos ajudam a treinar o auto-controle e ter mais disciplina conosco.
Eu amo praticar esporte, e vejo que a disciplina é a mesma: quem quer evoluir na performance esportiva tem que sacrificar muito, e tem que fazer jejum! Por que ninguém se escandaliza quando se faz penitência e jejum para um objetivo fisíco e acham absurdo fazê-lo para ter um desenvolvimento espiritual? Faz muito sentido!
A caridade e a oração são verdadeiros presentes, nessas duas frentes encontramos a presença de Deus, e uma alimenta a outra preparando nosso coração para a grande alegria da Páscoa. Cabe a cada um fazer seu exame de consciência nesses dias em preparação para a Quaresma, e pedir que o Espírito Santo inspire a melhor penitência e jejum para crescer na fé. Sabe que algumas das minhas penitências e jejuns dos anos passados acabaram virando permanentes e me ajudaram muito? Por exemplo, um ano fiz jejum de todo e qualquer tipo de açúcar, que eu gostava muito. Foi um sacrifício enorme, mas acabou que se tornou um hábito e melhorei muito a minha saúde diminuindo permanentemente meu consumo de açúcar!
Além do jejum de carne obrigatório das sextas-feiras, este ano, também como desde quando comecei a penitência das redes sociais, vou abdicar das bebidas alcoólicas e das eventuais sobremesas. Além disso, o jejum mais difícil de todos é aquele de não reclamar, não falar mal de ninguém, não se irritar com ou tratar mal o marido, com os familiares... é um esforço contínuo mas vale muito a pena!
Para a oração, eu me proponho rezar o Terço e ir à missa todos os dias durante todo o ano, mas na Q!uaresma meus dias são preenchidos também com meditações sobre a paixão de Jesus e leituras bíblicas, além das confissões mais frequentes e Via Cruz.
Para a caridade eu me propus de fazer um trabalho voluntário com os anciãos da minha cidade, que são muito sozinhos. Junto à Igreja Católica local vou dedicar pelo menos 1h da semana para estar com os velhinhos abandonados, passeando com eles, levando quem usa cadeira de rodas para ver a cidade, ajudando a fazer compras no supermercado ou apenas indo conversar com eles. Aconselho muito esse tipo de ato de caridade concreto, é uma grande graça poder servir! Moro na Suíça, onde a pobreza econômica é rara, então os "pobres" aqui são os que faltam de amor, de fé, e de alegria. Cada um em sua realidade procure o melhor lugar para servir... Não pense que você vai ficar sem tempo, viu?
Espero de coração ser uma pessoa melhor depois dessa Quaresma. Uma filha melhor, irmã, uma esposa melhor, uma mãe melhor, uma nora, cunhada, amiga, cidadã... eu preciso, preciso pois sou muito falha e pecadora, e sei que Deus pode e quer me transformar... e sei que quer fazer o mesmo com você! Pense que a Quaresma é uma metáfora da vida: aqui, temos muitos sofrimentos, sacrifícios, mas na Páscoa definitiva, quando Jesus virá, aí terá valido a pena cada dorzinha, cada sacrifício... E a Páscoa não durará 'só' 50 dias litúrgicos, como agora, mas Eternamente!
Boa Quaresma, boa Páscoa!"
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