No coração de Roma, a saudade de monsenhor Jonas Abib
Luiz Felipe Bolis – Vatican News
Por mais de quarenta anos, o padre Jonas Abib (1936-2022) testemunhou o poder de acreditar nos propósitos de Deus e os frutos gerados pela Comunidade Católica Canção Nova. Pessoas de todas as idades contemplam a missão que nasceu no interior do estado de São Paulo nos anos 1970 e que se espalhou Brasil afora.
Sete dias após o falecimento do fundador, missionários e fiéis católicos das diversas unidades nacionais e internacionais da comunidade prestaram as últimas homenagens ao monsenhor, em missas na intenção da partida de pe. Jonas Abib, realizadas neste domingo (18). Um último adeus também partiu do coração de Roma, da Paróquia Santa Faustina Kowalska, em celebração presidida pelo padre Clóvis que reuniu membros da Canção Nova, da Shalom, da Obra de Maria e de outras comunidades católicas.
A tarde e a chuva caem sobre as ruas antigas da Cidade Eterna. Caem na terra romana à medida que uma Canção Nova se levanta firme. Uma peregrinação de homens e mulheres prestes a “viverem e comunicarem o Evangelho de maneira integral, na eficácia do Espírito Santo, enquanto esperam e apressam a vinda gloriosa do Senhor”. Uma comunidade disposta a seguir pelas veredas de um carismático padre, cujos passos de vida repercutem em palavras e testemunhos.
Notícias e atualizações do último ocorrido saem dos estúdios da missão e alçam voos rumo ao Brasil por meios televisivos. São palavras que traduzem o encerramento de um ciclo e o início de outro para a Comunidade Católica Canção Nova.
O outono de Roma tem a sua beleza. Folhas caem, mas ainda assim, mesmo ao chão, elas são de um belo todo alaranjado. O inverno anuncia os poucos dias que faltam para a sua chegada, mas há agasalhos e calefatores para aquecerem a gente dessa terra. As temperaturas de fora caem paulatinamente, mas eis que o calor humano aumenta com efervescência, especialmente nas almas batizadas no fogo do Espírito Santo. Almas como a de monsenhor Jonas Abib. As lembranças ruminam a saudade, e no entanto surge a certeza de que “só se tem saudades do que é bom”*.
Os olhos de Santa Luzia, homenageada nesse mesmo 13/12, veem a presença do silêncio, da reflexão e do luto de um lado da alma, enquanto o outro espelha esperanças perante aquele que já não mais caminha sobre o Vale de Lágrimas e do qual nasce uma intensa comunhão no seio da Igreja Católica a ele dedicada, assim como - e sobretudo - à presença de Deus. A força que vem do Espírito abre caminhos para que a voz missionária chegue a um mar de telespectadores: “falece o monsenhor Jonas Abib na noite de 12 de dezembro de 2022”.
As lembranças de um pequeno gigante semeiam amor no coração de Daniele Luiza de Oliveira. A alma acumula a força dos abraços de monsenhor Jonas Abib no calor da fé, no selo de uma vívida paternidade espiritual, na mais sincera acolhida. Daniele sente tão de perto a manjedoura da bondade do santo homem quando mais precisou de morada segura para os seus sonhos, suas esperanças e seus passos.
O corpo do homem cumpriu quase 86 anos de andanças espirituais pela terra e agora descansa em paz. O mesmo corpo que suspirou os ares de uma decidida decisão, de mãos dadas à vocação salesiana, corpo que serviu de instrumento para a fundação da Comunidade Católica Canção Nova em 1978 e que vestiu-se de sabedoria para germinar os frutos de Deus nos campos de incontáveis vidas.
Por diversas vezes, e sem reservas, este mesmo corpo andou com a força da alma para as profundezas das alegrias e das mazelas do mundo, dos leprosos e dos necessitados, dos ricos e dos pobres. O corpo agora descido à cova da terra que por toda a vida diminuiu-se em sinal de respeito e reverência à grandeza do Bom Deus.
"As minhas ovelhas ouvem a minha voz, eu as conheço e elas me seguem” (João 10, 27). A voz de monsenhor Jonas Abib se eterniza pela potência do falar de um verdadeiro profeta dos tempos atuais. “Me atraiu a voz do pastor, que dizia: ‘é possível ser santo’”, sublinha Daniele.
