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Sacerdotes durante a Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” /foto: Rui Saraiva Sacerdotes durante a Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” /foto: Rui Saraiva 

“Há ainda muita dificuldade em implementar processos sinodais nas dioceses”

Na Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” alguns sacerdotes revelaram que as principais resistências ao Sínodo vêm de padres e bispos. Disto nos fala o padre Sérgio Leal, da diocese do Porto, assinalando que o exercício sinodal é imprescindível para a renovação eclesial.

Rui Saraiva – Portugal

A Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” decorreu em Roma de 29 de abril a 2 de maio sobre o tema “Como ser uma Igreja local sinodal em missão” e nela participou o padre Sérgio Leal, pároco de Anta e Guetim na diocese do Porto, por indicação da Conferência Episcopal Portuguesa.

Variedade de culturas com dificuldades em comum

O especialista em sinodalidade, assinala a catolicidade deste encontro com a presença de párocos de 90 países. Sublinha que na variedade das expressões de vivência da fé, há dificuldades em comum, não obstante as diferentes geografias de cada pároco.

“Em primeiro lugar temos que dizer que se tratava de um encontro no qual estávamos quase 200 párocos de 90 países e dos 5 continentes. A primeira grande impressão é esta experiência de catolicidade que ali pude viver. Uma experiência verdadeiramente eclesial de conhecer e perceber diferentes realidades, onde o mesmo Evangelho encarna e encontra diferentes formas de expressão. No meu grupo de trabalho, que era de língua italiana, tínhamos desde um padre da Eslováquia à Sérvia, ao Chile, um padre de 25 anos que tinha sido ordenado em setembro passado nas Filipinas, até a um monsenhor de Nápoles com 80 anos. Isto é, uma variedade de experiências e de culturas. Uma variedade de expressões e de vivência da fé, onde encontramos pontos em comum do modo como vivemos a fé, dificuldades que são comuns, mesmo com geografias tão diversas, mas também com prioridades tão diferentes.

Quando na Europa ocidental andamos preocupados com o número de vocações, ou com processos burocráticos de acesso ao batismo, encontramos depois padres onde a prioridade é ajudar os seus fiéis em contexto de guerra, como é o caso da Moldávia ou da Ucrânia, ou então países de domínio islâmico onde celebram a Eucaristia sabendo que uma bomba pode rebentar a qualquer momento. Portanto, esta experiência de catolicidade é já uma expressão daquilo que deve ser a sinodalidade.

Por outro lado, este encontro confirma em mim que a sinodalidade é o caminho imprescindível para a Igreja enfrentar os desafios do novo milénio. Isto é, a sinodalidade é um caminho fundamental para a renovação eclesial. Este encontro sinodal de párocos adotou a metodologia sinodal da conversação no Espírito, que para mim foi o confirmar da importância dela para uma verdadeira renovação eclesial. De que a renovação da Igreja acontece quando juntos procuramos escutar a voz do Espírito Santo olhando a realidade e sendo fiéis à Palavra que o Senhor nos deixou. Porque este é o exercício sinodal: numa fidelidade criativa à tradição encontrarmos os caminhos que o Senhor nos está a pedir aqui e agora”, afirma.

Missionários da sinodalidade

O sacerdote português salienta a importância da iniciativa de dar voz aos párocos e considera que o desafio lançado pelo Papa destes serem missionários da sinodalidade é uma grande responsabilidade.

“Isto é uma grande responsabilidade a que o Papa nos confiou de sermos missionários da sinodalidade. Que aquilo que ali vivemos o pudéssemos trazer para o nosso país. O Papa, com certeza, da parte do cardeal Grech e do cardeal Lazarus, teve ecos daquilo que tinha sido a assembleia sinodal, daquilo que foi a partilha dos grupos e onde se reafirmou a importância deste encontro. Os padres manifestaram isso na conversa com o cardeal Grech, manifestamos a alegria de podermos ser chamados a pronunciarmo-nos sobre a realidade paroquial. O cardeal Grech devolvia a resposta dizendo que era importante ouvir os párocos, que eles estão diretamente na realidade e sobretudo que é aí que a Igreja acontece no contacto com o povo de Deus. De que esse é o primeiro lugar de exercício da sinodalidade”, sublinha.

