Dia de Oração pela Santificação dos Sacerdotes
Nicola Gori – Cidade do Vaticano
Todos os anos, na Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, celebra-se o Dia de Oração pela Santificação dos Sacerdotes, ligado à figura do padre Mario Venturini, que dedicou sua vida e apostolado à santificação do clero e fundou, em 1926, a Congregação Jesus Sacerdote. Sobre isto falou ao L’Osservatore Romano o cardeal Beniamino Stella, prefeito da Congregação para o Clero:
Eminência, para o Dia Mundial de Oração para a Santificação dos Sacerdotes, a Congregação para o Clero pensou em propor às Dioceses um tempo de reflexão sobre as homilias das Missas Crismais do Papa Francisco, recentemente publicadas. Qual é o significado dessa escolha?
O Dia Mundial da Santificação Sacerdotal representa uma importante ocasião para o aprofundamento, a oração, mas também para a partilha fraterna entre os sacerdotes. Este ano, durante a Santa Missa Crismal celebrada em São Pedro, em 18 de abril passado, o Papa Francisco quis presentear os sacerdotes com um livreto intitulado ‘La nostra fatica è preziosa per Gesù’, que reúne as sete homilias dirigidas aos sacerdotes durante as Missas Crismais celebradas desde o início do Pontificado. Trata-se de mensagens particularmente intensas, que o Santo Padre quis dirigir aos sacerdotes com afeto e ternura, como faz um pai com seus filhos e que se voltam aos trabalhos apostólicos dos sacerdotes, indicando a eles um horizonte espiritual e pastoral para a missão. Relendo-as hoje, pode-se perceber como deste magistério dedicado aos padres, emerge um verdadeiro perfil sacerdotal, que é possível ser encontrado já na homilia da primeira Missa Crismal presidida pelo Papa Francisco, em 28 de março de 2013: o sacerdote celebra carregando nos ombros o povo a ele confiado e levando seus nomes gravados em seu coração.
É uma bela imagem que retrata o padre como pastor do povo de Deus: o que é exigido dos sacerdotes hoje para viver de acordo com esse perfil?
O Papa Francisco insistiu muitas vezes no específico do chamado sacerdotal, que confere ao sacerdote o compromisso de ser um pastor à imagem de Cristo; em particular, nas homilias das Missas Crismais, acentuou que o pastor é ungido pelo Espírito para ungir, por sua vez, a vida daqueles que lhe foram confiados, com a alegria do Evangelho e a consolação do amor de Deus. Em sua recente homilia da Missa de Crisma deste ano, comentando o Evangelho de Lucas, o Papa Francisco destacou os quatro grupos para os quais era destinada, de modo preferencial, unção do Senhor, isto é, os pobres, os prisioneiros, os cegos e os oprimidos; assim como Jesus mostrava sua proximidade e assumia a situação deles - disse o Santo Padre - assim também nós "não devemos esquecer que os nossos modelos evangélicos são este «povo», esta multidão com estes rostos concretos, que a unção do Senhor levanta e vivifica. São aqueles que completam e tornam real a unção do Espírito em nós, que fomos ungidos para ungir." Trata-se de uma unção que requer a oferta da própria vida, isto é - retomando as palavras do Papa - "Ungimos, distribuindo-nos a nós mesmos, distribuindo a nossa vocação e o nosso coração". Neste sentido, com a sobriedade e a humildade de suas vidas, então - e tomo uma das intenções do Apostolado de Oração este mês - eles são chamados a comprometerem-se em uma ativa solidariedade para com os mais pobres, tornando-se assim um sinal vivo. da presença de Cristo, que oferece a vida por seu povo.
Quando um sacerdote vive assim, a bússola de seu coração aponta para esses dois amores: Deus e o povo. Ele não é apegado a si mesmo nem às coisas deste mundo, mas, pelo contrário, por meio da pobreza, da castidade e obediência, no fundo expressa essa liberdade interior que o faz ser para os outros, sem vincular nada ou ninguém a si mesmo. Fiquei tocado, a esse respeito, com a homilia que o Papa Francisco pronunciou no sábado, 15 de junho, nas exéquias do núncio na Argentina, Dom Léon Kalenga Badikebele. O Papa falou da "despedida do pastor", isto é, do saudável desapego, daquele "que está acostumado a não se apegar aos bens deste mundo, a não se apegar à mundanidade", daquele que se despede para confiar a outros a continuidade do caminho, "como se dissesse": "«Vigiai sobre vós mesmos e sobre todo o rebanho». Vigiai, lutai; sois adultos, deixo-vos sozinhos, ide em frente." Assim, a vida do sacerdote é um sopro de liberdade, no qual se entrega a Deus e a cada dia são dados passos de despedida antes do encontro final com o Senhor. Certamente, trata-se de uma missão nem sempre fácil, quer pela complexidade dos contextos sociais e culturais atuais, como pelo fato de exigir uma maturidade psico-afetiva estável, uma forte capacidade interior ao enfrentar as fadigas e as dificuldades, um traço relacional de serenidade e autenticidade e, naturalmente, uma sólida espiritualidade arraigada no relacionamento pessoal com Jesus e sua palavra.
Esta base humana e espiritual inicial também é recomendada na "Ratio fundamentalis" e pertence sobretudo à fase inicial da formação. Depois, ao longo do caminho, surgem às vezes numerosas dificuldades. Quais são os obstáculos mais importantes para o padre hoje?
