Além da Crise/3: Não tenham medo
FEDERICO LOMBARDI
“Não temas! Porque eu estou contigo!”. São palavras presentes várias vezes nas Escrituras. São as palavras dirigidas pelo próprio Deus ou em seu nome aos que são chamados por ele para uma missão difícil ou inesperada, por caminhos ainda desconhecidos, como Moisés diante da sarça ardente ou Maria diante do Anjo. “Não tenhais medo!”. São as palavras dirigidas pelos profetas ao povo oprimido pela angústia, como quando está sem saída entre o Mar Vermelho e os carros de guerra dos Egípcios. Jesus também as repete várias vezes dirigindo-se aos seus discípulos, ao “pequeno rebanho” que o segue, ou aos que foram perseguidos em seu nome. Para estes Jesus insiste que não deverão temer nenhuma força humana, porque a perseguição pode tirar a vida do corpo, mas não da alma e no tempo da prova Deus não os abandonará.
A grande palavra “Não tenhais medo!”, como recordamos bem, foi retomada com insistência em tempos mais próximos por São João Paulo II desde o início do seu pontificado e dirigida ao mundo inteiro: “Não tenhais medo! Escancarais as portas a Cristo!”. No fundo, a fé em Cristo Salvador – para todos - é exatamente a grande e definitiva libertação do medo.
A pandemia, mesmo quando for superada graças a uma vacina eficaz, deixará em nós uma herança de insegurança, digamos até mesmo de medo, pronta a ressurgir. Agora sabemos que apesar de todos os esforços e empenhos para a redução dos riscos, poderão aparecer e escapar do controle outros vírus ou outras forças capazes de nos pegar de surpresa e colocar em crise as nossas tranquilidades e as nossas seguranças. Porque a segurança absoluta não existe nesta terra, não é possível. E jamais existirá no futuro. Certamente esperamos da ciência e da organização social e política, em geral da razoabilidade humana, uma ajuda essencial para recuperar a tranquilidade necessária para uma vida pessoal e social serena e “normal”. Mas permanece a necessidade de algo mais profundo ao qual estas respostas não são suficientes.
Podemos viver livres dos medos mais radicais para nós mesmos, para os nossos familiares, para o nosso futuro? Onde está a chave para viver em paz e, portanto, da vida verdadeiramente boa mesmo nesta terra, apesar de todas as dificuldades que inevitavelmente se apresentam todos os dias? Sabemos bem que cada um de nós tem a sua personalidade, o seu caráter e a sua história, que determinam profundamente suas atitudes. Há os mais ansiosos e frágeis, e não é culpa deles; há os que são naturalmente mais tranquilos e otimistas, e é um dom. Mas a palavra do Senhor é dirigida a todos e é um convite para todos se entregarem com confiança a um amor que nos precede, nos guarda e nos acompanha.
Nos dias de hoje somos comedidos ao falar de “providência” de Deus. Parece-nos uma palavra que coloca em risco o nosso necessário empenho cristão no mundo, que nos torna passíveis e menos responsáveis. Mas isso é uma armadilha. Esquecer a providência de Deus quer dizer perder o sentido de que o amor de Deus nos envolve e nos acompanha, mesmo se algumas vezes nossos olhos ainda são incapazes de reconhecê-lo. No discurso da Montanha Jesus nos convida a abrir os olhos - “Olhai as aves do céu, olhai os lírios no campo…” – e a não nos deixar levar totalmente pelas preocupações imediatas para o nosso bem-estar temporal. Além das aves e das flores os olhos que se abrem podem ver todos os dias muitos outros sinais de amor e de esperança semeados ao longo do nosso caminho, nas circunstâncias e nas pessoas que encontramos, nas suas palavras e nas suas ações. Cada um de nós considera uma graça encontrar pessoas que sabem vê-los e que nos ajudam a vê-los com olhos penetrantes e olhar sereno. O mundo está cheio não só de más notícias, mas também de boas notícias. É um dever reconhecê-las e divulgá-las, porque são as que guiam mais longe e levam o olhar para o alto, a fonte do amor, a meta da esperança.
Jesus conclui suas palavras sobre a providência com um conselho muito sábio: “A cada dia basta o seu mal”. Não devemos deixar que as preocupações de hoje e de amanhã e de todo o futuro que nos espera se acumulem todas juntas sobre nós: nos esmagariam. Devemos pensar que cada dia tem a sua ração de mal, mas também de graça. Devemos crer que todos os dias nos será dada a graça necessária para carregar o mal. A graça necessária para buscar o reino de Deus e a sua justiça nesta vida e na vida eterna. Santa Teresa de Ávila, nos lança uma palavra que alarga o nosso coração e o nosso horizonte para além de todo o obstáculo: “Nada te perturbe, nada te espante. Tudo passa, Deus não muda. A paciência tudo alcança. Quem a Deus tem, nada lhe falta: Só Deus basta”. Saberá a nossa fé nos inspirar no longo caminho que temos pela frente, para que seja um caminho de inteligência e sabedoria, livre dos maus conselhos, dos medos profundos, livre na esperança do medo da morte?.
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