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A vitória da indiferença diante das mortes pela COVID-19

O Brasil tem se mostrado despreparado para enfrentar a pandemia. Apesar do empenho e dedicação de muitos profissionais da saúde, nos deparamos com a postura equivocada que ignora a gravidade dos problemas e se esforça para escondê-la em uma onda de negacionismos.

Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves – Professor e Teólogo

Há um ano e quatro meses, estamos lidando com a pandemia do novo Coronavírus! O isolamento social, agravado com os problemas sociais comprometem nossa vida e a dignidade humana. A pandemia do COVID-19 já fez milhares de vítimas e o número de vidas perdidas não para de crescer. Atônitos, observamos quando aos 19/06/21 chegamos à chocante marca de 500.000 mortos pela pandemia.

O Brasil tem se mostrado despreparado para enfrentar a pandemia. Apesar do empenho e dedicação de muitos profissionais da saúde, nos deparamos com a postura equivocada que ignora a gravidade dos problemas e se esforça para escondê-la em uma onda de negacionismos. Não podemos nos acostumar com as mortes, nem ignorar as vítimas desta pandemia, muito menos negar os fatos. É preciso ter presente a dignidade da vida humana, pois vidas importam, sim!

Diante de escândalos de desvio de verba e superfaturamento na compra das vacinas, o Brasil já supera a marca de 540 mil mortes registradas pela pandemia. Não podemos deixar de lado a gravidade dos acontecimentos e também não se pode menosprezar o número de mortos. Não são somente números, são pessoas, são vidas humanas abreviadas pela COVID-19.

A CNBB em nota, aos 09 de julho de 2021, diante do atual cenário brasileiro asseverou: “A trágica perda de mais de meio milhão de vidas está agravada pelas denúncias de prevaricação e corrupção no enfrentamento da pandemia da COVID-19”.

Contra fatos e muitos relatos, a realidade fala por si. Diante de gravíssimos problemas enfrentados na sociedade, a CNBB manifesta seu posicionamento e corrobora para que sejam investigadas todas as denúncias, e acrescenta: “Apoiamos e conclamamos as instituições da República para que, sob o olhar da sociedade civil, sem se esquivar, efetivem procedimentos em favor da apuração, irrestrita e imparcial, de todas as denúncias, com consequências para quem quer que seja, em vista de imediata correção política e social dos descompassos”.

Infelizmente as vidas se tornaram mercadorias; o ser humano é algo descartável diante do capitalismo que consome tudo e todos. A vida foi reduzida a nada, principalmente em uma visão consumista e antiética de um capitalismo que só visa o lucro e descuida dos direitos humanos. Parece que nos acostumamos com a pandemia e com os milhares de mortos. Esse é um dos piores dos erros que, atrelados ao descaso das autoridades federais com a saúde, têm ceifado vidas e famílias inteiras.

Desta forma, diante de inúmeras perdas e grandes problemas sociais, como o aumento da pobreza, é necessário buscar o encontro com o outro, escutá-lo e consolá-lo, mas é preciso lutar por direitos e dignidade humana.

Em um período tão complicado, em que a morte bate à nossa porta, é preciso refletir a nossa atitude de cristão e o verdadeiro amor pelo próximo. Além disso, é urgente olhar para os que sofrem e lhes apresentar uma gota de esperança, mesmo quando parece não ter mais solução.

Hoje, ao contabilizarmos os mortos - os pobres e aqueles que sofrem com o descaso das autoridades -, é necessário observar como é dura a realidade, principalmente por saber que vidas poderiam ser salvas se as lideranças políticas tivessem tomado as devidas precauções e agido para conter o avanço do vírus, além de uma campanha de vacinação ágil e eficiente, atendendo a toda a população.

Contudo, atentos à realidade e ao contexto da pandemia, é preciso fugir da indiferença diante das mortes, principalmente com o descaso do poder público frente à crise sanitária que vivemos e às centenas de mortos diariamente.

A jornalista, cientista política e pesquisadora Bertha Maakaroun escreveu em seu artigo A morte da empatia e a vitória da indiferença que “O Brasil fracassou no enfrentamento à pandemia da Covid-19” e nos coloca a seguinte pergunta ao nos depararmos com os alarmantes números de mortos diariamente: “Será a morte da empatia?”

Maakaroun utiliza-se de uma fala do cientista político Luiz Eduardo Soares, que afirma: “A sociedade de uma forma geral não se comove, não se revolta, não se transporta para o lugar dessas famílias enlutadas”. Essa afirmação é muito dura e muito complexa, pois nos faz refletir sobre o caminho que estamos seguindo e a falta de amor e misericórdia para com aqueles que sofrem.

Para tanto, é necessário fazer ecoar a palavra de Deus em todos os lugares e que ela seja para nós a força necessária para seguir em frente. Assim, a vida deve valer mais que meros procedimentos econômicos de manutenção do poder, pois cada membro da sociedade é importante. Cada vida perdida é história e sonhos que se vão.

A CNBB, ainda na nota do dia 09, manifestou a sua indignação diante do descaso no atual momento: “para defender vidas ameaçadas, direitos desrespeitados e para apoiar a restauração da justiça, fazendo valer a verdade. A sociedade democrática brasileira está atravessando um dos períodos mais desafiadores da sua história. A gravidade deste momento exige de todos coragem, sensatez e pronta correção de rumos.” Destarte, é urgente sensibilizar a todos para as perdas e a realidade em que vivemos. As mortes não podem ser em vão, são histórias e a vida é muito além do que parece.

Para que haja uma verdadeira mudança, de forma concreta, só será possível se se buscar, conscientemente, compreender a realidade em que vivemos, sendo críticos ao que estamos passando e, atrelados a uma mudança de comportamento, responsáveis por ajudar a construir a mudança que esperamos. Assim, é necessário ousar mudar para edificar reais transformações e promover a esperança. Por isso, é preciso buscar uma realidade nova e outro jeito novo de viver: mais humano, ético e solidário.

Na condição de indivíduo - pessoa que se relaciona e que está atenta ao clamor dos mais necessitados -, seria o momento de refletir as palavras de um profeta de nosso tempo que nos deixou recentemente - Dom Pedro Casaldáliga, Bispo Emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia - que afirmava: “No final do meu caminho me dirão: - E tu, viveste? Amaste? E eu, sem dizer nada, abrirei o coração cheio de nomes”. Vivemos um período de grandes mudanças, principalmente com as mortes que batem à nossa porta, entretanto é necessário se apegar à esperança de um mundo melhor. Que possamos ser anunciadores da Justiça e da Paz e não propagadores de discursos vazios ou como sepulcros caiados, como Jesus criticava os fariseus.

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26 agosto 2021, 12:50