Resistências ao processo sinodal

O padre Sérgio Leal recorda que o Papa, no encontro com os párocos, lançou os desafios da valorização dos carismas e dons presentes nas comunidades, da prática do discernimento comunitário e da vivência da comunhão e da fraternidade. Assinala que alguns sacerdotes que participaram na Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” revelaram que as principais resistências ao Sínodo vêm de padres e bispos. “Há ainda muita dificuldade em implementar processos sinodais nas dioceses”, afirma o sacerdote.

“O Papa começou por responder a um conjunto de perguntas muito interessantes. Uma delas era sobre as resistências à sinodalidade. Isto era também uma questão abordada nos trabalhos de grupo onde foi revelado que há ainda muita dificuldade em implementar processos sinodais nas dioceses. E aquilo que diziam os padres na partilha era que os impedimentos não eram da parte dos fiéis, porque desses até se encontrava muita expectativa no processo sinodal, mas sobretudo quer no presbitério, quer da parte do bispo, tantas vezes se encontravam resistências à implementação destes processos sinodais. E o Papa pede que se caminhe de coração livre, que seja o Espírito o protagonista da ação da Igreja e que isto só poderá acontecer abraçando uma Igreja sinodal.

E o Papa lançava três desafios fundamentais aos párocos e às comunidades paroquiais: em primeiro lugar valorizar os dons e carismas que o Espírito suscita em cada comunidade. Não ter medo da diversidade e fazer dela lugar de comunhão. Valorizarmos os dons e carismas dos fiéis, de todos e de cada um, porque cada um é uma pedra fundamental na construção eclesial. Depois em segundo lugar, o processo de discernimento comunitário, abraçarmos processos de discernimento comunitário. O Papa dizia de modo muito simples e franco: ‘há um problema, sentai-vos juntos à mesa, conversai sobre ele, dizei cara-a-cara’. Falava até de um pecado das comunidades que é o da coscuvilhice e do dizer mal um dos outros. ‘Ou dizeis cara-a-cara ou então mastigai e engoli’, disse o Papa. Se há um problema na comunidade então conversamos sobre ele. E conversamos, não a partir dos nossos princípios ou ideias, mas a partir daquilo que o Espírito suscita em nós. Este processo de discernimento comunitário ou dito de outro modo, a conversação no Espírito, que foi a metodologia adotada pelo Sínodo, para mim foi de facto muito importante vivê-lo na assembleia sinodal dos párocos, porque me permite confirmar da importância da adoção deste modelo nas nossas estruturas sinodais, sejam os conselhos paroquias de pastoral, sejam os conselhos diocesanos. A importância deste modelo que nos liberta da autorreferencialidade e nos permite centrarmos no que o Espírito nos diz e ser capazes de partilhar isto escutando o outro. E finalmente, o Papa pedia a comunhão e a fraternidade apelando em primeiro lugar entre nós os presbíteros, depois entre os presbíteros e o bispo, mas numa paróquia isto tem que ser alargado à comunhão e à fraternidade entre todos”, diz o sacerdote.

A Assembleia Mundial “Párocos pelo Sínodo” recolheu a reflexão de mais de 200 párocos em ritmo de oração, de escuta e de partilha de experiências. De Portugal, por indicação da Conferência Episcopal Portuguesa, estiveram em Roma o padre Sérgio Leal, da diocese do Porto e o padre Adelino Guarda da diocese de Leiria-Fátima. Também da diocese do Porto esteve na Assembleia de párocos, a convite da Secretaria Geral do Sínodo, o padre António Bacelar.

As conclusões desta grande assembleia de párocos de todo o mundo serão contributo relevante para a elaboração do Instrumentum Laboris, o documento de trabalho para a segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos do próximo mês de outubro.

Laudetur Iesus Christus

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29 maio 2024, 09:47