Padre Lício lança na Bienal do livro texto como lidar com o luto
Ricardo Gomes – Diocese de Campos
O luto, a insegurança e o medo adentraram as escolas, creches, universidades, salas de aulas e toda a comunidade escolar desde o início da “pandemia da Covid-19”, assim caracterizada pela Organização Mundial de Saúde, em março de 2020. A crise sanitária – destaca padre Lício - deixou marcas não somente as perdas de amigos e entes queridos, como também de outros processos não ligados à morte, como a inexistência ou perda de qualquer coisa que deixe de fazer parte das nossas vidas, de maneira repentina ou não.
O convívio com o luto e o isolamento social impactaram diretamente ao comportamento e a saúde mental de todos, sobretudo de crianças e adolescentes. Afinal, - afirma ainda o sacerdote - perder uma pessoa amada é algo realmente doloroso. Diante disso, o assunto que era considerado tabu ganhou importância e precisou ser abordado com cuidado pelos professores. Uma das difíceis questões: como falar da morte com crianças e adolescentes?
O autor do livro “Como é que está aí?”, destaca que esse contexto de luto coletivo precisa ser compreendido, é um processo que precisa ser cuidado. Além das mortes ocasionadas pela Covid-19, tivemos que ficar em casa isolados de tudo e todos. Deixamos de sair na rua, deixar o filho ir a uma festa, ir ao shopping, ir à escola, ir à igreja, diminuímos o nosso círculo familiar e de amigos, acarretando sentimento de angústia e medo.
Logo, - continua o sacerdote - dizer para uma criança e/ou adolescente, por exemplo que: “Virou uma estrelinha”, não protege a criança como imaginamos e desejamos, mas ao contrário, isso a deixa confusa. A melhor maneira de fazer isso é responder as perguntas e dúvidas com sinceridade. Não tenha medo de usar a palavra morte para explicar que o animalzinho de estimação ou alguém querido morreu. Neste difícil momento, ser verdadeiro, direto e honesto é a melhor solução, afirma padre Lício.
AS PERGUNTAS MAIS COMUNS QUE AS CRIANÇAS FAZEM SÃO:
1- Ele(a) não vai voltar mais?
Nos jogos e games, as vidas acabam e se regeneram muito rapidamente. Por isso, é importante explicar que a morte na realidade é irreversível, que a pessoa não voltará mais, mas que a pessoa permanece viva na nossa memória. Quando a criança pergunta onde está a pessoa, podemos dizer que ela foi para onde vão as pessoas que morrem, que foram para junto de “papai do céu”. E que nos encontraremos depois da morte.
2- Eu também vou morrer?
É fundamental e importante explicar para a criança que todo mundo que está vivo um dia vai morrer. Mas não é agora, para isso é preciso sofrer um acidente, ficar doente ou bem velhinho. “É uma sensação angustiante na vida pessoa descobrir a própria mortalidade. Mas é parte do amadurecimento”, afirma a psicóloga Maria Helena Pereira Franco.
3- Por que ele(a) morreu?
Os pequenos costumam ter o que chamamos de “pensamento mágicos” e podem achar de que a morte é culpa dela. Por isso, é importantíssimo explicar a causa da morte, que pode ser uma doença, uma violência, um acidente. A morte não vem do nada. Se a pessoa que morreu já estava doente, o melhor a fazer é ir preparando a criança para o que pode acontecer e ela não ser pega de surpresa.
4- Posso ir ao enterro?
Muitas pessoas com desejo de proteger a criança do sofrimento não permitem que ela participe dos rituais de despedida. Incluir a criança nesses rituais é determinante na compreensão que ela terá da morte. Ela é também parte da família, e como tal, deve participar tanto do velório quanto no enterro.
À sua maneira ela tem o direito de se despedir da pessoa que partiu. Diz a psicóloga, Maria Julia Kovács: “Incentive rituais, como plantar uma árvore, fazer um desenho, fazer uma oração, tudo para lembrar a pessoa. A ideia é não esquecer, é ter na memória.”
RESUMINDO:
1. Fale a verdade, conte o que aconteceu e permita que a criança faça perguntas.
2. Deixe que ela participe do enterro e do luto da família.
3. Ajude a criança a manter quem morreu em suas lembranças.
4. Não julgue, não engane, abra espaço para a criança se expressar e, sobretudo, acolha seus sentimentos.
As crianças fazem parte da família. A criança que passa pelo processo do luto cercada de amor, apoio e suporte familiar, tende a viver melhor o luto e se tornar um adulto mais mentalmente saudável.
Como diz o Dr. Alan D. Wolfelt, P.H.D., “o luto é um processo, não um evento. As crianças, assim como os adultos, vão passar ou estar nesse processo por um tempo longo”.
A pessoa enlutada precisa da compaixão e da presença afetiva dos próximos, não somente nos dias ou semanas após a morte de alguém querido, mas também nos meses e anos a seguir. Conforme vão vivendo e elaborando os enlutados vão naturalmente processando o luto em novos e mais profundos níveis”.
Toda pessoa adulta deveria dispor do direito de, pelo menos mentalmente, voltar a “inocência de uma criança” para conseguir responder com leveza os questionamentos de algo que evoca tanto sofrimento e são essenciais para que a criança e o adolescente possam compreender que a vida é um aprendizado que sempre vale a pena.
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