Eu diria, antes de tudo, que precisamente pensando nas contrariedades e impedimentos que surgem no caminho da vida sacerdotal, o dicastério quis propor as homilias das Missas Crismais, que se caracterizam como mensagens pertencentes à realidade e àquilo que os sacerdotes experimentam no ministério e no mais profundo de seus corações. A esse propósito, me permitiria dizer: lemos e meditamos sobre o que o Papa diz e escreve e não aquilo que a mídia às vezes deixa transparecer, muitas vezes destacando aspectos secundários ou extraindo do contexto alguma frase que pode servir para criar algum efeito de scoop. Se nos aproximarmos com um ouvido atento às palavras do Papa, perceberemos uma intensa e sofrida atenção do pastor em relação aos trabalhos dos sacerdotes e o amor com que ele deseja acompanhá-los. Por exemplo, para o cansaço do padre, o Papa Francisco dedicou palavras verdadeiramente preciosas, que restauram os corações dos sacerdotes os quais encontram, sobretudo hoje, dificuldades de vários tipos. De fato, eles vivem o cansaço pelas atividades apostólicas, mas também aquele que o Santo Padre definiu como "o cansaço da esperança", que pesa o coração e o faz se tornar – para usar uma imagem bíblica - como uma cisterna rachada. Os obstáculos são tantos; em certos contextos, o avanço do secularismo torna irrelevantes a fé e a pregação do Evangelho; em outros, as comunidades cristãs sofrem a violência da perseguição; as transformações sociais e culturais dos últimos anos redimensionaram o peso, por assim dizer, social da Igreja e, se isso a priva da pretensão da hegemonia e a restitui à simplicidade do Evangelho, é igualmente verdade que torna mais difícil sua missão e requer contínuas atualizações de pensamento, de linguagens, e de presença no mundo. A estes âmbitos, digamos em sua maioria sociológicos, somam-se aqueles da vida pessoal e espiritual do sacerdote: as crises que ele atravessa nas mudanças de idade, as incompreensões, os desânimo, às vezes as dificuldades do relacionamento com o bispo e com os confrades, a aridez na vida de oração. Trata-se de aspectos que podem enfraquecer o vigor do caminho, sobre os quais vale se deter juntos, fazendo-os se tornarem não apenas temas de discussão, mas também espaços de partilha dentro dos presbitérios diocesanos.
Com relação aos esforços dos sacerdotes, o Papa Francisco, falando recentemente na assembleia de bispos italianos, disse que "os padres se sentem constantemente sob ataque midiático" ou "são condenados por causa de alguns erros e crimes de alguns de seus colegas"...
Naturalmente, a constelação de fatos que se referem às misérias de alguns padres, retomadas e às vezes enfatizadas pela mídia, só pode criar confusão nos fiéis e na opinião pública. Todavia, o risco é que hoje seja absolutizado o dado negativo e rapidamente generalizado, associando a figura e a própria palavra "padre" a um perfil ambíguo ou até mesmo obscuro. Na realidade, porém, na Igreja, a grande maioria dos sacerdotes trabalha oferecendo generosamente a própria vida, empregando as melhores energias para o anúncio do Evangelho e para o cuidado do povo de Deus, e gastando-se ao lado de pessoas em dificuldades, aos jovens e aos idosos, os doentes, os pobres. Fiquei muito tocado com a mensagem em vídeo que o Papa Francisco quis fazer há alguns dias, para lançar uma oração - neste mês de junho - pelos sacerdotes, afirmando: «Muitos se arriscam até o fim, oferecendo-se com humildade e alegria. São sacerdotes próximos, dispostos a trabalhar duro por todos. Demos graças pelo seu exemplo e seu testemunho». São padres que trabalham diariamente no silêncio, às vezes na incompreensão ou chamados a enfrentar a solidão e com a aparente infrutuosidade de seu ministério. Como recomendou o Papa Francisco, estes sacerdotes tem necessidade de proximidade, de escuta, de acompanhamento, antes de tudo por parte do bispo, mas – gostaria de dizer - no geral por parte de seu próprio presbitério, das comunidades cristãs e das famílias.
Como a comunidade cristã pode acompanhar e apoiar o caminho dos sacerdotes?
Há tantas sugestões e diversos conselhos e caminhos a serem seguidos para enfrentar os erros e os escândalos; todavia, gostaria de dizer que o primeiro antídoto deveria ser aquele de fazer com que nossos padres se sentissem amados, de viver com afeto e discrição as suas solidões, de não julgá-los de forma implacável, de não fazer com que se sintam sob pressão, exigindo que sejam quase como "máquinas" distribuidoras serviços sagrados e, sobretudo, querer a eles com um bem sincero. A eles devemos mostrar gratidão e apoio, e a primeira maneira de fazer isso, provavelmente, é amá-los com simplicidade e ternura. A este respeito, justamente nestes dias, inaugurando uma importante estrutura terapêutica no Hospital Francesco Miulli de Acquaviva delle Fonti, na Puglia, na presença de autoridades e de uma bela comunidade de leigos representativos, quis recordar - como faço muitas vezes - da importância do amor pelos sacerdotes, do apoio espiritual e moral em seu ministério e da necessidade de entender suas fragilidades e de perdoá-los por aqueles momentos de escuridão e desânimo. Posso assegurar que faz tão bem aos sacerdotes ouvir, por exemplo, uma palavra de louvor pelas suas homilias ou pelo bom êxito de alguma celebração em particular, como as Primeiras Comunhões, ou ainda, pelo sucesso que precisamente nesta época de verão pode ter a atividade com os jovens, como o Grest. Faz um grande bem aos sacerdotes sentir que dentro de sua fraqueza humana há aqueles que os acompanham com a oração, com o reconhecimento pelo seu serviço e com o encorajamento para não desistirem nas provações e dificuldades. Que este Dia de Oração pela Santificação dos Sacerdotes, seja portanto uma ocasião de oração para que o Sagrado Coração de Jesus, fonte e refúgio de toda existência sacerdotal, acompanhe os passos dos sacerdotes com o poder da graça divina. (L'Osservatore Romano)
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