Kerry: crise climática, a voz do Papa mais importante do que nunca
Christopher Wells – Vatican News
“O Papa é uma das grandes vozes da razão e uma autoridade moral convincente na questão da crise climática” e sua voz hoje “é mais importante do que nunca” diante das emergências ambientais que afligem o planeta: é o que afirma ao Vatican News John Forbes Kerry, enviado especial do presidente dos Estados Unidos da América para o clima, logo após o encontro com Francisco na manhã de sábado, 15, no Vaticano.
O senhor está aqui para falar com os líderes europeus sobre a crise climática. Por que foi importante incluir uma visita ao Papa nesta viagem à Europa?
O Papa é uma das grandes vozes da razão e uma convincente autoridade moral no tema da crise climática. Ele foi um precursor, antecipando os tempos. A sua Encíclica Laudato si 'é, de fato, um documento muito, muito poderoso, eloquente e muito persuasivo do ponto de vista moral. E penso que a sua será uma voz muito importante que nos acompanhará até a Conferência de Glasgow, da qual creio que ele pretenda participar. Precisamos de todos nesta batalha. Todos os líderes do mundo devem se unir e cada país deve fazer sua parte. E acho que o Santo Padre fala com uma autoridade moral que é única.
O Papa Francisco falou da importância de levar todos à mesa do diálogo, para chegar a um consenso sobre ações concretas. Há interesses muito diferentes em jogo: há países economicamente muito poderosos - como os Estados Unidos - mas também países em desenvolvimento que de uma forma ou outra têm interesse no assunto. Em termos práticos, como se faz para levar em frente o diálogo? E o que os Estados Unidos estão dispostos a fazer em termos de oferta, mas também de pedidos aos outros países.
Você tem razão. Existem diferenças entre os países, entre o que eles podem fazer e o que estão fazendo hoje. E essas diferenças foram acolhidas no Acordo de Paris no conceito de 'responsabilidade comum, mas diferenciada'. Todos temos uma responsabilidade comum, esta é a chave. Nenhum país está isento da necessidade de tomar medidas para enfrentar a crise. Por outro lado, não esperamos que uma economia muito pequena, um país muito pequeno que emite pequenas quantidades de gases de efeito estufa, faça o mesmo que nós. Nós sabemos, somos o segundo país em emissões de gases de efeito estufa no mundo. A China é o primeiro; depois dos Estados Unidos, há a Índia e, em seguida, a Rússia e outros países. Mas a linha a seguir é esta: nenhum país pode resolver esse problema sozinho. Todos devemos dar passos em frente. Portanto, os EUA precisam aplicar sua quota justa de financiamento e fazer o possível para contribuir para a redução das emissões, e estamos fazendo isso! O presidente Biden fixou uma meta de reduzir nossas emissões na próxima década em 50-52%. Mas temos necessidade que outros grandes países emissores façam sua parte, realizando reduções. Não se pode continuar a usar uma central de carvão e realmente fazer parte da solução de que precisamos. Partilhamos todos o mesmo dever. Nenhum país pode levar a cabo este trabalho sozinho. Se amanhã os Estados Unidos tivessem emissões zero, ainda estaríamos em crise. Representamos apenas 11% de todas as emissões do mundo. Portanto, 89% referem-se a outros países. 20 países são responsáveis por cerca de 73-75% das emissões. Portanto, esses 20 países, que são os mais desenvolvidos do mundo, têm uma responsabilidade particular. Mas todos têm a responsabilidade de ser parte da solução. E eu acho que Sua Santidade, o Papa Francisco, fala com uma autoridade única, uma autoridade moral irresistível. Esperamos que isso ajude as pessoas a chegar ao objetivo.
É uma meta realmente alcançável?
Podemos alcançá-la. Essa é a coisa importante. As pessoas devem saber que isso é viável. E, ao fazer isso, podemos criar milhões de empregos. Podemos ter um ar mais limpo. Podemos ter uma saúde melhor. Podemos ter menos casos de câncer. Podemos ter menos problemas relacionados ao ar poluído, em que as pessoas se sentem sufocadas e as crianças vão para o hospital no verão devido à asma provocada pelo ambiente. E podemos estar mais seguros porque podemos depender de energia renovável, energia alternativa, energia sustentável. E na criação dessas energias alternativas, há uma enorme riqueza a ser criada. Devemos fazer isso todos juntos.
De que forma os Estados Unidos - uma superpotência econômica e política - e a Santa Sé - um Estado muito pequeno, mas com autoridade moral e espiritual – podem colaborar na luta por uma economia global positiva e na luta contra as mudanças climáticas?
O Santo Padre é uma das vozes mais poderosas do planeta, senão a mais poderosa. O seu apelo às pessoas para darem um passo à frente, a serem razoáveis e a viverem nossa responsabilidade como seres humanos no cuidado da criação de Deus, foi extraordinariamente eloquente. E todos nós devemos ser responsáveis pelo cuidado da criação: esta é a sua mensagem. Mas porque ele está acima da política e fora dos conflitos nacionais, acho que ele pode sacudir um pouco as pessoas e levá-las para a mesa de diálogo com um melhor senso de nosso dever comum. Sim, o Vaticano é uma pequena entidade, mas o "rebanho" é enorme em uma base global e Sua Santidade o Papa Francisco tem a capacidade de galvanizar a ação dos países. Tem a capacidade de motivar os cidadãos de muitos países a pedirem a seus governos que prestem contas e façam o que for necessário para preservar o planeta. Penso que o mundo tem um respeito especial pelo Papa Francisco e não há dúvida de que ele é um líder significativo. Esperamos que continue a nos guiar ainda mais em direção ao alcance da meta. Hoje chegamos ao dia do acerto de contas em relação àquelas que são as consequências de nossa maneira de crescer. E creio que o Santo Padre fala com particular autoridade ao nosso senso de dever e à necessidade de dar um passo em frente todos juntos, não obstante as divisões do mundo. Sua voz é mais importante do que nunca.
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