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Teólogo Tomáš Halík (Foto: Rede Sinodal em Portugal) Teólogo Tomáš Halík (Foto: Rede Sinodal em Portugal)  (Rui Saraiva)

Tomáš Halík pede “milagre” para “mudar” a mentalidade “de alguns clérigos”

A Rede Sinodal em Portugal publica entrevista com o teólogo checo no âmbito da iniciativa “No coração da esperança”, promovida em parceria com os seguintes meios de comunicação social: Diário do Minho, Voz Portucalense, Correio do Vouga, Correio de Coimbra, A Guarda, 7Margens, Rede Mundial de Oração do Papa e Folha do Domingo.

Rui Saraiva – Portugal

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O teólogo Tomáš Halík esteve recentemente em Portugal para lançar o seu livro “O sonho de uma nova manhã – Cartas ao Papa”. Em entrevista à Rede Sinodal em Portugal o sacerdote checo considera que “há muito boas ideias” no Documento Final do Sínodo, assinalando a importância do caminho a percorrer para “pô-lo em prática”.

Interpretar e pôr em prática o Documento do Sínodo

 

“O Sínodo deve libertar-nos deste clericalismo, de apenas ouvir e esperar”, afirma o padre Halik numa entrevista publicada no âmbito da iniciativa “No coração da esperança”, promovida pela Rede Sinodal em Portugal em parceria com os seguintes meios de comunicação social: Diário do Minho, Voz Portucalense, Correio do Vouga, Correio de Coimbra, A Guarda, 7Margens, Rede Mundial de Oração do Papa e Folha do Domingo.

P: Quanto ao Documento final do Sínodo muitos passaram do entusiasmo à desilusão. Qual é a sua leitura?

R: Admiro os autores deste documento, porque não foi fácil resumir tantas vozes. E logo de seguida. Esperava que o documento chegasse dois meses depois da última sessão, mas foi no último dia da sessão. Portanto, não é fácil juntar todas estas vozes muito diferentes num só documento. Por isso, admiro essas pessoas.

Mas há muitas políticas boas para o futuro. Por isso, não podemos esperar que o Sínodo tenha a solução para todos os problemas. Não é um concílio. Penso que foi mais como um retiro espiritual para inspirar as pessoas, para dar alguma inspiração para dar alguns impulsos e para apoiar a energia para ir mais longe. Há muito boas ideias no documento do Sínodo, mas agora o caminho é como interpretá-lo e como pô-lo em prática.

Por isso, mesmo que as pessoas digam, porque é que não temos todas as respostas do Papa e do Vaticano? E criticam o Papa e o Sínodo, mas isto é o clericalismo: a expectativa de que será decidido de alguma forma pelas estruturas. Não! Agora temos a responsabilidade de o fazer a partir das bases. O Sínodo deve libertar-nos deste clericalismo, de apenas ouvir e esperar. As pessoas, estão desiludidas, devido a expectativas demasiado irrealistas. Para ficarem satisfeitas, tem de haver um equilíbrio entre as expectativas e a realidade e, por isso, não devemos ter expectativas irrealistas, mas sim assumir a nossa própria responsabilidade.

P: Promover uma transformação das mentalidades foi o que o levou a escrever o seu novo livro. Considera que o Sínodo é o primeiro passo necessário na Igreja para essa renovação?

R: Antes de mais temos de ouvir e, depois deste silêncio, deste momento contemplativo, colocar para o exterior o que ouvimos, e também a voz do nosso subconsciente, do nosso coração, para juntar tudo e pensar sobre isso no Espírito. Por isso, penso que esta conversa no Espírito é tão importante que as reuniões sinodais são uma forma de oração, de oração contemplativa. Não se trata apenas de uma conferência científica. Esta é a minha sugestão para o Papa para a próxima reunião dos teólogos. Penso que o encontro ecuménico dos teólogos não deveria ser apenas um congresso científico, mas aplicar mais este método de sinodalidade, de ouvir, de refletir, de meditar, de rezar e depois juntar o fruto desta meditação.

P: Os participantes na iniciativa “Párocos pelo Sínodo” declararam que a principal resistência ao processo sinodal vem dos bispos e dos padres. Como será possível aplicar as conclusões do Sínodo sem correr o risco de fazer apenas uma transformação estética a uma Igreja clerical que continua a persistir?

R: Pergunta difícil, penso que mudar a mentalidade de algumas pessoas, especialmente, de alguns clérigos, seria uma maravilha, um milagre. Acreditamos em milagres, mas não os podemos manipular. Podemos rezar, podemos discutir sobre isso, mas não podemos manipular milagres. Por isso, para mudar a mente de algumas pessoas, seria realmente um milagre. Eu acredito em milagres, mas não podemos contar com isso.

