“Aparecida 15 anos depois, destaques e desafios”: conclui-se o Curso para Bispos no Rio do Janeiro
Carlos Moioli, Arquidiocese do Rio de Janeiro
“Aparecida 15 anos depois: destaques e desafios” foi o tema do 32º Curso para os Bispos do Brasil que a Arquidiocese do Rio de Janeiro promoveu de 25 a 27 de janeiro, em modo on-line, com a participação de 90 inscritos, inclusive do núncio apostólico no Brasil, dom Giambattista Diquattro.
Idealizado pelo cardeal Eugenio de Araujo Sales, o curso acontece desde 1990 no Centro de Formação do Sumaré, no Rio Comprido, e por muitos anos foi organizado pelo bispo auxiliar dom Karl Josef Romer, hoje atuando como conselheiro.
“O curso dos bispos sempre é um encontro de estudos, atualização, partilha e confraternização que acontece todos os anos no mês de janeiro, neste ano, pela segunda vez, no formato virtual, ainda por causa da pandemia. O curso não tem nenhuma conclusão ou obrigatoriedade. Cada bispo acolhe e aproveita as reflexões dos temas apresentados, e depois com a sua equipe de pastoral, em suas dioceses, discutem o que pode ser colocado em prática”, disse o anfitrião e arcebispo do Rio de Janeiro, cardeal Orani João Tempesta.
“O encontro deste ano foi muito bom, proveitoso e produtivo”, destacou o arcebispo, afirmando a importância de “estar juntos”, mesmo por meio de plataformas digitais, para “atualizar temas importantes da Igreja”, cujas reflexões foram direcionadas por conferencistas do Brasil, América Latina e Itália”, disse.
Segundo dom Orani, o curso revistou a Conferência de Aparecida – realizada em maio de 2007, em Aparecida (SP), com a presença do Papa Bento XVI –, e procurou analisar a caminhada da Igreja nos últimos 15 anos. Uma das questões colocadas foi a “mudança de época na sociedade” que muito se abordou e que ainda hoje tem seus impactos com “valores contra a vida, o matrimônio e a família”. Segundo ele, cabe a cada um, como Igreja, “fazer a nossa parte, respondendo a esses apelos”.
Os 15 anos da Conferência de Aparecida
O tema do curso “Aparecida 15 anos depois: uma tentativa de compreender o hoje pastoral e discernir pistas de ação” foi abordado em duas partes, no dia 25 de janeiro, pelo bispo auxiliar da Arquidiocese do Rio e secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Joel Portella Amado.
Na primeira parte da conferência, Dom Joel procurou apresentar o perfil sociocultural da modernidade que se empenha em valorizar o ser humano individualizado e, por isso mesmo, com dificuldade para viver equilibradamente a alteridade. De acordo com ele, “a Igreja não é a única instância a ditar normas para a reconfiguração do mundo, mas tem, por vocação, a responsabilidade de contribuir”.
Conforme Dom Joel, a realidade atual “traz para a Igreja um grande desafio evangelizador: ser presença da alteridade, da relacionalidade, da fraternidade, da comunhão, do diálogo e, com isso, contribuir eficazmente para a construção de um mundo diferente do que aí está”.
Na segunda parte da conferência, dom Joel afirmou que os processos indicados na Assembleia de Aparecida se tornaram mais agudos, identificando a concepção ontológica do ser fechado em si como a causa mais profunda desta realidade.
As preocupações do Papa Francisco, disse dom Joel, relacionam-se à “missão, ao diálogo, à solidariedade e ao respeito pela casa comum”. Neste sentido, é preciso acelerar o processo de setorização ou capilarização da experiência eclesial-comunitária, “levando a Igreja para o mais perto possível da vida das pessoas, reconhecendo que este não é um momento histórico para uma ação pastoral predominantemente centrípeta”.
