Diocese de Campos inicia atividades da Pastoral Afro-brasileira
Ricardo Gomes – Diocese de Campos
“Estou participando da pastoral Afro está sendo um aprendizado para mim e estou conhecendo a nossa realidade, ainda hoje existe muito preconceito com o negro, e estamos engatinhando com algumas conquistas. Mas estamos na luta para sermos reconhecidos. - Ir Vanuza da Silva Fortunato - Instituto das Irmãs Missionárias de São José
Racismo, violência contra a população negra, vítima de preconceito e de intolerância religiosa. Na Diocese de Campos (RJ) a Pastoral Afro-brasileira começa a ser estruturada para ser voz da população afrodescendente. Uma situação que se agrava cada vez mais causando uma atmosfera de violência estrutural. A agente pastoral Maria Salvadora Ribeiro de Souza conta as suas experiencias desde a juventude até o trabalho institucional.
“Diante desse cenário de discriminação racial, marginalização, extrema pobreza, violência contra as mulheres e juventude negra, das frequentes situações de intolerância religiosa e violência contra as religiões de matrizes africana e seus símbolos, a Pastoral Afro-brasileira, em Campos, pretende desempenhar o papel de identificar e elencar as iniciativas dos vários grupos, em prol da população negra, da juventude negra, de resgate e de políticas afirmativas que existem na Igreja no Brasil. Convém que os jovens sejam estimulados a assumir, cada um, o seu papel de principais agentes de transformação de suas realidades. Importa entenderem que a discriminação histórica, introduzida em nossa cultura e valores, tem que ser erradicada, que a questão racial tem que ser discutida e enfrentada”, afirma Salvadora.
Salvadora Maria Ribeiro de Souza destaca a necessidade da Igreja se lançar em defesa dos negros e o pressuposto alimentado pelo racismo de que os negros são pessoas sem capacidade, sem força de vontade. Na realidade são reféns da herança de exclusão social e preconceito decorrente do passado histórico de 400 anos de trabalho escravo no Brasil, e do atual quadro econômico, social e político brasileiro, marcado por perversa desigualdade confirmada pelos índices de renda, educação, saúde e ocupação.
“A ideologia racista inculcada nas pessoas e nas instituições vem produzindo ao longo do tempo e na sucessão das gerações, processos de exclusão e subalternização dos negros, que se realizam por práticas discriminatórias explícitas ou veladas”, comenta.
“A Pastoral Afro brasileira não é só importante para a inculturação da fé para assumir os rostos, mas para sair ao encontro da defesa dos direitos humanos dessa população tão sofrida e discriminada e a lutar pelo direito a associação dos quilombos reconhecidos, sua cultura, espiritualidade e o direito de ser negro na igreja, porque Deus os criou assim e cada etnia, cada raça e cada grupo longe de ser algo que nos atemoriza e vai nos enriquecer e tornar mais católico o rosto da igreja é sem dúvida um banquete, uma assembleia na mais completa diversidade de cultura, povos e nações: Dom Roberto Francisco.
Uma Pastoral integradora e do diálogo
Em Campos a Pastoral Afro-brasileira nasce da urgência de defender os direitos à dignidade a população negra que continua sendo vítima de preconceito racial e violência. O coordenador da pastoral padre Márcio André Ribeiro ressalta a linha de ação na Diocese. Destaca o preconceito em relação a herança africana resquício da presença do negro no processo colonial, e, em Campos, inúmeros episódios de racismo e preconceito.
“Toda manifestação cultural de origem afro, inclusive muitas vezes dentro da própria Igreja é um desejo dialogar com todas as culturas. A Pastoral Afro-brasileira busca dialogar com nossos irmãos das religiões de matriz africana e todos que ajudam a manter viva essa herança cultural. A Igreja quer o diálogo e interação, mas não se trata de um sincretismo desordenado e mistura das religiões, mas de uma convivência pacifica, harmoniosa e respeitosa, buscando identificar nesta cultura os elementos comuns ao Evangelho, a fraternidade que é um elemento muito forte nas comunidades quilombolas. A fraternidade e a solidariedade é um elemento muito característico da cultura africana”, destaca padre Márcio André.
O sacerdote fala ainda do sistema de preconceito, violência e racismo muito presente na cidade de Campos dos Goytacazes. Com a presença dos negros nas favelas e presídios, na população em situação de rua, desempregados para perceber essa realidade de um racismo estrutural. E ressalta que a Pastoral Afro-brasileira tem seu lugar e se volta a um olhar pastoral sobre essa realidade.
Um canto de libertação
“Meu filho não tem tudo que ele queria na vida, mas ele tem um pai que o ama mais que tudo no mundo.” – João Damásio – Cantor e compositor.
O cantor e compositor João Damásio através do canto lança seu apelo de libertação do negro. Uma luta iniciada na juventude e conta as experiências que vivenciou de preconceito. Hoje passa para o Filho Pedro Rafael Lopes Ribeiro Damásio, 22 anos, a experiência vivida e que mesmo diante do racismo e preconceito a luta tem de continuar. A música “Mãe África”, relata um pouco da luta do negro numa cidade onde prevalece o preconceito racial.
“O meu primeiro choro quando nasci deve ter sido de sofrimento, pois nós negros já nascemos com esta marca registrada em nossa vida pela rejeição imposta pela sociedade”. João Damásio – Cantor e Compositor.
A luta contra o racismo e preconceito é uma luta desde a juventude e destaca o processo social que cria uma estrutura que fere a dignidade do negro. Uma luta que inicia logo que toma consciência de uma sociedade com a falta de respeito a dignidade do negro.
“Fui estudar em escola particular, onde praticamente a maioria dos alunos era branca, um contraste muito grande da comunidade onde na época eu vivia e vivo até hoje. Sendo assim comecei a identificar o quanto era difícil ser negro sendo reconhecido no sistema onde os negros são representados. Mesmo sem entender a situação, por sem uma criança, e com a chegada a maturidade fui crescendo com todas as indiferenças religiosas, sociais e culturais. Com meu crescimento fui me identificando com algumas referências do movimento negro de minha cidade, fui amadurecendo na consciência de uma luta que parece não ter fim e ver que a escravidão foi um dos maiores males da humanidade, e uma das maiores vergonhas”, revela Damásio.
A música “Mãe África”, surge como um canto de luta pelo fim do preconceito que persiste na sociedade moderna. Foi um grito que lançou para mostrar que através da arte poderia lançar como um apelo a construção de uma nova sociedade, sem a desigualdade racial que coloca os negros numa posição de exclusão social e cultural.
“Eu queria falar, gritar e desabafar todo o sofrimento e meu lamento que nós negros sempre vivemos até nossos dias e continuamos com a mesma doença do preconceito e da discriminação, e surgiu a ideia de compor uma canção que falasse dessa necessidade de quebrar todas as correntes e grilhões do preconceito e do racismo estrutural presente na nossa sociedade. E tinha a necessidade de uma canção denunciando o racismo e denunciando a herança nefasta da escravidão”, conclui Damásio.
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