Igreja sinfônica e sinodal: Primeira Sessão do Sínodo sobre a sinodalidade
Joaquim Jocélio de Sousa Costa - Diácono da Diocese de Limoeiro do Norte-CE
Os sínodos não são novidade na Igreja. Desde os primeiros séculos são assembleias eclesiais para pensar, rezar e traçar juntos os caminhos para a Igreja diante dos desafios que aparecem para a evangelização. Mas a estrutura que temos hoje dos sínodos surgiu com o Papa Paulo VI em 1965. O chamado Sínodo dos Bispos é uma assembleia de caráter consultivo, com representação do episcopado no mundo todo, mas também com a colaboração dos demais membros do povo de Deus.
Essa forma dos sínodos sofreu algumas mudanças nos últimos tempos, principalmente com o Papa Francisco e foi este Sínodo sobre a sinodalidade que trouxe mais mudanças significativas. Foi dividido em três fases: Diocesana (com a escuta ao povo de Deus de todas as dioceses do mundo); Continental (assembleias em sete continentes – América Latina, América Anglo-saxônica, África, Europa, Oceania, Ásia e Oriente Médio) e Universal. O Papa Francisco quis que esta última fase se dividisse em duas Sessões. Em outubro do ano passado foi a primeira e em outubro deste ano será a segunda. A sessão do ano passado se concluiu com um Relatório de Síntese (RS) para alargar a reflexão nas Igrejas locais. Ainda não é um documento final, mas resume bem as discussões até então.
Mais que tratar dos apontamentos desse texto, gostaríamos de destacar elementos da Primeira Sessão que contribuíram para um verdadeiro caminho de sinodalidade e orientaram o próprio Relatório de Síntese. A começar pela homilia do papa Francisco na missa de criação dos novos cardeais, dias antes da Primeira Sessão. Usando a imagem de uma orquestra com muitos instrumentos e músicos, mas uma única canção, ele afirmou que “uma sinfonia vive da sábia composição dos timbres dos diversos instrumentos: cada um dá o seu contributo, ora sozinho, ora combinado com outro, ora com todo o conjunto. A diversidade é necessária, é indispensável. Mas cada som deve concorrer para o resultado comum. E, para isso, é fundamental a escuta mútua: cada músico deve ouvir os outros... Faz-nos bem espelhar-nos na imagem da orquestra, para aprendermos cada vez melhor a ser Igreja sinfônica e sinodal”. Como numa orquestra, na Igreja, cada fiel toca um instrumento (tem um carisma ou ministério) e deve trabalhar em harmonia (comunhão) com todos, trabalhando pela mesma sinfonia (o Reino de Deus). Pois como recordou o Sínodo, a Igreja não coloca a si mesma no centro, mas está a serviço do advento do Reino (Cf. RS 2b; 4g; 8a; 9a; 14b; 15e).
Neste mesmo dia, aconteceu uma vigília ecumênica que reuniu várias Igrejas para rezar junto com o papa pelo Sínodo. Esse momento foi muito significativo, pois como expressaria o Sínodo, “não pode haver sinodalidade sem dimensão ecumênica” (RS 7b), afinal, “a Igreja tem consciência de que o Espírito pode falar através das vozes de homens e mulheres de todas as religiões, convicções e culturas” (RS 5f).
Inspiradora foi a homilia do papa na missa de abertura, quando afirmou que devemos ser “uma Igreja ‘de jugo suave’ (Cf. Mt 11,30), que não impõe pesos... A Igreja das portas abertas para todos, todos, todos!... O olhar bendizente e acolhedor de Jesus impede-nos de cair em algumas tentações perigosas: ser uma Igreja rígida... Ser uma Igreja tépida, que se rende às modas do mundo... O Sínodo serve para nos recordar isto: a nossa Mãe Igreja sempre precisa de purificação, de ser ‘reparada’”.
A organização da assembleia em mesas redondas, e não na forma de arquibancada como era, ajudou mais ainda a expressar o que o próprio Relatório de Síntese iria exprimir, que a igual dignidade batismal precede qualquer ministério (Cf. RS 18a). A presença de mulheres que pela primeira vez tiveram direito a voto, as chamadas madres sinodais, foi outro grande sinal do Espírito. Tanto que o próprio Sínodo, em suas propostas, expressaria que “é urgente garantir que as mulheres possam participar nos processos de decisão e assumir papeis de responsabilidade na pastoral e no ministério... Consequentemente, é necessário adaptar o direito canônico” (RS 9m). O momento de oração pelos migrantes e o dia de oração pela paz ajudou a recordar as situações gritantes de conflito e miséria no mundo que vivemos e como a Igreja, para ser fiel a Jesus, precisa se confrontar com esses problemas e lutar para que a vontade de Deus (seu amor, sua justiça e paz) prevaleça entre nós. Afinal, “uma Igreja sinodal precisa colocar os pobres no centro de todos os aspectos da sua própria vida” (RS 4h).
Por fim, gostaríamos de destacar a intervenção que o Papa Francisco fez na 18ª Congregação geral. Uma fala profética e orientadora que, sem dúvidas, ajudou os padres e madres sinodais a recordarem a gravidade de um dos maiores desafios à sinodalidade que é o clericalismo: “Quando os ministros excedem o seu serviço e maltratam o povo de Deus, desfiguram o rosto da Igreja com atitudes machistas e ditatoriais... O clericalismo é um chicote, é um flagelo, é uma forma de mundanismo que suja e prejudica o rosto da esposa do Senhor; escraviza o povo santo e fiel de Deus”. O sínodo mesmo afirmou que o clericalismo é um obstáculo, pois entende o chamado divino como privilégio em vez de serviço. Por isso, deve ser contrastado com a proximidade às pessoas e serviço aos necessitados (Cf. RS 11c).
O Sínodo continua! Em outubro teremos a Segunda Sessão com seu Documento final e, no início do próximo ano, a Exortação Apostólica do Papa com os grandes encaminhamentos e decisões do Sínodo. Procuremos conhecer o Relatório de Síntese, levar suas provocações para as bases. Mas não podemos esquecer: o Sínodo se conclui este ano, mas a sinodalidade é para sempre! Nosso desafio permanente é ser Igreja sinfônica e sinodal, caminhando juntos como povo do Senhor, na igual dignidade batismal, lutando por um mundo mais justo e fraterno, sinal do Reino de Deus.
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