“É urgente priorizar, nas diversas instâncias eclesiais e pastorais, a perspectiva missionária que se caracteriza por ir até as periferias existenciais, isto é, aos lugares e situações em que as pessoas e os grupos estão. Este é um tempo para inverter o jeito predominantemente centrípeto de fazer pastoral, ou seja, pastoral do vir, passando para uma ação pastoral predominantemente do ir, no caso, do ir e permanecer, formando pequena comunidade”, disse Dom Joel.
Assembleia Eclesial Continental
“Assembleia Eclesial Continental” foi o tema da primeira conferência do dia 26 de janeiro, conduzida pelo arcebispo de San Juan de Cuyo, na Argentina, e secretário-geral do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), dom Jorge Eduardo Lozano.
Realizada de 21 a 28 de novembro de 2021, na Cidade do México, a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe teve como lema: “Somos todos discípulos missionários em saída”, inspirado na Conferência de Aparecida e no Magistério do Papa Francisco.
As assembleias eclesiais, segundo dom Jorge Lozano, têm uma “rica tradição e experiência sinodal” ao longo dos séculos, fruto que brota de “raízes que marcaram a identidade da Igreja no continente, desde os primeiros dias da evangelização”.
O secretário-geral do Celam discorreu sobre a origem e a proposta da assembleia, que vinha sendo amadurecida entre os bispos. O Papa Francisco a viu e propôs que “fosse levada em conta as várias vocações do povo de Deus e não apenas as dos bispos”. Dom Jorge Lozano também falou sobre o processo de escuta do documento para o discernimento comunitário e o desenvolvimento de trabalho da assembleia.
Como resultado do trabalho, segundo dom Jorge Lozano, foi elaborada uma lista de 41 desafios, dos quais 12 foram destacados como os mais urgentes, classificados em dois grupos: “os que levam em conta a vida interna da Igreja, e os que nos questionam a respeito das preocupações sociais”.
Entre os destaques estão o de promover a participação ativa das mulheres nos ministérios; reconhecer e valorizar o protagonismo dos jovens; aumentar a formação para a sinodalidade a fim de erradicar o clericalismo; escutar o clamor dos pobres, excluídos e descartados; reafirmar e priorizar uma ecologia integral nas comunidades; e promover e defender a dignidade da vida e da pessoa humana.
O desejo central, observou dom Jorge Lozano, é “promover um encontro pessoal com Jesus Cristo encarnado na realidade do continente. Nisto reside a força ou a fraqueza da evangelização, entendida como partilha da experiência da alegria da fé”.
O grande desafio, acrescentou o secretário-geral do Celam, é a “capacidade da Igreja de promover e formar discípulos e missionários que respondam à vocação recebida e comuniquem em todos os lugares, por gratidão e alegria, o dom do encontro com Jesus Cristo”.
Sinodalidade
“Sinodalidade: fundamentos e perspectivas” foi o tema apresentado pelo monsenhor Antonio Luiz Catelan Ferreira, bispo auxiliar eleito da Arquidiocese do Rio de Janeiro, na tarde do dia 26 de janeiro.
A conferência contemplou três pontos: “A sinodalidade como dimensão constitutiva da Igreja”, “A sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio” e “Igrejas particulares: primeiro nível de realização da sinodalidade”.
Segundo monsenhor Catelan, “a sinodalidade é praticada há décadas no Brasil por meio da pastoral de conjunto”, quando equipes pastorais com coordenações e assessorias próprias avaliam e planejam os planos de pastorais das dioceses, e que agora, pelo estímulo do Papa Francisco, haverá um “avanço” neste sentido.
Um aspecto desse aprofundamento sinodal, segundo monsenhor Catelan, se encontra nas Comunidades Eclesiais Missionárias, propostas como “prioridade única” nas atuais Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil.
“Nelas se promove uma autêntica sinodalidade em ambiente de oração e fraternidade, na escuta comunitária da Palavra, na celebração que as reúne em torno do altar, na solidariedade com os pobres e sofredores, e no anúncio missionário”, disse.
