Aos 100 anos, a despedida a Dom Aldo Mongiano e à voz profética em defesa dos indígenas
Pe. Luis Miguel Modino, Andressa Collet – Cidade do Vaticano
A história da Igreja no Brasil tem sido escrita por muitos missionários que entregam a vida em defesa dos indígenas. Um deles, que se dedicou aos direitos dos povos de Roraima quando foi bispo local por mais de 20 anos (1975 a 1996), acabou de se despedir deixando um legado de “testemunho do Evangelho e profética vida missionária em favor dos povos da Amazônia”, afirma Dom Mário Antônio da Silva, atual bispo de Roraima, em nota de falecimento divulgada nesta quinta-feira (16).
A dedicação como missionário
Dom Aldo Mongiano (01/11/1919 – 15/04/2020), missionário da Consolata, faleceu na quarta-feira (15), na sua cidade natal, em Pontestura, Monferrato, na Itália, onde residia atualmente e recebia cuidados especiais da sua irmã Caterina. Ele foi ordenado sacerdote em San Marino, no país natal, partiu em missão em Portugal e Moçambique para depois ser nomeado por Paulo VI, em 1975, bispo da Prelazia de Rio Branco, atual diocese de Roraima, criada em 1979. Dom Aldo, em 1996, renunciou por idade canônica, e por isso já se encontrava na Itália, onde nasceu.
No Brasil, o prelado abriu um seminário, ordenou o primeiro padre diocesano, introduziu o diaconato permanente e ergueu um hospital, a Casa Paulo VI. O episcopado de Dom Aldo foi marcado pela luta em favor da comunidade católica local, dos jovens, do protagonismo dos leigos, do acolhimento de missionários e, principalmente, dos direitos dos indígenas.
O bispo abriu a missão Xitei junto aos povos Yanomami. Na área indígena da Raposa Serra do Sol, um dos missionários acolhidos em Roraima por Dom Aldo, o Pe. Alex José Klopenburg, lembra da campanha “Uma vaca para os índios”, que levava uma forma de sustento para os Macuxi e Wapichana na época “da constituinte, da invasão da área indígena dos Yanomani pelos garimpeiros, de perseguição aberta à Igreja e aos missionários que faziam a opção preferencial pelos mais pobres. Tempos de teimosia profética e de coragem evangélica”, afirma o sacerdote gaúcho, da Diocese de Bagé.
Dom Aldo chegou a publicar uma Carta Pastoral com o título: "Os missionários podem evangelizar os índios?" em resposta ao presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio) que havia proibido os missionários de trabalharem com os indígenas. No texto, o bispo denunciava a situação de abandono e exploração que as comunidades indígenas sofriam, e afirmava que a Igreja continuaria em missão, apesar da proibição.
Com 80 anos de profissão religiosa, 76 anos de vida sacerdotal e 44 anos de bispo, Dom Aldo Mongiano é lembrado na diocese de Roraima como alguém que muito semeou, comenta Dom Mário Antônio da Silva. Por isso, Pe. Alex diz que, em sua oração, pede que agora, “junto de Deus no céu”, Dom Aldo “continue a interceder pela Amazônia, pelos povos indígenas, a quem tanto amou, defendeu e ajudou”.
O reconhecimento do CIMI a Dom Aldo
A missão episcopal de Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho, começou em Roraima, em 2005, quando teve a oportunidade de conhecer e aprender com Dom Aldo, com quem conviveu por três meses. Ele lembra de Dom Aldo como “um homem que passou pelas mais absurdas acusações e perseguições, teve que ficar muito tempo com proteção policial diante dos ataques, mas jamais perdeu a serenidade, jamais partiu para pagar o mal com mal, pelo contrário”.
O também presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) afirma ainda que Dom Aldo era alguém que construía “pontes de esperança” e tinha muita clareza na missão ao contribuir para os caminhos da Igreja na perspectiva dos povos indígenas, sobretudo na questão da defesa dos territórios e das lideranças: ele chegou a contratar “advogados para tirar indígenas que eram presos sem acusação nenhuma”.
Outro gesto marcante, lembra Dom Roque, foi quando a comunidade indígena da Raposa Serra do Sol recebeu a visita de Dom Aldo em 2011. Uma idosa do povo Macuxi deu de presente uma pequena panela de barro e agradeceu por toda luta feita em defesa do seu povo e também de Roraima: “se hoje nós temos a terra, tem a mão de Deus, mas tem também a sua mão, a mão da missão. Esta terra tem muito sangue, muita gente morreu, mas também tem a paixão dos missionários da Consolata e a sua paixão na defesa da causa indígena”, disse a senhora a Dom Aldo.
Ação de graças pelos 100 anos de vida
A paixão por essa missão foi louvada em vida. Dom Aldo chegou a receber uma carta com os parabéns e a bênção do Papa Francisco, pelos 100 anos de idade e a história missionária como pastor. Uma missa de ação de graças pelo centenário também foi celebrada em novembro de 2019, em Turim, na Itália, e logo depois do encerramento do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, realizado no Vaticano. Um sinal importante que recolheu muitos dos sonhos que Dom Aldo tinha ao ser missionário naquela região.
A santidade de Dom Aldo
O bispo emérito de Roraima era considerado o mais idoso da Igreja do Brasil e 6º bispo mais idoso do mundo. Na celebração do centenário, Dom Mário Antônio, segurando carinhosamente a mão de Dom Aldo, lembrou da sua opção pelos indígenas e que “fez com que Roraima não somente se tornasse diocese, em 1979, mas também, uma referência para a Igreja na Região Norte do Brasil e até mesmo em outras partes do mundo”.
Para o bispo de Roraima, “o testemunho de Dom Aldo é um caminho de santidade”. Já para o próprio bispo emérito, que se pronunciou na festa dos seus 100 anos de vida, Dom Aldo disse que essa era a sua missão, ao afirmar:
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