Cardeal Tolentino: privilegiar o exercício do diálogo
Eduardo Silva – Arquidiocese do Rio de Janeiro
O cardeal iniciou a primeira das suas duas conferências nesta edição do curso chamando atenção para a diferença entre tecnologia e tecnocracia. Enquanto aquela seria um exercício humano da técnica guiado ainda pelo conhecimento científico, esta seria o poder que a tecnologia hoje exerce sobre o Ser Humano e onde conhecimento científico não é só o motor externo do desenvolvimento técnico, mas torna-se uma função intrínseca da própria tecnologia.
A partir dessas definições, dom José Tolentino desenvolveu uma intensa reflexão acerca da metamorfose progressiva da condição humana que, no mundo contemporâneo, a partir da evolução científica, se mistura com as máquinas e com os mecanismos da tecnologia da informação.
“No horizonte do transhumanismo”, destacou dom Tolentino, “pela primeira vez na história da humanidade, a biologia passa a interagir intimamente com a tecnologia, propondo-se como um corretor da biografia humana. O transhumanismo pretende ser uma versão melhorada do corpo humano introduzindo ajudas que já não são externas, mas internas. O ser humano renuncia a ser o seu próprio corpo limitando-se a ter um corpo.”
Diante do surgimento de novas tecnologias, como a Inteligência Artificial, e do uso imoral que delas pode ser feito, o cardeal recordou o antídoto da “promoção do pensamento crítico” indicado pelo Papa Francisco. “O sentido ‘crítico’ é constitutivo da fé cristã”, recordou o prelado. “Na verdade, a crise reside no cromossoma do Cristianismo. Foi - já há dois mil anos - não apenas um espectador, mas a causa do declínio do mundo antigo: a primeira grande mudança de época que o próprio Cristianismo começou. A partir desse momento, a crise nunca mais deixou de acompanhá-lo, desencadeando uma sucessão de outonos e primaveras. A fé pode entrar em crise, certamente. A era da secularização grita isso sem muita cerimónia. Mas também a fé cristã deve constituir uma causa de crise, e questionar e transformar continuamente os sistemas sociais e culturais onde vive. Se não provoca crise, isto é, se não leva ao discernimento evangélico da realidade, desacelera, e deixa de testemunhar a fala do que está sentado sobre o trono: «Eis que faço novas todas as coisas» (Ap 21:5).”
Se já não vivemos mais numa era de fé homogênea, destaca o cardeal, também já não estamos mais no tempo em que o ateísmo parecia reclamar uma espécie de superioridade cultural. Nesse mundo de possibilidades a redescobrir, será missão da Igreja “privilegiar o exercício do diálogo.”
Fotos: Bruno Carvalho
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