Líbano, Ir. Marie: o desaparecimento do país "um crime contra a humanidade"
Jean-Charles Putzolu - Cidade do Vaticano
A profunda crise pela qual o Líbano vem passando desde 2019, e que se agravou desde a explosão no porto de Beirute em 4 de agosto de 2020, está colocando dezenas de milhares de famílias libanesas sob forte pressão. Do ponto de vista econômico, o país está sob o domínio da hiperinflação, que, de acordo com dados oficiais, atingiu 190% em fevereiro passado, com picos de 260% apenas para alimentos. A libra libanesa perdeu 98% de seu valor em relação ao dólar americano e, atualmente, oito em cada dez libaneses vivem abaixo da linha da pobreza. O Fundo Monetário Internacional teme até mesmo uma crise sem fim, enquanto, de acordo com a Transparência Internacional, o Líbano está entre os países mais corruptos do mundo, ocupando a 150ª posição em uma lista de 180 países. Politicamente, o país está sem presidente há seis meses, devido à falta de um acordo após o término do mandato de Michel Aoun em outubro de 2022.
Um país em queda livre
Para a Irmã Marie Antoinette Saadé, superiora da Congregação das Irmãs Maronitas da Sagrada Família do Líbano e presidente da Assembleia Geral das Superioras Maiores, "o Líbano está em queda livre e o país inteiro está entrando em colapso". Sua congregação já teve que fechar quatro das 22 escolas devido à falta de fundos e está se preparando para fechar a quinta. "A crise é multidimensional", disse ela à Rádio Vaticano - Vatican News, acrescentando que nem mesmo durante a guerra entre 1975 e 1990 o país havia decaído tanto. A crise é perceptível à primeira vista. Os prédios em Beirute estão ficando velhos e deteriorados. A população está sofrendo. "Todos os dias, as famílias precisam de remédios, precisam ir ao hospital quando não podem pagar", explica ela. Famílias que não podem nem mesmo comprar comida. "Você pode imaginar as famílias que costumavam viver com dignidade?", questiona Ir. Saadè. "Agora temos que lhes dar caixas de comida. Isso nunca foi visto na história do Líbano, exceto em 1916-17, quando pessoas morreram de fome."
Um sistema educacional em colapso
As necessidades básicas se tornaram inacessíveis e fora do alcance da maioria dos libaneses, que também estão preocupados com a escolaridade de seus filhos. "As instituições estão lutando para continuar a oferecer educação em escolas cristãs que acolhem a todos, sem discriminação", enfatiza Ir. Saadé, descrevendo as dificuldades econômicas quase intransponíveis para os pais que querem mandar seus filhos para a escola. Algumas escolas foram impedidas pelo governo de aceitar alunos de famílias carentes gratuitamente, para não esvaziar as escolas públicas, cujos professores estão constantemente em greve. Essa situação deixa pouca esperança para os jovens que buscam um futuro fora do Líbano. "Estamos testemunhando uma 'fuga de mentes'", diz a religiosa, "as forças vivas estão deixando o Líbano e isso é muito perigoso para um país que um dia terá de se reerguer".
O impasse político
Sem um presidente da República desde o final do mandato de Michel Aoun, nem mesmo o executivo conseguiu fazer a máquina funcionar novamente. Mas a eleição do presidente da República não é o único impasse. O impasse, acrescenta a religiosa, "é o nível dessa casta política que é corrupta, que dirige o país à sua maneira e que não tem mais credibilidade". Ir. Saadè questiona a capacidade do futuro chefe de Estado de fazer as reformas exigidas pela comunidade internacional: "Será que ele terá a legitimidade de todos os partidos que dirigem o país e puxam suas cordas?" O Líbano está classificado internacionalmente entre os países mais corruptos. A corrupção endêmica é um obstáculo à ajuda internacional, devido à falta de "confiança" na classe política atual. Por outro lado, a irmã Marie Antoinette elogia as organizações não governamentais, incluindo a Roaco, a Opera d'Oriente e a Ajuda à Igreja que Sofre, que fornecem apoio financeiro às comunidades cristãs católicas. Graças a essa ajuda, "ainda podemos nos manter sozinhos, mesmo que essa administração tenha seus limites. Porque a administração de escolas, hospitais e centros sociais exige dinheiro do Estado, e não é pouco", destaca a religiosa, ressaltando também que muitas estruturas sociais, educacionais e de saúde repousam "sobre os ombros de congregações religiosas femininas ou masculinas ou de algumas dioceses".
Uma mensagem para o Líbano
"O Líbano é mais do que um país: é uma mensagem de liberdade e um exemplo de pluralismo para o Oriente e o Ocidente", escreveu São João Paulo II em sua carta apostólica a todos os bispos da Igreja Católica sobre a situação no Líbano em 7 de setembro de 1989. A irmã Saadé, ao ler essa frase, observa: 'Deveria ser, mas não consegue. O Líbano não deve morrer.... Você consegue imaginar um Líbano desaparecendo do mapa? Isso seria um crime contra a humanidade!". O Líbano, diz ele, 'é um baluarte contra o fundamentalismo xiita ou sunita'.
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