Guardiães da Floresta Tropical: filme italiano traz testemunho de líderes indígenas brasileiras
Andressa Collet - Vatican News
"O Santo Padre é muito próximo às mulheres indígenas e muito próximo a quem, nos cantos do planeta, procura defender o meio ambiente", afirma Lia Beltrami, que encontrou o Papa Francisco na última quarta-feira (08/05), ao final da Audiência Geral na Praça São Pedro. Com Marianna Beltrami da Aurora Vision, a dupla dirige o filme "Guardiães da Floresta Tropical" que procura ilustrar a vida de mulheres indígenas em diferentes partes do mundo: na República Democrática do Congo, na África; na grande ilha do Bornéu, na Ásia; e também na Amazônia Brasileira.
A delegação falou sobre o documentário ao Papa Francisco e a obra foi apresentada no mesmo dia na sala de projeções da Filmoteca Vaticana, dentro da Cidade do Vaticano. São 52 minutos de filme em tecnologia 4k, nas línguas originais do português, francês, pigmeu e indonésio, com legendas em inglês. Entre as protagonistas está a brasileira Maria Auxiliadora Fernandes da Silva, do povo indígena Daw, que compartilha a sua história, o que a floresta significa, além de medos e esperanças.
A participação brasileira no filme
A líder indígena mora em São Gabriel da Cachoeira, no estado do Amazonas, a cidade mais indígena do Brasil (IBGE) e o terceiro município brasileiro com maior extensão territorial. Quem ajudou a equipe italiana a captar o material "bem no meio da Amazônia" foi o brasileiro Rodrigo Baima. O jovem produtor conta ao Vatican News que "a missão foi delicada, difícil e desafiadora" pelo próprio contexto de uma floresta tropical com seus animais no habitat natural, entrando em contato com macacos, serpentes e aranhas caranguejeiras. O meio de transporte era canoa ou barco de um local para o outro. "Uma das experiências mais profundas que eu tive", revelou Rodrigo, inclusive ao realizar as entrevistas. Primeiro com Maria Auxiliadora:
"Ela foi a primeira mulher indígena daquela comunidade, no baixo do Rio Negro, a se formar. E hoje, professora e uma referência para as comunidades, com o seu legado e com aquilo que ela faz. Maria Auxiliadora se tornou uma mulher indígena e professora. Olha que valentia! E ela traz muito forte nas suas palavras e eu recordo que ela diz: isso aqui é a luta, é uma festa matriarcal, quando nós, mulheres indígenas, conseguimos chegar onde queremos, é uma festa matriarcal em defesa do território. É corpo, mas ao mesmo tempo, é espírito, porque ela sempre diz nas suas falas, que ela assim como tantas outras, elas são a própria floresta. E que estão de peitos abertos e de punhos fechados contra qualquer tipo de violação. E ela diz que ela é floresta, ela é esse direito originário, porque elas, de fato, são herdeiras desse chão. É um movimento da mata que dança, mas é uma dança da selva, é uma dança que canta e que encanta e que renova a esperança. Essa esperança é justamente por aquilo que ela tanto fala, por uma ecologia integral, de liberdade, de justiça, de luta de ideias que plantam a paz."
A denúncia através da voz das guardiães
O filme é um instrumento para dar voz aos povos indígenas das florestas tropicais, essenciais para enfrentar as mudanças climáticas. Eles são os guardiões históricos nessa luta e os primeiros a sofrer com as consequências das crises. E, por ser vulneráveis, tornam-se também suscetíveis a ameaças de intimidação, violência e tráfico de órgãos, como confirma Rodrigo, ao nos contar sobre a entrevista com a liderança comunitária da povo Daw:
"Um lado muito triste e que ocorre muito ali na em São Gabriel da Cachoeira é o tráfico de órgãos. Quando nós chegamos, três crianças estavam desaparecidas por conta desse comportamento desumano, desenfreado. Então foi muito triste chegar naquele dia e ouvir de Maria Auxiliadora uma dessas dificuldades que é justamente a questão do tráfico de órgãos e que três crianças tinham exatamente naquele dia desaparecido. Esse é o enfrentamento também das comunidades. E aqueles não foram os três primeiros casos, outros já vinham acontecendo, mas que infelizmente não é noticiado. Pelo fato de ser comunidade tão isolada, tão distante dos grandes centros, muitas coisas acontecem, mas não são noticiadas. E aí acaba não tendo um enfrentamento por parte de outros setores que é extremamente importante, caso tivesse uma ação concreta naquelas comunidades."
Outra brasileira entrevistada, como nos conta Rodrigo, foi uma ativista dos direitos humanos, a guardiã Florinda Lima Orjuela, da tribo dos Tuyucas. Ela trabalha com a agricultura e os povos originários que moram próximos ao Rio Negro, e às vezes, inclusive foi intérprete por falar a língua materna dos locais. O documentário, que agora participa de festivais e no próximo semestre estará disponível nos principais canais de vídeo on-line, foi produzido pela Aurora Vision com a colaboração das Irmãs da Caridade de Santa Joana, das Irmãs da Providência de São Gaetano, dos Combonianos do Congo e da WUCWO (World Union of Catholic Women's Organisations Indonesia).
A exposição fotográfica "Changes"
Uma foto de Maria Auxiliadora também faz parte da Exposição "Changes", organizada por Lia e Marianna Beltrami. São 24 imagens que ilustram desde a beleza à destruição do meio ambiente, em contrastes reais dos efeitos das mudanças climáticas. A mostra, na colunata da Praça São Pedro, fica exposta até 27 de maio e foi realizada com o Dicastério para a Comunicação, em colaboração com o Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral e o Centro Laudato Si' para a Educação Superior.
As fotos, montadas em suportes feitos de madeira recuperada após a tempestade Vaia, na Província Autônoma de Trento, vêm da Amazônia Brasileira, Bornéu, Bangladesh, Togo, Etiópia, Flórida, Grécia, Itália, Islândia, Austrália e Turquia. Os fotógrafos da exposição são: Neşe Arı, Raffaele Merler, Giampaolo Calzà, Franco Giovanazzi, Vassilis Ikoutas, Asaf Ud Daula, Sebastiano Rossitto, Ferran Paredes Rubio e Francesca Larrain.
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