Documento preparatório Sínodo 2023
1. A Igreja de Deus é convocada em Sínodo. O caminho, intitulado «Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão», iniciará solenemente nos dias 9-10 de outubro de 2021, em Roma, e a 17 de outubro seguinte, em cada uma das Igrejas particulares. Uma etapa fundamental será a celebração da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, em outubro de 2023,[1] a que se seguirá a fase de execução, que envolverá novamente as Igrejas particulares (cf. EC, art. 19-21). Com esta convocação, o Papa Francisco convida a Igreja inteira a interrogar-se sobre um tema decisivo para a sua vida e a sua missão: «O caminho da sinodalidade é precisamente o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milénio».[2] Este itinerário, que se insere no sulco da “atualização” da Igreja, proposta pelo Concílio Vaticano II, constitui um dom e uma tarefa: caminhando lado a lado e refletindo em conjunto sobre o camino percorrido, com o que for experimentando, a Igreja poderá aprender quais são os procesos que a podem ajudar a viver a comunhão, a realizar a participação e a abrir-se à missão. Com efeito, o nosso “caminhar juntos” é o que mais implementa e manifesta a natureza da Igreja como Povo de Deus peregrino e missionário.
2. Uma interrogação fundamental impele-nos e orienta-nos: como se realiza hoje, a diferentes níveis (do local ao universal) aquele “caminhar juntos” que permite à Igreja anunciar o Evangelho, em conformidade com a missão que lhe foi confiada; e que passos o Espírito nos convida a dar para crescer como Igreja sinodal?
Enfrentar juntos esta interrogação exige que nos coloquemos à escuta do Espírito Santo que, como o vento, «sopra onde quer; ouves o seu ruído, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai» (Jo 3, 8), permanecendo abertos às surpresas para as quais certamente nos predisporá ao longo do caminho. Ativa-se deste modo um dinamismo que permite começar a colher alguns frutos de uma conversão sinodal, que amadurecerão progressivamente. Trata-se de objetivos de grande relevância para a qualidade da vida eclesial e para o cumprimento da missão de evangelização, na qual todos nós participamos em virtude do Batismo e da Confirmação. Indicamos aqui os principais, que enunciam a sinodalidade como forma, como estilo e como estrutura da Igreja:
· fazer memória do modo como o Espírito orientou o caminho da Igreja ao longo da história e como hoje nos chama a ser, juntos, testemunhas do amor de Deus;
· viver um processo eclesial participativo e inclusivo, que ofereça a cada um – de maneira particular àqueles que, por vários motivos, se encontram à margem – a oportunidade de se expressar e de ser ouvido, a fim de contribuir para a construção do Povo de Deus;
· reconhecer e apreciar a riqueza e a variedade dos dons e dos carismas que o Espírito concede em liberdade, para o bem da comunidade e em benefício de toda a família humana;
· experimentar formas participativas de exercer a responsabilidade no anúncio do Evangelho e no compromisso para construir um mundo mais belo e mais habitável;
· examinar como são vividos na Igreja a responsabilidade e o poder, e as estruturas mediante as quais são geridos, destacando e procurando converter preconceitos e práticas distorcidas que não estão enraizadas no Evangelho;
· credenciar a comunidade cristã como sujeito credível e parceiro fiável em percursos de diálogo social, cura, reconciliação, inclusão e participação, reconstrução da democracia, promoção da fraternidade e da amizade social;
· regenerar as relações entre os membros das comunidades cristãs, assim como entre as comunidades e os demais grupos sociais, por exemplo, comunidades de crentes de outras confissões e religiões, organizações da sociedade civil, movimentos populares, etc;
· favorecer a valorização e a apropriação dos frutos das recentes experiências sinodais nos planos universal, regional, nacional e local.
3. O presente Documento Preparatório põe-se ao serviço do caminho sinodal, de modo especial como instrumento para favorecer a primeira fase de escuta e consulta do Povo de Deus nas Igrejas particulares (outubro de 2021 – abril de 2022), na esperança de contribuir para colocar em movimento as ideias, as energias e a criatividade de todos aqueles que participarem no itinerário, e facilitar a partilha dos frutos do seu compromisso. Para esta finalidade: 1) começa por delinear algumas caraterísticas salientes do contexto contemporâneo; 2) explica resumidamente as referências teológicas fundamentais para uma correta compreensão e prática da sinodalidade; 3) oferece algumas indicações bíblicas que poderão alimentar a meditação e a reflexão orante ao longo do caminho; 4) descreve certas perspetivas a partir das quais reler as experiências de sinodalidade vivida; 5) expõe determinadas indicações para articular este trabalho de releitura na oração e na partilha. Para acompanhar concretamente a organização dos trabalhos, propõe-se um Vade-mécum metodológico, anexado ao presente Documento Preparatório e disponível no site dedicado.[3] O site oferece alguns recursos para o aprofundamento do tema da sinodalidade, como apoio a este Documento Preparatório; entre eles destacamos dois, em seguida mencionados várias vezes: o Discurso na Comemoração do cinquentenário da instituição do Sínodo dos Bispos, pronunciado pelo Papa Francisco no dia 17 de outubro de 2015, e o documento A sinodalidade na vida e na missão da Igreja, elaborado pela Comissão Teológica Internacional e publicado em 2018.