A voz do fundador encontrou eco no coração da carioca na plenitude dos anos 1990, nos encontros formativos da geração que viu de perto as fitas de vídeo VHS apresentarem problemas de imagem, restando apenas a boa fala do padre Jonas Abib em áudio. Da primeira visita à sede da Canção Nova em 1997, em Cachoeira Paulista/SP, até os áudios do bom pastor enviados por aplicativos de mensagens em 2022, Daniele resguarda o tesouro da presença de um grande homem pelo passar dos tempos e das tecnologias.
Os dezoito anos de vivência comunitária apresentam às mãos de Daniele o verdadeiro carisma Canção Nova. Os dias e as noites debaixo do teto de Nossa Senhora sobre o mais terno abandono à Providência Divina.
Pelas asas do carisma Daniele andou pelo Brasil, por Israel, pela Itália e por tantos lugares plantando a Boa Nova. A primeira graça de Deus foi a de, enquanto parte da equipe da TV Canção Nova, poder produzir os programas do padre Jonas e acompanhar de perto as palavras de um propagador da santidade.
“Eu pude participar muito dos programas ao vivo, mas sobretudo produzindo o padre Jonas. Eu produzia ele, eu dirigia ele, eu mostrava a plaquinha: faltam cinco minutos para encerrar. E a primeira vez que eu fiz isso, eu tremia, porque eu não tinha nem um ano de comunidade, e eu tinha que mostrar o tempo pra ele. Nossa, meu coração acelerado. E no final, ele me chamou. Ele falou assim: ‘minha filha, seja sempre assim. Eu preciso ter limites e eu preciso obedecer. Aqui quem manda nesse palco é você, e eu vou te obedecer’. Eu me senti um grãozinho de areia, porque imagina: o fundador dizendo ‘aqui quem manda é você’”, pontua Daniele.
Padre Jonas se revela aos olhos da missionária como a pessoa mais obediente que ela já conheceu, também alguém que até hoje e para sempre a ajuda, com a sua santidade, “a buscar um encontro pessoal todos os dias com Deus e com Nossa Senhora”. Eis o legado que nasce do simples coração de monsenhor Jonas Abib.
Simone Cristina Pinto aprendera desde sempre a importância do louvor incessante e livre pelas terras da alma. O louvor que jorra espontaneamente da fonte do interior e transborda um rio de gratidão pela oportunidade de haver conhecido um servo de Deus, pai espiritual, fundador e sacerdote admirável na grandeza de uma mesma pessoa. E ele mesmo, o monsenhor Jonas Abib, a ensinara a ter uma forte atitude de fé em todos os momentos da vida.
“Padre Jonas nos dizia que nunca pretendeu fundar nada. Ele recebeu o carisma de fundação. Eu tenho certeza que o padre Jonas diria isso: que ele não fez nada, que Deus fez tudo, e que ele sempre contou com a ajuda poderosa da Mãe de Deus, a exemplo de Dom Bosco”, comenta Simone a respeito do padre salesiano.
Trabalhando nos bastidores da notícia e do mundo da informação, ela é a que se doa à missão há mais tempo. São vinte e quatro anos de Canção Nova, dos quais há quinze mora em Roma, na Itália. Eram os dias em que a saúde do monsenhor ainda o permitiam ser bastante acessível em pregações, retiros, orações, atendimentos e contatos diários.
Das cifras do violão e do Espírito Santo, a mulher de 48 anos, nascida em Agudos/SP, extrai frequentemente uma canção nova para si. Com uma camisa de cor verde, Simone colore a alma de esperanças, apesar de reconhecer não ser fácil enfrentar o luto pela perda do pai que abriu as portas da Casa de Maria para muitos filhos.
“Eu acredito muito que o padre Jonas estava preparado pra esse momento, porque ele pregou a vida toda sobre o Céu, sobre a segunda vinda de Jesus. A Comunidade Canção Nova existe para preparar um povo pra segunda vinda de Jesus, e o padre Jonas falece justamente no Advento. Então tudo isso são sinais pra gente que acredita em Deus, pra gente que tem fé”, partilha Simone. Por meio de transmissão ao vivo do velório do monsenhor Jonas Abib, ocorrido de 13/12/22 a 15/12/22, a comunidade compartilhou com o Brasil e o mundo as últimas homenagens e despedidas ao fundador da Canção Nova.
