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São Pedro Fabro: o jesuíta precursor do diálogo com os luteranos

Um dos jesuítas que mais se destacaram no contato direto com os seguidores da Reforma Protestante foi Pedro Fabro, que foi um dos primeiros personagens a ser canonizado pelo Papa Francisco e a quem o Pontífice nutre uma devoção particular.

Bruno Franguelli, SJ

Em suas riquíssimas correspondências com Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, São Pedro Fabro revelava as dificuldades, ao mesmo tempo que reafirmava sua esperança no auxílio pastoral para com os alemães protestantes. Em uma de suas mais expressivas cartas sobre a sua relação pastoral com os protestantes, Fabro elaborou um precioso “modus operandi” no qual orientava quais deveriam ser as atitudes dos católicos para com os seguidores da Reforma Protestante de Lutero.

Os jesuítas e a Reforma Protestante

É muito comum ouvir repetidas afirmações, presentes também nos livros de História, que a Companhia de Jesus é uma Ordem religiosa estrategicamente fundada no século XVI com a finalidade de combater a Reforma Protestante. Quem conhece pelo menos um pouco da história de Santo Inácio de Loyola e da Ordem por ele fundada, reconhece que afirmações como estas são profundamente equivocadas. Não existe nos documentos fundacionais da Companhia como o Regimini Militantis Ecclesiae (1540) ou nas Constituições da Companhia de Jesus (1550) nem mesmo uma única menção no que diz respeito ao confronto com o movimento de Lutero ou de outros reformadores protestantes.

A Companhia de Jesus, nascida na metade do século XVI, época, como bem sabemos, muito conturbada tanto por difíceis situações religiosas, como por temas políticos e sociais, precisou sim dar uma resposta clara à uma das crises religiosas mais expressivas da época: a divisão dos cristãos e o nascimento de movimentos protestantes. Porém, diante de conflitos doutrinários e políticos que levavam até a execuções públicas, a ação dos primeiros jesuítas era totalmente oposta àquelas de muitos católicos que desejavam “a ferro e fogo” converter os discípulos de Lutero. Os interesses religiosos misturados com ambiguidades políticas travaram uma batalha que custou a vida de muitos, tanto católicos como protestantes. É neste sentido que os jesuítas, cientes da situação delicada e forjados na escola do discernimento a partir dos Exercícios Espirituais, ofereceram uma ação pastoral totalmente diferenciada para enfrentar os desafios da época. 

Pedro Fabro: um jesuíta em meio aos protestantes

Um dos jesuítas que mais se destacaram no contato direto com os seguidores da Reforma Protestante foi Pedro Fabro, que foi um dos primeiros personagens a ser canonizado pelo Papa Francisco e a quem o Pontífice nutre uma devoção particular. Em meio ao conflito religioso cada vez mais grave, Inácio de Loyola, preocupado com os movimentos protestantes na Alemanha, logo enviou Fabro, a quem tinha especial reconhecimento pela sua grande espiritualidade e espírito de discernimento, para conhecer de perto a situação e tentar realizar alguma frutuosa obra em meio aos alemães da Reforma de Lutero.

Em suas riquíssimas correspondências com fundador da Companhia, Pedro Fabro revelava as dificuldades, ao mesmo tempo que reafirmava sua esperança no auxílio pastoral para com os alemães protestantes. Em uma de suas mais expressivas cartas sobre a sua relação pastoral com os protestantes, Fabro elaborou um precioso modus operandi no qual orientava quais deveriam ser as atitudes dos católicos para com os seguidores da Reforma Protestante de Lutero.

Um mútuo diálogo de amor

“A primeira coisa é que quem deseja ser útil aos seguidores da Reforma, deve buscar a caridade no confronto deles e amá-los verdadeiramente, eliminando do próprio ânimo todas as considerações que frequentemente diminuem a estima que se tem deles. A segunda coisa é que é necessário conquistá-los, para que nos amem e nos acolham bem no próprio espírito; isso se faz comunicando-nos com eles familiarmente em coisas que são comuns a nós e a eles.”

De fato, estas palavras de Pedro Fabro são impressionantes, principalmente para a sua época, marcada por extremismos e intolerâncias. Assim, podemos constatar que já no século XVI, era possível encontrar homens da Igreja capazes de distanciar-se de infecundas discussões doutrinárias e de colocar no centro de sua ação pastoral o respeito, a caridade e o diálogo. Em suas orações, Fabro recordava de orar também por Lutero: “sem ter em conta os seus defeitos”. Séculos mais tarde, os valores impulsionados pelo jesuíta seriam exortados por eminentes teólogos como São João Newman, e aplicados tanto pelo movimento ecumênico, como pelo Concílio Vaticano II, principalmente através do documento Unitatis redintegratio e diversas iniciativas como a semana de oração pela unidade dos cristãos.

Deste modo, a exortação de São Pedro Fabro se apresenta muito atual e necessária. Trata-se de uma verdadeira profecia proveniente do século XVI para nos animar a superar nossas divisões e soberbas até mesmo doutrinárias. Os Papas, principalmente após o Concílio Vaticano II, fizeram grandes esforços ecumênicos e o Papa Francisco continua trabalhando arduamente para que o diálogo entre cristãos de diferentes denominações seja cada vez mais frutuoso. As palavras do jesuíta são um indispensável convite para que nós cristãos continuemos “a nos comunicar familiarmente nas coisas que nos são comuns” afim de que “nos amemos e nos acolhamos mutuamente”.

Nota: Os trechos das cartas de São Pedro Fabro foram extraídos da Monumenta Historica Societatis Iesu, Fabri Monumenta.

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30 outubro 2021, 18:46