Padre Lício: Setembro Amarelo e o Cuidado da Vida
Padre Lício de Araújo Vale – Sacerdote da Diocese de São Miguel Paulista (SP)
Tudo começou em 1994 nos Estados Unidos, quando nasceu o grupo Yellow Ribbon (“Fita Amarela”, em português), inspirado na história de um carro Ford Mustang amarelo e um jovem de 17 anos de idade: Mike Emme.
A origem do setembro Amarelo: Mike adorava Mustangs, em especial um modelo de 1968 que encontrou em um campo abandonado. Depois de comprá-lo, trabalhou duro para reconstruir o carro, como já havia feito com outros, e pintou de amarelo. Além da dedicação aos carros, ele sempre ajudava seus amigos com suas habilidades mecânicas. Por isso ficou conhecido como “Mustang Mike”.
Entretanto, apesar de Mike Emme ser engraçado, amoroso e estar sempre disposto a ajudar quem precisasse, estava sofrendo por dentro. Ele não sabia o que dizer e nem como procurar ajuda. Até que decidiu tirar a própria vida.
Com a dor da perda, os amigos escreveram mensagens sobre a importância de pedir ajuda, marcando com fitas amarelas em homenagem a Mike e seu amado Mustang. Todas as mensagens foram coladas em uma cesta e distribuídas no velório do amigo. Após isso, os jovens começaram a receber contatos de pessoas que decidiram procurar ajuda, inspiradas pelos cartões. Assim nasceu o Yellow Ribbon, um grupo de adolescentes e jovens que começaram a ajudar a salvar vidas!
Os jovens e adolescente são a faixa etária onde os números de suicídio mais crescem no Brasil. Como a família pode ajudar?
A grande missão da família é amar e cuidar, aliás essa é a grande tarefa de todo o ser humano – cuidar da vida-, embora muitas pessoas e famílias não queiram aceitar ou enfrentar essa incumbência. A família, no entanto, não pode se esquivar dela. Temos o compromisso de cuidar da vida, da nossa, dos nossos filhos, dos outros sem ter medo de estar ao lado, apoiando as pessoas que sofrem e as que perderam um ente querido, favorecendo o atendimento às suas necessidades.
Assim como a morte, “a vida continuará sendo um mistério”, que só desvendaremos após a ressurreição. Devemos vivê-la plenamente, mas não conseguiremos captá-la completamente de forma racional. A família deveria aprender que cuidar da vida envolve entregar-se ao “estar no mundo” de maneira autêntica, espontânea e criativa, superando os naturais sentimentos de medo, angústia, incertezas e dúvidas, tão presentes na adolescência e juventude.
Educar também implica “ensinar o trato com a dor”, que faz parte da vida, que nos acompanhará sempre, pois a vida é cheia de decepções, frustrações, doenças, perdas, enfim...
Penso ser urgente e necessário a reformulação da abordagem das dores físicas, mas sobretudo as “dores da alma” no âmbito familiar, para que como um todo não se compare, não se banalize, não se desqualifique ou romantize a dor dos filhos adolescentes e jovens. Noutras palavras tratar as dores existenciais como algo natural, é claro, que isso não elimina o medo, a dor da perda do outro, ou de si mesmo, mas provoca a reorganização de nossos princípios e valores, forjando caráter e resiliência, o que nos obriga a ser transparentes, tirando-nos de paraísos ilusórios que, na maioria das vezes, faz que vivamos na fantasia da superpotência, impedindo a elaboração de uma rede de sentidos existenciais.
É evidente que esse aprendizado provoca dores e sofrimento, até porque somos exigidos a despedaçar nossa ilusão de super-homens e mulheres fortes, invencíveis e suportar a inflexível verdade da nossa fragilidade e mortalidade.
A dor é uma ferida que precisa de atenção para ser curada. Atravessá-la e superá-la significa encarar nossos sentimentos honesta e abertamente, expressando-os e liberando-os por completo, tolerando-os, e aceitando-os por quanto tempo for preciso, até que a ferida se cure. Temos medo de que a dor nos derrube se tomarmos conhecimento dela. A verdade é que a dor, quando nos permitimos experienciá-la , se dissolve , passa. A dor não expressa é dor que dura indefinidamente.
A Campanha do setembro Amarelo nos lembra essa grande verdade: FALAR É A MELHOR SOLUÇÃO! A Família é o lugar primordial da acolhida, do cuidado e incentivo a buscar ajuda no tratamento da dor. O pai da suicidologia, o psicólogo americano Edwin Schneidman, afirma: “No psychache, no suicide” (Sem dor mental, não há suicídio), em tradução livre.
Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui