A evolução da Liturgia
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
No nosso espaço memória histórica, 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a falar hoje sobre Liturgia.
Nos últimos programas dedicados à Liturgia, fizemos um salto ao passado, aos primórdios do cristianismo, para entender como os primeiros cristãos celebravam a Eucaristia, com base na descrição de São Justino, apresentada no Compêndio do Catecismo da Igreja Católica.
Entre os primeiros séculos da Igreja e os tempos atuais, muitas transformações ocorreram na liturgia. Temos proposto aqui visões diferentes, mesmo contrastantes, especialmente em relação à reforma da liturgia trazida pela Constituição sobre a Sagrada Liturgia, a Sacrosanctum Concilium promulgada pelo Concílio Vaticano II.
Na edição de hoje deste nosso espaço Memória Histórica, vamos continuar com nosso olhar voltado para os primeiros séculos, e assim entendermos um pouco mais sobre como foi evoluindo e se constituindo os diversos elementos que compõe a liturgia. Quem continua a nos conduzir neste percurso, é padre Gerson Schmidt:
"Da mesma maneira que a Igreja primitiva se separou progressivamente da Sinagoga, assim as formas litúrgicas das jovens comunidades cristãs também se separaram progressivamente do ritual judaico. A celebração da Eucaristia está em íntima relação com as refeições rituais dos Judeus – por exemplo a refeição do sábado ou a ceia Pascal – como também partes mais antigas do ofício das horas, que se estabeleceram a partir da liturgia da oração na sinagoga judaica.
“A ruptura com a Sinagoga deve-se à fé no Ressuscitado; mas no referente aos ritos, quase não havia diferença com os Judeus. Assim, depois do dia de Pentecostes, os novos batizados seguiam tomando parte no culto do Templo (cf. At 2,46); o mesmo São Paulo renovou com outras quatro pessoas o voto judeu dos Nazarenos e fez que se oferecesse o sacrifício prescrito ante o Templo de Jerusalém (cf. At 21, 23-26)”[1].
Com o Edito de paz de Constantino, em 313, a Igreja Primitiva passa de ser perseguida para ser a Igreja oficial do Império Romano. Massas de pessoas começam a entrar na Igreja, a seguir o cristianismo.
“Como o rito foi se desenvolvendo no transcurso dos tempos, poderá continuar fazendo o mesmo no futuro. Mas este desenvolvimento deverá ter em conta a atemporalidade de cada rito e efetuá-lo de maneira orgânica. O fato de que, sob Constantino, o cristianismo se converteu em religião do Estado, trouxe como consequência um maior desenvolvimento do culto. A missa não foi mais celebrada em pequenas igrejas domésticas, mas nas suntuosas basílicas. Prosperou o canto da Igreja. E em todas as partes se celebrou a liturgia com uma grande solenidade”[2].
Há aqui um empobrecimento e também um enriquecimento. Entra na liturgia os elementos de fausto e de grandiosidade. Desde modo, a luz potente e pascal da liturgia primitiva começa a se ofuscar e se carrega as celebrações de extrema solenidades e aparatos demasiadamente solenes e reais [reais de realeza....da liturgia na presença de reis].
Mas, as exageradas pompas e solenidade das basílicas e catedrais levou também a um empobrecimento, um isolamento do fiel, uma massificação e um participação na liturgia como a um espetáculo, sem entendimento algum do mistério litúrgico. Por isso agora a preocupação dos padres conciliares de uma verdadeira restauração da liturgia que permita o fiel se aproximar mais do mistério cristão, entender e participar ativamente da liturgia.
Mas também, no século IV em diante, há um esforço enorme de catequizar sobre o mistério da Eucaristia, como vemos nas figuras dos Santos Padres do Ocidente, Santo Ambrósio e Santo Agostinho e o Padres do Oriente, como São João Crisóstomo. É um tempo fecundo da formação da belíssimas anáforas do próprio Canon Romano.
O enriquecimento do culto, outrossim, contribuiu à formação de ritos diversos tanto no Oriente como no Ocidente. Mas este desenvolvimento foi efetuado sempre de maneira orgânica, sem ruptura com a tradição e sem uma intervenção dirigista das autoridades eclesiásticas.
Os Papas sempre respeitaram os diversos ritos do Oriente e do Ocidente e só excepcionalmente autorizaram um intercâmbio entre um rito oriental e um ocidental. Existem na Igreja vários ritos independentistas. No Ocidente, além do rito romano, existem os ritos galicano (já desaparecido), ambrosiano e moçárabe; no Oriente, há outros ritos: o bizantino, armênio, siríaco e copta.
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[1] cf. Monsenhor Klaus Gamber, Reforma da Liturgia Romana, p. 20, disponível em http://www.unavocesevilla.info/reformaliturgia.pdf.
[2] ibidem.
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