A voz do Papa é única no mundo para quebrar as solidões criadas pela pandemia
Amedeo Lomonaco, Andressa Collet – Cidade do Vaticano
As palavras do Papa Francisco pronunciadas na última sexta-feira (27) foram repercutidas em todas as partes do mundo e, sobretudo, ficaram impressas nos corações de milhões de pessoas. A imagem da tempestade a ser enfrentada, com todos remando juntos, indicada pelo Pontífice na homilia acompanhada pela chuva, exorta à humanidade a abrir, autenticamente, as estradas da corresponsabilidade e da solidariedade.
O Papa se dirigiu não só a católicos e crentes, mas a todo homem. E, sobretudo, implorou ao Pai para que não nos deixe à mercê da tempestade. A sua voz quebrou o silêncio ensurdecedor das cidades desertas. Nas suas palavras, sublinha Agostino Giovagnoli em entrevista ao Vatican News, toda a humanidade pode se reconhecer. O filósofo se ocupa de relações internacionais e é professor de História Contemporânea na Universidade Católica do Sagrado Coração, com sede em Milão.
Professor – “Eu acredito que, para o mundo, a oração de Papa Francisco tenha representado, antes de tudo, a escuta de palavras que descrevem uma situação, neste momento, realmente universal, em que encontra toda a humanidade. Então, a voz do Papa quebra, num certo sentido, o silêncio das nossas cidades, da Praça São Pedro na sexta-feira, para expressar uma coisa que é compartilhada realmente por tantos. Isso é muito raro, talvez único na situação atual; não há nenhuma outra voz no mundo que consiga expressar isso neste momento. E o Papa Francisco o fez partindo da descrição profunda das trevas, da escuridão espessa, do silêncio ensurdecedor, do vazio desolador. São palavras em que toda a humanidade pode se reconhecer e isso, certamente, é importante porque aproxima uns dos outros, quebra as solidões criadas por essa epidemia terrível.”
Junto à voz do Papa, na Praça São Pedro vazia, milhões de pessoas se uniram espiritualmente, através dos meios de comunicação, aos vários momentos desse dia histórico. É um pouco o contrário daquilo que Francisco denunciou várias vezes quando falou de globalização da indiferença. Talvez este é um mundo mais atento ao grito de dor também da Terra...
Professor – “É um mundo que, após essa terrível experiência, certamente está mudando e, talvez, para melhor. Ao menos parece isso. Papa Francisco encontrou palavras muito simples, mas muito diretas para expressar a novidade dessa situação. Estamos todos no mesmo barco. Usou essa imagem evangélica para expressar um conceito que é evidente a todos. E é um barco em que todos constatamos os nossos limites. Então, a estrada de uma globalização da solidariedade é uma estrada obrigatória. Papa Francisco expressou de modo muito plausível essa exigência.”
A última sexta-feira foi cadenciada também por imagens muito poderosas e eloquentes. Um dos ícones do momento de oração conduzido pelo Papa foi o crucifixo de madeira banhado pela chuva, quase “lágrimas” provenientes do céu...
Professor – “Sim. Esse crucifixo afetou todos, e não a caso. A fé cristã apresenta o sinal de um homem crucificado e, então, não é uma promessa de prosperidade. Além disso, em momentos como esse se compreende a verdade desse sinal. É o sinal de um Deus que assume todos os sofrimentos do homem. E é o Deus da misericórdia. E essas lágrimas da chuva tornaram visível, de qualquer modo, alguma coisa que todos compreenderam.”
O tempo da pandemia está mudando profundamente o mundo. Neste momento, pode também regenerar o patrimônio da fé...
Professor – “Eu acredito que sim, justamente porque nega as várias ideias de salvação ou de segurança que, geralmente, parecem tornar a nossa vida tão sólida. O Papa também disse explicitamente isso na sexta-feira. Esvaziando a vida dos ídolos, torna-se mais evidente àquilo a que a nossa fé se dirige. Eu acredito que haverá uma regeneração na direção da responsabilidade. Papa Francisco citou tantos que, neste momento, se ocupam dos outros.”
A situação dramática que o mundo está vivendo já foi vivida em outros momentos da história, como em ocasiões de períodos difíceis da peste. O que nos ensina, nesse sentido, a história, em especial, a história do cristianismo?
Professor – “Nos ensina que a fé é poderosa, sobretudo, nas obras. Diante da peste, tradicionalmente, os únicos que cuidavam dos outros – colocando em risco a própria vida – eram os cristãos, os religiosos. A mesma palavra “Lazzaretto” foi cunhada para definir o lugar onde as vítimas da peste eram acolhidas. Ninguém queria estar com elas, com exceção dos frades capuchinhos. A história do cristianismo é uma história de solidariedade, de serviço aos outros e, sobretudo, aos mais pobres e aos doentes. E isso não acontece de menos hoje. A ciência não é tudo. É preciso de solidariedade, e os cristãos, neste momento, demonstram ela ao se dirigir àqueles que estão morando na rua, aos idosos nos institutos... E, assim, sobretudo, o cristianismo nos ensina que não só de pão vive o homem. Isto é, inclusive e principalmente nestes momentos dramáticos, as palavras não são inúteis, mas são importantes. Não são supérfluas, tanto é verdade que as palavras do Papa Francisco são muitos escutadas.”
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