Sínodo. Portugal: relatório alerta para o clericalismo e destaca papel da mulher na Igreja
Rui Saraiva – Portugal
No passado dia 2 de maio a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) fez publicar o relatório relativo à fase atual do Sínodo iniciado pelo Papa Francisco em 2021.
O Relatório de Síntese da primeira sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos foi objeto de estudo nas dioceses de todo o mundo. As dioceses portuguesas publicam agora a sua reflexão.
O trabalho apresentado foi elaborado pela Equipa Sinodal da CEP da qual fazem parte os seguintes membros: José Eduardo Borges de Pinho, professor jubilado da Universidade Católica Portuguesa; Pedro Vaz Patto, presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz; padre Eduardo Duque, professor da Universidade Católica Portuguesa; Carmo Rodeia, diretora do Serviço Diocesano para as Comunicações Sociais da Diocese de Angra; Anabela Sousa, diretora do Gabinete de Comunicação da CEP e o padre Manuel Barbosa, Secretário e porta-voz da CEP.
Clericalismo e resistência a mudanças
Ressalta do texto da CEP a preocupação de “continuar a fazer um discernimento sobre algumas questões doutrinais/pastorais que ainda causam dúvida, controvérsia ou desacordo na vida da Igreja”. São elas “a moral sexual, o celibato dos padres, o envolvimento de ex-padres casados, a possibilidade de ordenação de mulheres”.
A CEP assinala a existência de “resistência a mudanças” apontando a necessidade de se “continuar a refletir sobre os fatores que motivam a indiferença de muitos, as resistências às mudanças e os caminhos para as ir ultrapassando”.
Especial destaque para o reconhecimento de que a “a Igreja continua muito centrada no clero e em alguns leigos ‘clericalizados’. “O clericalismo, que, entre outros aspetos, se manifesta numa conceção de privilégio pessoal, num estilo de poder mundano e na recusa a prestar contas, é um obstáculo sério ao exercício de um ministério ordenado autêntico”, refere o relatório.
“O clericalismo atinge também os leigos com responsabilidades na vida da Igreja local e das comunidades. Combater a clericalização do laicado passa muito pela rotatividade nas lideranças e pelo desenvolvimento de metodologias de participação comunitária”, afirma o documento.
O papel da mulher na vida eclesial
No relatório da CEP é “reconhecida a importância de valorizar o papel das mulheres na vida eclesial e assegurar que possam participar nos processos de decisão”. Para essa participação ser concreta as mulheres devem assumir “papéis de liderança, especificamente nos conselhos pastorais e económicos”.
“Deve-se procurar a meta da paridade, reconhecendo explicitamente o contributo crucial das mulheres, não apenas na pastoral e nos ministérios, mas também na missão da Igreja junto das comunidades. Existe uma clara perceção de que a Igreja tem muito a ganhar com uma intervenção mais relevante das mulheres, de um modo particular, no anúncio e na meditação da Palavra de Deus, para uma verdadeira vivência sinodal e reconhecimento pleno dos seus dons e capacidades”, sustenta o documento.
Corresponsabilidade, ministérios e juventude
Neste documento é sublinhado que a “corresponsabilidade diferenciada na missão de todos os membros do Povo de Deus, de acordo com as vocações, carismas, serviços, e ministérios, deve ser o modelo normal da vida eclesial”.
Esta forma de trabalho permite organizar a “Igreja como uma família e não como uma estrutura, criando meios para a valorização da relação fraternal e teologal nas comunidades, assim como a atenção particular a alguns setores: o mundo da saúde, do serviço aos mais pobres e o acolhimento aos de fora”.
“Em ordem a implementar um modelo pastoral corresponsável é feita a sugestão de se criar a figura de um ‘coordenador pastoral’ como elo entre o pároco e a comunidade. É sugerida, uma maior celeridade e participação laical nos processos de nomeação dos bispos.
Ainda sobre a corresponsabilidade é salientado que se desenvolvam com maior criatividade os ministérios batismais e laicais sendo referido que estes “não devem limitar-se à vida interna eclesial, mas concretizar-se também noutras áreas da vida social que interpelam a responsabilidade cristã no mundo”, como por exemplo nos domínios da doença, do luto, dos refugiados ou dos desempregados.
É proposta uma atenção especial aos jovens, considerando que estes devem ser interpelados a serem protagonistas da vida comunitária “assumindo serviços e ministérios, organizando atividades pastorais e integrando-se nas equipas de animação pastoral”.
Integrar a pessoa com deficiência e dar voz aos pobres
No relatório da CEP é dada especial atenção à integração das pessoas com deficiência, reconhecendo que muitas delas “vivem uma condição de solidão próxima ao abandono, chegando mesmo a sentirem-se invisíveis para a sociedade”.
“A Igreja tem a missão de se aproximar” das pessoas com deficiência para “escutá-las, acolhê-las e acompanhá-las, combatendo a cultura do descarte”.
“É necessário remover barreiras físicas e atitudinais para uma plena participação de todos”, refere o texto que propõe que “as comunidades cristãs devem integrar pessoas com deficiência nos seus Conselhos Pastorais como forma de reconhecer e valorizar as suas capacidades apostólicas”.
Ao mesmo tempo, neste relatório são lembrados os pobres sendo feita a recomendação de “um esforço no sentido de mais proatividade na consciência e prática da caridade”. São sugeridas “formas de integração dos pobres que vão para além do assistencialismo” num esforço que envolva paróquias e Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), refere o documento.
Pedagogia sinodal na formação dos ministros ordenados
Segundo o relatório da CEP “para uma Igreja sinodal em missão urge reconhecer a necessidade de formação de todos os membros da Igreja. Caminhar juntos requer a capacidade de utilizar uma linguagem comum enriquecida pelos diferentes idiomas que decorrem da diversidade de dons, carismas, vocações e ministérios”.
Especial atenção “deve ser dada à formação dos ministros ordenados, incluindo nos planos formativos uma pedagogia sinodal de modo a fomentar capacidades de liderança e evitar mentalidades clericalizadas e clericalizantes. É urgente que a formação seja orientada para a corresponsabilidade”, refere o documento.
“A formação a desenvolver deve ser humana e cristãmente abrangente, com proximidade à vida real do povo de Deus, em vista do acompanhamento eficaz de pessoas e situações concretas, adequada à realidade do mundo e sintonizada com uma Igreja que procura receber e concretizar o Concílio, acompanhada pela presença feminina entre os formadores. Devem implementar-se formas de ajuda e encorajamento para a dinamização de um serviço eclesial mais fecundo, promovendo um acompanhamento humano e espiritual para valorização de cada pessoa e fortalecimento do seu ministério”, diz o relatório.
É sugerida “a valorização de diversos aspetos a ter em conta na formação: na área da psicologia e do trabalho em equipa”. O texto propõe trabalho com “comunidades mais desfavorecidas e periféricas”, como por exemplo, prisões, comunidades em que se cuide de doentes, comunidades de migrantes ou comunidades com minorias étnicas.
O relatório refere também o “acompanhamento do amadurecimento afetivo e sexual na formação dos ministros ordenados”.
Neste relatório é valorizada a família como sendo “centro da vida eclesial” e a sua relevância na dinâmica das comunidades. Destaque também para a importância da comunicação dentro e fora da Igreja. É proposta “uma Igreja mais relacional” onde sejam promovidos “os laços de encontro e comunicação entre paróquias”.
Fica aqui o essencial da informação contida no relatório da CEP nesta fase de 2024 do caminho sinodal da Igreja.
A segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos será em Roma no próximo mês de outubro.
Laudetur Iesus Christus
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