Um grande fato da vida do monsenhor Jonas Abib é evocado pelas palavras de Simone: no último 08 de dezembro, dia em que ele regressou à casa em Cachoeira Paulista/SP após internação em um hospital de São Paulo/SP, o padre estava completando 58 anos de ordenação sacerdotal. No mesmo 08 de dezembro se celebrava o dia da Imaculada Conceição, enquanto que no dia 12, quando faleceu o fundador, era vivida a solenidade de Nossa Senhora de Guadalupe. “Nós acreditamos que Nossa Senhora veio buscar o padre Jonas mesmo, por todo o amor que ele tem por ela, por toda a confiança que sempre teve na Virgem Maria”, afirma.
O testemunho de um homem entregue a Deus, de um intenso apostolado, mas de uma vida de oração muito maior, um zelador dos pilares da santidade. “O padre Jonas fez tudo pela salvação das almas e eu acredito que cada um de nós precisa pensar na própria vida, cuidar da própria alma, da vocação com Deus e da vocação à santidade”, conclui Simone.
A mineira Joyce da Silveira Mesquita, natural da cidade de Entrefolhas, agora caminha entre as folhas de outono que se agrupam pelos cantos da capital italiano, sempre levando a Boa Nova consigo. Fotógrafa por amor à arte de eternizar momentos, é na Cidade Eterna que a jovem de 27 anos recorda-se dos muitos incentivos de monsenhor Jonas Abib pela missão que, como todas as outras, a satisfaz por inteiro, pelo dom de Deus assumido debaixo da graça celestial e do carisma Canção Nova.
“O coração humanamente está triste pela partida do monsenhor Jonas, mas ao mesmo tempo o sentimento de alegria e de certeza de que hoje o padre Jonas contempla a face do Amado. Então hoje é um dia de júbilo por ter essa certeza de que hoje o sonho do padre Jonas se realizou e ele pode contemplar a face do Senhor”, cita Joyce.
Sob o manto de Nossa Senhora de Guadalupe, ela dormiu grata pelos feitos daquele 12/12, como todos os demais dias. Estando quatro horas à frente do horário de Brasília, apenas na manhã seguinte foi possível saber o ocorrido. “Eu fui saber da notícia por volta das 5h40 da manhã, que eu escutei um choro na nossa casa, e aí eu acordei e fui ver o que era”. O silêncio cedeu lugar às lágrimas.
“Na Canção Nova, nós dizemos que tudo é conduzido pela Divina Providência, e também temos a certeza de que a Canção Nova é a Casa de Maria e de que, na Canção Nova, é ela quem tudo faz. Então no fim da vida do nosso pai fundador não poderia ser diferente”. Joyce se lança ao acalento de Maria ao lembrar-se que da Mãe também veio toda a providência do seu chamado, desde que ela conheceu o carisma em 2015, na sede, no Acampamento Por Hoje Não (PHN). Aquela missa celebrada pelo monsenhor Jonas semeou na jovem mineira o sentimento de pertença, o desejo de doar-se por inteiro.
O primeiro contato com o monsenhor, ainda no pré-discipulado, Joyce faz questão de guardar na gaveta da memória com carinho. “Quando o padre Jonas estava diante de uma pessoa, ele estava inteiro diante dela. Então, quando eu contava a minha história, ele queria saber mais, e ele prestava atenção em cada detalhe”.
A missão continua. Há boletins para serem enviados ao Brasil desde a sala ao lado, tornada a ilha de edição. Uma senhora brasileira que há cinquenta anos reside na Itália bate à porta trazendo alegria, força e um sorriso sincero. A senhora Ivani ama estar entre os “seus meninos”, como ela mesmo diz, acrescentando que, inclusive, com autorização do próprio monsenhor Jonas Abib para assim se referir aos missionários da Canção Nova.
Desde as porteiras do hoje que se abrem rumo aos novos horizontes do futuro, Joyce lança um olhar de fé para as realidades que estão por vir. “Padre Jonas foi um homem que buscou a santidade. Mais do que nunca, vejo que a Canção Nova terá uma força muito maior para a evangelizar, contando com a intercessão do nosso pai fundador, padre Jonas”.
*Frase da canção “Saudade” (Nelsinho Corrêa), Álbum Quem me segurou foi Deus, 2004.
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