Dom Oscar Ojea: com o Sínodo, "os leigos sentem-se os senhores do destino da Igreja"
Padre Modino - CELMA
Um Sínodo que ele vê como "a arte de se escutarem uns aos outros e a arte de compor, através da escuta, o modo de andar da Igreja, assumindo os conflitos de uma forma realista e não fugir deles como se não existissem". É toda a gente a evangelizar a todos, uma dinâmica que não tem outra forma senão a continuidade.
Estamos a participar na Assembleia Sinodal do Cone Sul, como está a viver este momento?
Muito feliz, estamos a viver o espírito sinodal no grupo. No grupo que me tocou, respiro diversidade, sinceridade, amor pela Igreja. O Sínodo trouxe uma revalorização tão grande do Batismo que se sente um sentimento de corresponsabilidade. Os leigos sentem-se senhores do destino da Igreja, e quando há participação e escuta autêntica, então todos sentimos que a Igreja está nas nossas mãos, que não está apenas nas mãos de uns, que dão as diretivas e outros são os que cumprem, mas que há um verdadeiro sentimento de pertença que se aprofunda com a participação e muito mais com a possibilidade de tomar decisões.
O senhor é bispo há muitos anos e, como acabou de dizer, aqueles que tradicionalmente tomavam as decisões eram os bispos. Como pode esta forma de ser e organizar a Igreja, baseada no Batismo, ajudar a Igreja nos próximos anos?
Tal como houve um processo nos Bispos com os conselhos diocesanos, criando estruturas que podiam servir de apoio à missão, os diferentes conselhos criados após o Concílio Vaticano II foram uma forma muito boa, em alguns casos, de conseguir alcançar um grau de participação necessariamente mais amplo que inclui pessoas que vivem situações que tradicionalmente as faziam sentir-se fora da Igreja, fora da comunidade, à parte.
Pareceu-me ser uma intuição muito grande da parte do Papa convocar o Sínodo, porque este se move entre dois extremos. O primeiro extremo é que isto não vai ser útil, que não vai trazer mais confusão, que não vai servir a Igreja, que as hierarquias não vão ser claras, que não vai ser claro quem decide em última instância, e em suma, que pode haver caos. Estas são as opiniões de alguns bispos e de alguns cardeais, que já foram expressas contra o Sínodo.
No outro extremo está o que eu chamo a posição parlamentar, uma confusão entre o que é a forma como a Igreja se move em comunhão através do Sínodo, e o que é um parlamento, aonde se vai, como acontece nas democracias modernas, vai-se com uma ideia clara para levar adiante, se essa ideia sai, ganha-se, se essa ideia não sai, perde-se.
O Sínodo situa-se entre estes dois extremos, não é nem a destruição de decisões nem de hierarquias, mas pelo contrário, é um enriquecimento do que a hierarquia terá de tomar alguma decisão final, e ao mesmo tempo não é um parlamento, mas é uma forma de enfrentar a realidade e de enfrentar o conflito para que ninguém fique de fora. É a arte de se escutarem uns aos outros e a arte de compor, através da escuta, a forma de caminhar da Igreja, assumindo os conflitos de uma forma realista e não fugir deles como se não existissem. Isto parece-me ser extremamente valioso neste Sínodo.
A metodologia da etapa continental, e tudo indica que será a metodologia da Assembleia Sinodal em Roma, é a conversa espiritual. Como é que este método enriquece a vida da Igreja e o que é que se aprende escutando os outros?
A conversa espiritual parece-me ser um grande sucesso, retira-nos do esquema de ensinar os outros, persuadir os outros, convencer os outros, tira-nos do esquema de preparar os nossos próprios discursos num painel, num congresso ou num parlamento. E coloca-nos num lugar autêntico de verdadeira escuta. Não só me coloco no lugar, mas escutar o que está por detrás das palavras, da forma como uma mãe pode ouvir o seu filho, que, se está a chorar, sabe por que, mesmo que não saiba por quê. Chora porque tem fome, ou chora porque tem frio, chora porque está doente, chora porque está chateada, mas sabe por que está a chorar.
Esta forma de escutar o que está a acontecer ao meu irmão, à minha irmã, de onde isto vem, porque é que ela está zangada, porque é que ela está zangada, o que está por detrás da palavra, escutar com todos os sentidos, uma atenção latente, não apenas cronológica, aquilo que vem do coração, onde nem tudo vibra da mesma maneira, mas onde se aprende a escutar o que mais vibra, é-se muito melhor capaz de compor, de exprimir o que se tem, de aceitar mesmo aquilo que foi trazido de alguma forma, de modo que através do Espírito Santo se chega a uma comunhão profunda, mesmo que se pense de forma diferente e se sinta de forma diferente. Este é o grande desafio da Igreja.
Após 10 anos de pontificado, podemos dizer que a grande contribuição do Papa Francisco é a sinodalidade?
O ponto alto do pontificado de Francisco é a convocação do Sínodo. Resulta da concepção que Francisco tem do povo, do conceito de povo, que, naturalmente, é retirado da eclesiologia do povo de Deus na Constituição do Concílio Vaticano II sobre a Igreja. É um povo unido, não uma massa sem forma, mas um povo que tem um destino, que tem um caminho, onde existem laços estreitos entre todos, onde partilham extensões do caminho da vida entre diferentes membros e onde existe um processo contínuo de aprendizagem.
Este povo que evangeliza o povo inteiro, como diz claramente na Evangelii Gaudium, o povo inteiro evangeliza o povo. No primeiro gesto do pontificado de Francisco, onde pede ao povo que reze pela bênção de Deus e inclina a sua cabeça, nesse gesto, Francisco reconhece de onde vem o primeiro batimento do coração e a primeira responsabilidade na Igreja. E ele é um servo dos servos, ou seja, dos batizados, de onde vem o poder, digamos assim, na Igreja, o verdadeiro poder.
A sinodalidade é algo de Francisco ou é algo da Igreja? É algo que transcende o pontificado atual ou é algo que pode ser reprimido por um futuro pontífice?
Isto faz parte da continuidade dos ensinamentos do Concílio, é claramente expresso no discurso do Papa por ocasião do 50º aniversário do Sínodo. Não creio que tenha outro destino que não seja a continuidade.
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