Editorial: Invocar a paz
Silvonei José - Cidade do Vaticano
No último dia 23 de fevereiro o mundo inteiro aderiu à convocação do Papa Francisco para um dia de oração e jejum em prol da República Democrática do Congo e do Sudão do Sul. Uma iniciativa dirigida a todos os fiéis católicos mas também aos cristãos de outras religiões. Francisco convocando o dia de oração afirmou “que o nosso Pai celeste escuta sempre os seus filhos que gritam a ele na dor e na angústia, cura os corações em pedaços e enfaixa as suas feriadas”. Vamos entender o motivo da preocupação do Papa.
As feridas infligidas à população dos dois países africanos são as feridas das instabilidades políticas e das tensões inter-étnicas, frequentemente desembocadas em atos de verdadeira guerra civil. No Congo as violências são causadas por contínuos adiamentos das eleições presidenciais. O presidente Joseph Kabila ainda está no poder apesar do seu mandato ter terminado em 2016. E a pedir o retorno às urnas é o Comitê de coordenação dos leigos e neste contexto, a Conferência Episcopal congolesa se fez promotora de um longo processo de diálogo entre todas as forças políticas para pôr fim ao impasse político. O resultado de tal iniciativa é conhecido como “O Acordo de São Silvestre”, assinado no dia 31 de dezembro de 2016 e depois ignorado pelo próprio Kabila.
O não cumprimento dos acordos desencadeou, a partir de novembro de 2017, uma onda de protestos em todas as principais cidades do país, severamente reprimidas pela polícia congolesa. Durante um dia de protesto em 30 de novembro, mais de 200 pessoas foram presas entre Kinshasa e Goma, um manifestante foi morto e dezenas de outros ficaram feridos. O balanço da última manifestação de 21 de janeiro, a “Marcha pacífica dos cristãos”, para pedir o respeito da implementação dos acordos de São Silvestre e a demissão de Kabila é de 5 mortos, cem detenções, 134 paróquias cercadas pela polícia ou pelo exército, celebrações de missas impedidas ou interrompidas pela polícia. À grave situação política se acrescentam os antigos conflitos no Kasai e nas regiões orientais da República Democrática do Congo, onde há uma das crises humanitárias mais complexas do mundo.
A situação não é melhor no Sudão do Sul. O país conseguiu a sua independência somente em 2011 e, em dezembro de 2013, os conflitos políticos, depois que o presidente Salva Kiir, do grupo étnico dinka, acusou seu vice-presidente, Riech Machar, de etnia nuer, de ter organizado um golpe Estado.
A combinação de instabilidade, guerra, seca e uma grave crise econômica, causou uma desesperada falta de alimentos, uma violência generalizada e um êxodo massivo da população, de modo que em fevereiro de 2017 foi declarado o estado mais grave de “penúria” em vários áreas do país. As agências das Nações Unidas estimam que mais de 7 milhões de pessoas (dos mais de 12 milhões de habitantes do país) precisam urgentemente de assistência humanitária. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) também informou que, desde o início do conflito, um sudanês entre três, procurou proteção seja no exterior, seja dentro das fronteiras nacionais, 90% são mulheres e crianças.
A oração solicitada pelo Papa para o último dia 23 não era somente para um evento e ponto final; mas sim uma oração misturada com uma atenção constante para essas duas realidades. Um evento que serviu como um raio de luz para lançar o olhar às necessidades dessas terras.
Francisco, como todos sabem, é muito sensível e está muito próximo de todo o povo de Deus, onde quer que ele esteja. Ele sabe bem o que está acontecendo em várias partes do mundo e também na República Democrática do Congo e no Sudão do Sul: conhece as ondas de guerra, de conflitos armados.
O Papa é continuamente informado de tudo e quer estar perto de todos esses povos; quer chamar a atenção da comunidade nacional e internacional, quer conscientizar. É uma mensagem dirigida a todos, mas em particular a todos os que estão envolvidos de uma forma ou de outra na gestão desses países e de realidades semelhantes em todo o mundo, na busca de maneiras pacíficas de sair da crise.
Diante dessa miséria, o Papa convida-nos perenemente a invocar a misericórdia de Deus através da oração, nos convida a nos convertermos, pede a conversão dos nossos corações.
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