A Ética do Cuidado
Prof. Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves - Teólogo, Filósofo, Historiador
O cuidado com a vida surge da consciência de sua fragilidade, constituindo-se em um imperativo ético essencial para a preservação e promoção da existência humana. Sem o cuidado, a vida não se desdobra plenamente em seu potencial, tampouco alcança sua missão. O cuidado, portanto, não pode ser visto apenas como uma prática isolada, mas como parte de uma ética integral que se preocupa com a preservação da dignidade e da humanidade em sua totalidade.
Nesta realidade encontra-se a necessidade de se debater racionalmente sobre as formas mais eficazes de proteger e amparar a vida. A ética, como campo da filosofia, oferece as bases para essa discussão, que se desenvolve por meio de princípios racionais, mas que também perpassa a dimensão afetiva e espiritual. Assim, o cuidado pode ser compreendido não apenas como um ato, mas como uma virtude que deve orientar as ações humanas em direção ao bem comum.
A ética cristã, especialmente, desempenha um papel crucial na formação dos sistemas de vida no Ocidente, alicerçando-se em fontes como a Bíblia, a Tradição, e o magistério da Igreja. Ela é parte de uma construção histórica e comunitária, que tem como centro a pessoa de Jesus Cristo e seu evangelho. Este evangelho, ao mesmo tempo que oferece uma visão escatológica da vida, também oferece diretrizes práticas de conduta que se desdobram em formas concretas de comportamento moral e espiritual.
Nesse sentido, a ética cristã coloca a vida no centro de sua preocupação, inspirada no mandamento do amor, que exige que se cuide do próximo como de si mesmo (Mt 22,39). O amor ao próximo, expressão máxima do cuidado, não é apenas um sentimento, mas uma ação concreta que visa a salvaguarda da vida em todas as suas expressões. A partir dessa inspiração, a ética cristã propõe uma conduta de solidariedade, de justiça e de cuidado integral, em que a vida é defendida em todas as suas fases, desde a concepção até a morte natural.
A construção de uma conduta autêntica, que leve à humanização do ser, requer um compromisso ético com o cuidado, mas também com a transformação das estruturas sociais que geram injustiça, desigualdade e exclusão. A ética cristã não é uma ética de mera conformidade com regras morais abstratas, mas um compromisso dinâmico com a promoção da dignidade humana, refletida na ação em prol dos mais vulneráveis e marginalizados.
Diante dos desafios, somos chamados a participar do processo de reinvenção do cotidiano. Para tanto, é necessário ter cuidado com a vida, respeitar o próximo e, principalmente, as gerações.
Para tanto, só será possível uma real mudança se mudarmos a nossa conduta ética e moral, pois uma conduta moral duvidosa, sem apreço à vida, nos leva a deixar de vivenciar os melhores momentos e, acima de tudo, desrespeitar aqueles que sofrem com algum problema e não darmos a devidas importância ao sofrimento das pessoas. Por isso, ter esperança, ou esperançar, é ter iniciativa, é ir ao encontro, é buscar ouvir os que mais precisam.
É preciso, urgentemente, se fazer ouvir e articular o maior crescimento da consciência humana sobre o que é ser humano. A forma como se trata o tema ainda é um tabu. Durante séculos de nossa história, por razões religiosas, morais e culturais, falar do tema do suicídio era algo proibido e, principalmente, um pecado, por esta razão, ainda temos medo e/ou certa vergonha de comentar sobre o assunto.
De fato, ao falar desta realidade, estamos inseridos na sociedade que vive o problema de forma global e não se deixa abrir ao debate consciente. O tabu sobre a questão do suicídio perdeu a força diante dos inúmeros casos de problemas oriundos da pandemia. Hoje, frente à realidade, é urgente refletir sobre o bem-estar do próximo e não apenas o nosso. É a partir desta concepção que devemos observar a realidade sem receios e entender como tratar o outro, principalmente na escuta enquanto membro da sociedade e no período pandêmico que vivemos e estamos, ainda vivendo.
É preciso cultivar o caminho ético, sem preconceitos e comentários maldosos. Que a nossa conduta moral seja pautada por regras que devem ser respeitadas por cada um. Para tanto, é preciso se comprometer com a cultura do encontro e do diálogo para que possamos nos comprometer com a vida de cada um e ser mais solidários com a dor e a realidade do outro.
Assim, dotados dessa responsabilidade é urgente pensar que os projetos de formação da educação para o humanismo solidário têm por foco principal a ação consciente de cada um na construção de uma Educação para o humanismo solidário e que haja uma verdadeira inclusão de todos nesta realidade. O tema do mês de setembro é uma forma de falar com respeito diante da realidade do suicídio.
Nesse contexto, precisamos observar o caminho que seguimos e os exemplos que podemos dar em nossa realidade. Entre eles temos que alimentar o desejo de uma sociedade mais humana e exercitar o amor ao próximo por meio de gestos de solidariedade.
Devemos seguir o exemplo de Jesus: sua ética, seu comportamento, seu caráter, seu modo de ser e de agir. Ele assumiu uma conduta autêntica em uma sociedade contrária a tudo que ele pregava. Ele veio transformar o mundo, a começar pela sociedade de sua época. Assim, tratar o próximo com respeito é fazer valer o amor criador de Deus e sua proposta para o ser humano: “O que fizer ao menor dos meus irmãos, a mim o fazeis”. (Mt 25,40). Por isso, cuidar do outro, escutá-lo e fazer um processo de encontro é a base das nossas relações.
Por fim, o caminho para uma conduta mais autêntica passa pela integração entre o cuidado e a ética. A consciência da fragilidade da vida leva à necessidade de uma responsabilidade maior com o outro e com o meio em que vivemos. Assim, propõe-se uma ética do cuidado que não apenas responde às urgências imediatas, mas que se alicerça em valores perenes de respeito, empatia e justiça, construindo, assim, uma sociedade mais humana e compassiva.
Essa ética do cuidado, inspirada no cristianismo, se expande para abarcar todas as dimensões da existência humana, desde as relações interpessoais até as preocupações globais com a ecologia e a justiça social. É um chamado à conversão ética, na qual o ser humano é convidado a assumir um papel ativo na construção de um mundo mais justo e solidário, onde o cuidado pela vida, em todas as suas formas, seja o princípio norteador das ações individuais e coletivas.
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