A autêntica sinodalidade, destacou monsenhor Catelan, para evitar desvios, deve ser realizada em sintonia com a eclesiologia do Concílio Vaticano II, reproposta pelo Papa Francisco. E ressaltou que o “discernimento espiritual e comunitário da vontade de Deus está no coração do estilo e dos processos sinodais”.
Com uma autêntica e ampla prática sinodal, observou monsenhor Catelan, “a Igreja contribui para formar cidadãos comprometidos com o bem comum” e a encontrar “caminhos para a justa expressão das reais necessidades em vista do desenvolvimento integral de todos”.
Renovação Carismática Católica
A primeira conferência do dia 27 de janeiro, com o tema: “Renovação Carismática, o CHARIS e as Novas Comunidades”, foi apresentada pelo padre brasileiro Alexandre Awi Mello, atual secretário do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, no Vaticano.
Segundo padre Alexandre, a Renovação Carismática Católica (RCC) não pertence a seus membros, mas, sim, à Igreja, um instrumento pastoral a serviço do Sucessor de Pedro, e por isso é uma realidade eclesial importante para a Igreja universal. Já o CHARIS (Serviço Internacional para a Renovação Carismática Católica) é o novo e único serviço para todas as expressões nascidas da RCC, entre as quais se encontram diversas agregações de fiéis conhecidas no Brasil com o nome de “novas comunidades”.
“Estamos convencidos como dicastério de que, atualmente, sob o ímpeto do Papa Francisco, entramos em um momento favorável em que o Espírito Santo deseja desenvolver sua ação sobre todos os batizados. E o CHARIS foi criado para acompanhar esse período”, disse.
O CHARIS (https://www.charis.international/pt/), explicou padre Alexandre, é um organismo “de serviço” e está a serviço de "todas as realidades" da RCC. Seu objetivo, evidenciou, “é promover e fortalecer a comunhão entre todas as realidades carismáticas, fomentando o senso da família mundial da RCC, e ainda ajudar os bispos e padres a entender melhor a natureza e a prática das realidades da RCC”.
“O Santo Padre espera que a RCC promova uma renovação na Igreja e na sociedade por meio de uma vida de comunhão, que promova o ecumenismo, que espalhe o Batismo no Espírito entre todos os batizados e aprofunde a vida espiritual, que esteja a serviço dos pobres, sempre ativos e na vanguarda da evangelização, especialmente dos jovens”, disse padre Alexandre.
Os leigos na vida da Igreja
A última conferência do Curso para os Bispos na tarde do dia 27 de janeiro foi apresentada pelo prefeito do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida. cardeal Kevin Farrel, que discorreu sobre “O papel dos leigos no atual momento da evangelização”, a qual dividiu em quatro partes: “A importância dos leigos na Igreja”, “O papel missionário dos leigos”, “A formação” e “Prioridades pastorais”.
Aos irmãos bispos, com Farrel disse que está convencido que uma das tarefas mais importantes dos pastores é de fazer redescobrir aos leigos a sua plena participação na vida e na missão da Igreja.
“Todo aspecto da vida e da missão da Igreja pertence de pleno direito também aos fiéis batizados. A função de ensinar, de evangelizar, de santificar através da oração e do culto, e a função de governar deve envolver os leigos idôneos e qualificados que assumem tarefas de direção nas estruturas eclesiais. Ainda mais, a função de transformar todos os âmbitos da vida social segundo o espírito do Evangelho deve envolver em primeira pessoa os leigos”, disse.
Para dom Farrel, a melhor forma de um bispo exprimir que está próximo ao rebanho é de “procurar os leigos e de encontrá-los sempre”, pois é muito consolador para os fiéis “sentirem-se procurados pelo seu pastor”.
O prefeito do dicastério lembrou que os pastores devem dedicar um tempo para rezar pelos fiéis e também com eles. “É muito triste constatar que, às vezes, sacerdotes e bispos organizam momentos de oração e de adoração, mas eles mesmos não tomam parte”.
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