"No Coração da Esperança", Episódio 1 - Tomáš Halík

Um caminho de harmonia para todos

 

O Documento Final do Sínodo publicado no dia 26 de outubro foi aprovado nos seus 155 pontos e apresenta o fruto de 3 anos de escuta do povo de Deus. Um tempo que colocou em caminho milhões de pessoas em todo o mundo refletindo sobre o tema “Por uma Igreja sinodal: participação, comunhão e missão”.

Nesta segunda e última sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos em Roma participaram 368 membros com direito a voto, dos quais 272 eram bispos; à imagem do que aconteceu na primeira sessão em 2023, mais de 50 votantes foram mulheres, entre religiosas e leigas de vários países.

O Papa Francisco no seu discurso no encerramento deixou bem claro o caráter inclusivo do texto agora publicado. Sublinhou a procura da “harmonia” num caminho “rumo à plena manifestação do Reino de Deus, que a visão do Profeta Isaías nos convida a imaginar como um banquete preparado por Deus para todos os povos”, disse o Papa.

“Todos, na esperança de que não falte ninguém. Todos! Todos! Todos” Ninguém fique de fora! Todos! E a palavra-chave é esta: a harmonia, que é obra do Espírito; a Sua primeira manifestação forte, na manhã de Pentecostes, é harmonizar todas aquelas diferenças, todas aquelas línguas, todas aquelas coisas… Harmonia!”, assinalou.

Francisco apelou a uma Igreja sem muros. “Quanto mal causam os homens e mulheres da Igreja quando erguem muros! Não nos devemos comportar como ‘dispensadores da Graça’ que se apropriam do tesouro, amarrando as mãos do Deus misericordioso”, referiu o Santo Padre.

O Papa deixou mesmo uma indicação literária com a sugestão de um poema da escritora francesa Madeleine Delbrêl, “a mística das periferias”, sublinhando uma ideia: “acima de tudo, não sejas rígido”.

O Papa assinalou que a rigidez é um pecado que tantas vezes também afeta “os clérigos, os consagrados e as consagradas”. Uma chamada de atenção do Santo Padre para que o Documento Final desta assembleia sinodal seja acolhido com abertura.

Francisco anunciou a sua intenção de não publicar uma exortação apostólica, algo que acontece pela primeira vez, mas que está previsto na  constituição apostólica ‘Episcopalis communio‘ sobre o Sínodo dos Bispos, publicada em 2018 pelo Papa Francisco.

Palavras e atos na receção do Documento nas dioceses

 

Entretanto, Francisco alertou os participantes no Sínodo para a necessidade de tornar acessível os conteúdos do Documento Final, em especial com o “testemunho da experiência vivida”. “A igreja sinodal para a missão precisa, agora, que as palavras partilhadas sejam acompanhadas de atos”, assinalou o Papa.

Abre-se, assim, um tempo novo no qual, tal como disse o Papa, as palavras partilhadas devem ser acompanhadas por ações. Ou seja, a receção das conclusões nas dioceses, que é a terceira fase do Sínodo, não deverá ficar apenas pela leitura e reflexão do Documento Final, mas será necessária uma reforçada criatividade na difusão da informação produzida nesta sessão sinodal.

Destaque especial para o método sinodal da “Conversação no Espírito” que no número 45 do Documento Final ficamos a saber que “a sua prática tem suscitado alegria, espanto e gratidão e tem sido experimentada como um caminho de renovação que transforma as pessoas, os grupos e a Igreja”, pode-se ler no Documento.

Documento Final faz parte do magistério pontifício

 

No passado dia 25 de novembro, o Papa Francisco pronunciou-se através de uma Nota de Acompanhamento do Documento Final do Sínodo, afirmando que este tem valor como “magistério” pontifício. O Santo Padre sublinhou a necessidade da implementação do Documento Final do Sínodo nas comunidades católicas.

“O documento final faz parte do magistério ordinário do sucessor de Pedro [o Papa] e, como tal, peço que seja aceite. Ele representa uma forma de exercício do magistério autêntico do bispo de Roma que tem algumas características novas, mas que, de facto, corresponde ao que tive a oportunidade de apontar em 17 de outubro de 2015, quando afirmei que a sinodalidade é a estrutura interpretativa apropriada para entender o ministério hierárquico”, pode-se ler na nota.

O discurso a que se refere o Santo Padre foi por ele proferido no 50.º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos.

Em Portugal está marcado para o dia 11 de janeiro em Fátima, por iniciativa da Conferência Episcopal Portuguesa, um encontro nacional sobre o Sínodo.

Laudetur Iesus Christus

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03 dezembro 2024, 13:06