Os desafios do Líbano entre colapso financeiro e pandemia
Stefano Leszczynski – Cidade do Vaticano
O governo libanês decidiu prolongar as medidas de lockdown até 24 de maio. O primeiro-ministro Hassan Diab advertiu os cidadãos sobre o risco de uma segunda onda de contágios, que pode ser maior do que a primeira, por causa da falta de observação das medidas de segurança. Até agora o Líbano teve 845 casos e 25 mortes por causa do vírus. Os maiores controles estão relacionados com a difícil situação social causada por uma crise financeira sem precedentes no país.
Crise sem precedentes
O buraco negro da economia libanesa chega a 90 bilhões de dólares, ao passo que, o acordo com o FMI ainda em negociação, prevê uma ajuda de cerca de 10 bilhões de dólares. Mas trata-se de um acordo que para entrar em vigor, necessita de uma série de medidas legislativas cuja adoção em um país fracionado como o Líbano não é por nada simples. Enquanto isso a lira libanesa continua a perder valor, aumenta o desemprego e as pessoas não têm acesso às suas contas bancárias.
O apelo da Igreja libanesa
O patriarca maronita, Bechara Rai, anunciou uma intervenção para contrastar a pobreza em todo o país com a contribuição de mais de 43 milhões de euros. Há um grande crescimento do número de pessoas que vivem às margens da pobreza. Exprimindo a aprovação da Igreja maronita ao plano de recuperação do governo, o patriarca encorajou as autoridades a não deixarem de apoiar financeiramente hospitais, escolas e orfanatos e ao salário dos funcionários públicos.
Entrevistamos Alessanda Fabbretti, jornalista arabista para nos falar sobre a realidade local.
As feridas da guerra civil cicatrizaram, mas a recordação do conflito passado ainda está viva em todos os libaneses. O país ainda tem dificuldade de encontrar uma unidade mesmo diante de situações críticas. Quanto pesa o contexto regional sobre a situação libanesa?
Fabbretti: O conflito sírio explodiu em 2011 e causou uma enorme onda de refugiados em fuga da guerra. Mais de um milhão de pessoas se refugiaram no Líbano, causando um enorme impacto econômico e social, principalmente se pensarmos que a população conta com cerca de 4 milhões de pessoas. Os refugiados das comunidades com mais recursos deixaram logo o país para outras metas, mas a maioria ficou nos campos provisórios principalmente no nordeste do país.
Esta emergência humanitária assume um significado particular à luz desta ameaça pandêmica?
Fabbretti: O isolamento e o colapso financeiro do país empobreceram muito a população, que não consegue manter um número tão alto de refugiados, e ainda mais a ameaça da Covid-19 é particularmente grave onde existem situações de fragilidade e promiscuidade como nos campos. A situação piora e há a preocupação da Agência de Refugiados da ONU (ACNUR) porque por um lado aumentaram as expulsões na Síria e por outro as autoridades libanesas tomam atitudes para que os refugiados abandonem voluntariamente o país, por exemplo, proibindo a construção de refúgios que não sejam tendas.
A presença de refugiados pesa no equilíbrio entre os grupos religiosos do Líbano?
Fabbretti: Esta é mais uma das heranças deixadas pela guerra civil: a estrutura político institucional do país reflete a percentual das comunidades religiosas, as mais importantes são três: sunitas, xiitas e maronitas. A presença de uma grande quantidade de refugiados que poderiam se tornar permanentes certamente iria causar desequilíbrios entre as comunidades muçulmanas e entre muçulmanos e cristãos.
A crise financeira e as medidas do governo libanês bloquearam o fluxo de entrada de refugiados?
Fabbretti: Apesar da recusa de entrada e repatriação mais ou menos voluntária (os acordos entre Beirute e Damasco remontam a 2018), a situação na Síria continua insegura. Muitos refugiados quando voltam à suas casas não encontram mais nada, são acolhidos com desconfiança e muitas vezes reclutados e mandados ao front para morrer. Por isso muitos ainda tentam fugir para o Líbano. A pressão continua e as autoridades libaneses encontram-se em uma situação dramática: cidadãos nas praças pelas crise econômica e pelo conflito da Síria ainda mais com a participação de Hezbollah, partido político e organização paramilitar libanesa. E isso, obviamente abre cenários internacionais e focos de tensão impensáveis para um país tão pequeno e com tal crise econômica.
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