Sínodo: é urgente uma renovação dos processos de formação nos Seminários
Rui Saraiva – Portugal
Decorre por estes dias, de 29 de abril a 2 de maio, em Roma a Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” e a reflexão é sobre “Como ser uma Igreja local sinodal em missão”.
Uma forma nova de ser pastor
O padre Sérgio Leal, nosso habitual colaborador, está a participar nesta grande assembleia como pároco da diocese do Porto em Portugal. O especialista em sinodalidade, antes da sua partida para Roma, frisou que é urgente uma renovação da formação nos seminários.
“Que ela é urgente em Portugal, disso não tenho dúvidas. É necessária uma renovação dos processos de formação em Portugal e alargando ao nosso contexto ocidental europeu. Mas, em alguns países encontramos já claros sinais de uma renovação da formação nos seminários. Por um lado, porque a redução do número de candidatos ao ministério ordenado devia levar a um renovado processo de formação. Não porque os números sejam importantes, não vivemos a obsessão do número, mas por aquilo que isto implica de trabalho conjunto, de formação de comunidade, de construção comunitária. Neste contexto, a formação para a comunidade, para as relações fraternas, é fundamental, bem como a formação para um novo ministério pastoral nesta Igreja sinodal: uma forma nova de ser pastor que nos liberta da clericalização, de que tantas vezes nos fala o Papa Francisco, que nos liberta da autorrerencialidade do nosso ministério, que nos liberta também do peso de tudo estar sobre o ministro ordenado e que a sinodalidade possa ser muito mais do que uma simples partilha de competências, uma simples partilha daquilo que já não podemos fazer, mas que a sinodalidade seja oferecer aos leigos aquilo que eles em virtude da sua missão na Igreja, têm a missão de fazer”, declara.
O padre Sérgio Leal no passado mês de fevereiro concluiu o seu doutoramento em Teologia Pastoral com uma tese intitulada “Pastores para uma Igreja em saída”. Foi na Pontifícia Universidade Lateranense, onde em 2018 já se tinha licenciado com um texto sobre a sinodalidade como estilo pastoral, tema do qual, aliás, é um dos principais especialistas mundiais de língua portuguesa.
Inadiável conversão dos processos de formação
Para o sacerdote português, este caminho sinodal da Igreja “implica uma inadiável conversão dos processos de formação”. De todos, mas, em particular, do clero.
“Este caminho sinodal que a Igreja está a fazer implica uma inadiável conversão dos processos de formação. E de formação no seu todo, de percebermos que a catequese tem que ser feita em estado sinodal, porque esta formação não pode ser uma mera transmissão de conceitos, ou seja, transmitir uma nova eclesiologia de comunhão que está na base da vida sinodal. Não basta isto. É necessário que esta formação para a sinodalidade passe pelo exercício concreto da sinodalidade. Por isso, dizemos que numa paróquia para que haja de facto uma formação de todos para a sinodalidade importa criar e valorizar os diferentes conselhos e estruturas de sinodalidade, criar eventos e momentos e processos que sejam sinodais na paróquia onde as pessoas sentem-se envolvidas a participar e aí desenvolvam essas competências sinodais. E se isto é necessário no todo da Igreja como formação, mais ainda naqueles que têm uma função de liderança decisiva no modo como as paróquias se estruturam. Infelizmente, ainda muitas vezes a paróquia vive à imagem do seu pároco, porque é ele que tem a missão de presidir a essa comunidade e está bem, ele tem a missão de presidir ao discernimento comunitário, de presidir à tomada de decisão, mas que envolva todos. E para isso é necessária uma renovada formação que começa na formação inicial dos seminários até à formação permanente do clero e só assim podemos ver um modelo de pastor mais incarnado no tempo em que vivemos”, declara o sacerdote.
O padre Sérgio Leal já no passado mês de novembro alertava para a necessidade de ser repensado o ministério ordenado e o modo de ser pastor.
