União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro divulga Nota sobre fechamento de igrejas
Vatican News
Em recente julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 811, em 08/04/2021, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a proibição integral da realização de atividades religiosas coletivas presenciais, por parte de Governadores ou Prefeitos, como medida temporária de enfrentamento da pandemia de Covid-19, não fere o núcleo essencial da liberdade religiosa.
A União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro, por sua Diretoria e Grupo de Trabalho “Relações Institucionais Igreja-Estado”, vem nesta Nota manifestar sua preocupação com o impacto de tal decisão sobre as relações de coordenação e cooperação entre a Igreja Católica e a República Federativa do Brasil, tal como pactuadas no Tratado Internacional entre o Brasil e a Santa Sé sobre o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano em 13/11/2008 (Acordo Brasil-Santa Sé – Decreto nº 7.107/2010).
Nesse sistema, que se funda numa coordenação (e não numa subordinação) entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro e seus respectivos ordenamentos jurídicos, conforme recorda Norberto Bobbio – insuspeito no tema ao se declarar publicamente “apartado da Igreja” –, pressupõe-se “o reconhecimento recíproco dos dois poderes como cada um, na própria ordem, independentes e soberanos” (Teoria do ordenamento jurídico. Brasília: UnB, 1995. p. 182). A mesma premissa é preconizada pelo Acordo Brasil-Santa Sé: “[...] as Altas Partes Contratantes são, cada uma na própria ordem, autônomas, independentes e soberanas e cooperam para a construção de uma sociedade mais justa, pacífica e fraterna”.
Dessa forma, a Igreja Católica presente no mundo inteiro ostenta seu próprio ordenamento jurídico autônomo e soberano (o Direito Canônico), emanado da Santa Sé como fonte jurígena histórica e atual internacionalmente reconhecida muito antes da instituição do Estado brasileiro. Não à toa, a Santa Sé mantém relações diplomáticas com mais nações que a própria República Federativa do Brasil.
Portanto, as relações entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro devem pautar-se por respeito mútuo, autonomia, independência e cooperação. A Igreja Católica tem dado farto exemplo, durante a pandemia, de aplicação de normas sanitárias para evitar a 2 / 2 propagação do vírus. E não tem se recusado a, em diálogo virtuoso com as autoridades civis e especialistas do meio científico, chegar a acordos e compromissos acerca das medidas a serem implantadas em seus templos espalhados por todo o Brasil.
Contudo, não é possível reconhecer às autoridades civis poder de subordinar a Igreja Católica, fazendo tábula rasa de seu ordenamento jurídico próprio (o Direito Canônico) e do acordo internacional da República com a Santa Sé, o qual, com fundamento no direito de liberdade religiosa, reconhece à Igreja Católica o direito de desempenhar a sua missão apostólica, garantindo o exercício público de suas atividades (Art. 2º do Acordo).
Não se está aqui a dizer que a autoridade civil, no cuidado para com a vida dos cidadãos, não possa legitimamente propor limitações de cunho sanitário às atividades religiosas. Estas, todavia, não podem ser impostas sobre o culto católico de forma unilateral e sem o devido diálogo com a autoridade eclesiástica católica, nem ter o condão de suprimir total e integralmente a faceta pública do culto sem a concordância e cooperação da autoridade eclesiástica católica, sob pena de violação do direito humano de liberdade religiosa em seu conteúdo essencial e também, no caso católico, do Tratado Internacional conhecido como “Acordo Brasil-Santa Sé”.
Repousa na esfera de atribuição da autoridade eclesiástica católica determinar ou não o fechamento integral dos templos católicos, bem como a forma de administração dos seus sacramentos, uma vez que se trata de notas essenciais do exercício público da fé católica, de acordo com os ensinamentos e normas emanados para os católicos pela Santa Sé, parte contratante com a República do referido Tratado Internacional.
Recorde-se também que, curiosamente, para uma série de atividades de cunho econômico, como os transportes por meios viários e aeroviários, o poder público tem permitido seu funcionamento, inclusive sem qualquer obrigatoriedade do distanciamento mínimo que tem sido rigorosamente observado nos templos católicos do País. Ao revés, o segmento religioso católico tem dado exemplo de observância a tais normas sanitárias.
Por fim, a Igreja Católica no Brasil tem dado vivas demonstrações de desejar cooperar com o poder público nas questões envolvendo os cuidados sanitários, mostrando-se aberta ao diálogo e a acordos com as autoridades civis para que se encontrem soluções que atendam a ambas as partes e, sobretudo, aos cidadãos religiosos católicos, cujas vidas são de primordial importância não só para o Estado, mas também para a Mãe Igreja.
Rio de Janeiro, 21 de abril de 2021. UNIÃO DOS JURISTAS CATÓLICOS DO RIO DE JANEIRO
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