Editorial: Asia Bibi, uma mulher simples e de fé
Silvonei José - Cidade do Vaticano
A mulher cristã Asia Bibi foi absolvida nesta semana do crime de blasfêmia pelo Supremo Tribunal do Paquistão, que anulou a pena de morte a que foi condenado em 2010 por insultar o profeta Maomé e ordenou a sua libertação, uma decisão que provocou protestos de rua de islâmicos radicais. Asia, mãe de cinco filhos, será colocada em liberdade depois de passar nove anos em uma prisão em um caso que causou indignação internacional.
A história de Asia ganhou a atenção mundial e fez com que o crime de blasfêmia, ou presumível blasfêmia – contemplado no Paquistão com a pena morte – voltasse à ribalta e provocasse grandes discussões.
Mas o que ocorreu nesta semana, e como se chegou a essa decisão do Supremo Tribunal?
Pena de morte cancelada
“A pena de morte é cancelada. Asia Bibi é absolvida das acusações", disse o presidente do Supremo Tribunal do Paquistão, Saqib Nisar, ao ler a sentença do recurso em uma sala com a presença de militares desarmados. Os três juízes do tribunal viram "sérias inconsistências" nas provas da acusação e constataram "mentiras" no testemunho de duas mulheres que denunciaram Ásia. A inevitável conclusão foi de que a acusação falhou quando que provar as acusações contra Asia, para além de qualquer dúvida razoável, disseram os juízes.
A decisão foi defendida pelo primeiro-ministro paquistanês, Imran Khan, que fez um discurso para garantir que "a decisão do Supremo Tribunal está de acordo com a Constituição" e pediu o fim dos protestos desencadeados com o veredicto.
Grupos radicais ganharam as ruas de várias cidade do Paquistão pedindo a morte de Asia e incitando à violência. Logo após a decisão do Supremo tiveram início os protestos para “defender a santidade do profeta”, destacando, “morreremos por ele”. Os manifestantes foram às ruas e bloquearam estações de trem e aeroportos. Pedem inclusive a morte dos juízes que absolveram Asia.
Recordamos que o caso de Asia Bibi provocou pelo menos dois assassinatos de personagens públicos que a defendiam: o ex-governador de Punjab, Salman Tasir e do ministro das Minorias, o cristão, Shahbaz Bhatti, ambos em 2011.
Lei anti-blasfêmia
A dura lei anti-blasfêmia paquistanesa foi estabelecida na época colonial britânica para evitar confrontos religiosos, mas na década de 1980 várias reformas desejadas pelo ditador Zia-ul-Haq favoreceram o abuso dessa norma. Desde então, houve cerca de mil acusações de blasfêmia, um crime que no Paquistão pode levar à pena capital, embora nenhum condenado tenha sido executado.
O calvário de Asia foi um calvário que durou 9 anos, 9 anos de sofrimento, lágrimas, orações, longe do marido e dos cinco filhos. Um Calvário no qual foi colocado um ponto final. Com grande alegria no mundo foi recebida a notícia de que o Supremo Tribunal do Paquistão absolveu Asia Bibi. A sentença de morte por enforcamento imposta em 2010 foi assim cancelada.
Sua história começa num dia de verão
Uma mulher simples, uma camponesa de uma pequena aldeia em Punjab. Sua história começa num dia de verão, com 45 graus: de um domingo de trabalho nos campos por 250 rupias e do desejo de beber um pouco de água de um poço. Ela mesma conta no livro "Blasfêmia", escrito em 2011 junto com a jornalista francesa Anne-Isabelle Tollet. Algumas mulheres a acusam de ter contaminado a água, enquanto cristã. Assim, surge uma discussão na qual Asia Bibi é acusada de blasfêmia. A situação precipita. Asia é encarcerada. Chegam os ultrajes e humilhações na cela escura e imunda e a consciência de que nem ela nem sua família terão mais paz. "Salvem-me", pedia ela no livro no qual ela imediatamente manifestava a sua forte fé: "Se hoje, apesar de tudo, eu ainda estou vivo, certamente não é por acaso, mas porque Deus me confiou uma missão". E agora a absolvição chegou.
Encontro com Francisco
Em fevereiro último o Papa Francisco recebera no Vaticano a filha Eisham e o marido de Asia Bibi, Ashiq, que vieram a Roma hóspedes de Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), junto com Rebecca, uma jovem nigeriana cristã, vítima de Boko Haram. Na audiência privada, que AIS definiu 'emocionante', o Papa quis expressamente rezar por Asia Bibi e pelas mulheres, ainda hoje, prisioneiras de Boko Haram. "Penso muitas vezes em sua mãe e rezo por ela”, disse o Papa à jovem Eisham que saudando o Pontífice o abraçou. "Quando antes de partir eu encontrei a minha mãe, ela me pediu para dar-lhe um beijo". "Santo Padre - acrescentou o marido de Asia, Ashiq - peço-lhe para rezar, unidos em Cristo, pela minha esposa e por todos os cristãos perseguidos".
Asia e sua família deverão deixar o seu país para viver em uma terra distante, quem sabe na Itália, e aqui ter a oportunidade de abraçar e receber o abraço de Francisco, que certamente todos os dias rezou pela sua libertação. Mas no mundo há outras Asia Bibi que ainda esperam a liberdade. Devemos rezar e pedir ao bom Deus para que a porta da justiça seja aberta e que nossos irmãos perseguidos encontrem a luz do dia e possam viver finalmente a sua fé.
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