Sinodalidade na formação do clero
“É preciso pensar e repensar um novo modo de ser pastor hoje. Se o repensar da sinodalidade coloca em causa o nosso modo de evangelizar hoje, o modo como a Igreja responde à realidade contemporânea e se em tantos lugares isto necessita de uma renovação urgente, tanto mais no modo como olhamos o ministério ordenado. A hierarquia não é de prescindir, no contexto de uma Igreja sinodal. Sabemos que não estamos a entrar, como o Papa tem referido vezes sem conta, num parlamentarismo. Portanto, aqui estamos todos de acordo, de que o ministério ordenado, o ministério hierárquico, é fundamental para a construção da Igreja sinodal. É o modo como Deus e o próprio Jesus constitui a Igreja, escolhe doze, mas tem como interlocutor primeiro as multidões: uma Igreja que se destina a todos e de onde alguns são escolhidos para o exercício de um ministério de serviço à comunidade. E é este repensar do ministério pastoral hoje que é fundamental. De percebermos que o clericalismo, tantas vezes motivado pelo clero ou até motivado pelos leigos que vivem, muitas vezes, na dependência do clero e de uma pastoral clericocêntrica, tem de encontrar um fim o mais rápido possível, para que se sublinhe aquilo que neste Sínodo fica tão sublinhado: o protagonista da ação da Igreja é todo o povo de Deus. Aquilo que acontece no Concílio Vaticano II, na Lumen Gentium de modo claro. O primeiro capítulo do texto sobre a Igreja, a Lumen Gentium é a Igreja como Mistério, o segundo a Igreja como Povo e depois, só a partir daí, começa a falar da constituição hierárquica, dos leigos, dos religiosos. Isto é, antes de olharmos aquilo que nos distingue em funções, serviços e ministérios na Igreja, olhamos para a Igreja no seu todo, como povo que somos. E mais do que decidirmos pela Igreja, é decidirmos como Igreja. E aqui o ministério ordenado tem necessariamente que se repensar”, afirma o sacerdote.
Para o especialista em sinodalidade, é fundamental que, a partir de agora, a formação permanente do clero e a formação inicial nos seminários tenham em conta o princípio sinodal. Assinala o risco da perda de representatividade do ministério ordenado na sociedade de hoje.
“Em primeiro lugar, o ministério ordenado, ser padre, ser bispo hoje: só encontraremos o lugar que devemos ocupar se for prioritário, já a partir de agora, que a formação permanente do clero e a formação inicial nos seminários diocesanos tenham em conta este princípio sinodal. É fundamental que a formação permanente do clero, as equipas de formação nos seminários diocesanos, apontem o projeto educativo, os programas de formação, a partir desta perspetiva sinodal. Porque de outro modo perderemos não apenas o andamento do Sínodo, não perderemos apenas esta perspetiva do Papa Francisco, mas, eu creio, que perderemos o modo do nosso ministério ordenado ser ainda representativo para a sociedade de hoje”.
O Relatório de Síntese da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos é fruto do processo sinodal que foi aberto a 9 de outubro de 2021 e que envolveu etapas diocesanas, nacionais e continentais.
Este documento, “recolhe as convergências, as questões a aprofundar e as propostas que surgiram do diálogo” desenvolvido na primeira sessão do Sínodo em Roma que decorreu em outubro de 2023.
Até dia 2 de maio próximo a Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” recolhe a reflexão de mais de 200 párocos em ritmo de oração, de escuta e de partilha de experiências.
De Portugal, por indicação da Conferência Episcopal Portuguesa estão presentes o padre Sérgio Leal, da diocese do Porto e o padre Adelino Guarda da diocese de Leiria-Fátima. Também da diocese do Porto está presente o padre António Bacelar, a convite da Secretaria Geral do Sínodo.
As conclusões desta grande assembleia de párocos de todo o mundo vão ser contributo relevante para a elaboração do Instrumentum Laboris, o documento de trabalho para a segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos do próximo mês de outubro.
Laudetur Iesus Christus
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