I. Apelo a caminhar juntos
4. O caminho sinodal desenvolve-se num contexto histórico, marcado por mudanças epocais na sociedade e por uma passagem crucial na vida da Igreja, que não é possível ignorar: é nas dobras da complexidade deste contexto, nas suas tensões e contradições, que somos chamados «a investigar os sinais dos tempos e a interpretá-los à luz do Evangelho» (GS, n. 4). Delineiam-se aqui alguns elementos do cenário global mais intimamente ligados ao tema do Sínodo, mas o quadro deverá ser enriquecido e completado a nível local.
5. Uma tragédia global como a pandemia de Covid-19 «despertou, por algum tempo, a consciência de sermos uma comunidade mundial que viaja no mesmo barco, onde o mal de um prejudica a todos. Recordamo-nos de que ninguém se salva sozinho, que só é possível salvar-nos juntos» (FT, n. 32). Ao mesmo tempo, a pandemia fez eclodir as desigualdades e as disparidades já existentes: a humanidade parece estar cada vez mais abalada por processos de massificação e fragmentação; a trágica condição que os migrantes vivem em todas as regiões do mundo testemunha quão elevadas e vigorosas ainda são as barreiras que dividem a única família humana. As Encíclicas Laudato si' e Fratelli tutti documentam a profundidade das fraturas que atravessam a humanidade, e podemos referir-nos a tais análises para nos colocarmos à escuta do clamor dos pobres e da terra e para reconhecer as sementes de esperança e de futuro que o Espírito continua a fazer germinar inclusive no nosso tempo: «O Criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem se arrepende de nos ter criado. A humanidade ainda possui a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum» (LS, n. 13).
6. Esta situação que, não obstante as grandes diferenças, irmana toda a família humana, desafia a capacidade da Igreja de acompanhar as pessoas e as comunidades a reler experiências de luto e sofrimento, que desmascararam muitas falsas certezas, e a cultivar a esperança e a fé na bondade do Criador e da sua criação. No entanto, não podemos negar que a própria Igreja deve enfrentar a falta de fé e a corrupção, inclusive no seu interior. Em particular, não podemos esquecer o sofrimento vivido por menores e pessoas vulneráveis «por causa de abusos sexuais, de poder e de consciência cometidos por um número notável de clérigos e pessoas consagradas».[4] Somos continuamente interpelados, «como Povo de Deus, a assumir a dor de nossos irmãos feridos na sua carne e no seu espírito».[5] Durante demasiado tempo, o grito das vítimas foi um clamor que a Igreja não soube ouvir suficientemente. Trata-se de feridas profundas, que dificilmente se cicatrizam, pelas quais nunca se pedirá perdão suficiente, e que constituem obstáculos, às vezes imponentes, para prosseguir na direção do “caminhar juntos”. A Igreja inteira é chamada a confrontar-se com o peso de uma cultura impregnada de clericalismo, que ela herdou da sua história, e de formas de exercício da autoridade nas quais se insinuam os vários tipos de abuso (de poder, económico, de consciência, sexual). É impensável «uma conversão do agir eclesial sem a participação ativa de todos os membros do Povo de Deus»:[6] juntos, peçamos ao Senhor «a graça da conversão e da unção interior para poder expressar, diante desses crimes de abuso, a nossa compunção e a nossa decisão de lutar com coragem».[7]
7. A despeito das nossas infidelidades, o Espírito continua a agir na história e a manifestar o seu poder vivificante. É precisamente nos sulcos cavados pelos sofrimentos de todos os tipos, suportados pela família humana e pelo Povo de Deus, que florescem novas linguagens da fé e renovados percursos, capazes não apenas de interpretar os acontecimentos de um ponto de vista teologal, mas de encontrar na provação as razões para voltar a fundar o caminho da vida cristã e eclesial. É motivo de grande esperança que não poucas Igrejas já tenham iniciado encontros e processos de consulta do Povo de Deus, mais ou menos estruturados. Onde eles se distinguiram por um estilo sinodal, o sentido de Igreja voltou a florescer e a participação de todos deu renovado impulso à vida eclesial. Também encontram confirmação o desejo de protagonismo no seio da Igreja por parte dos jovens, e o pedido de uma maior valorização das mulheres e de espaços de participação na missão da Igreja, já apontados pelas Assembleias sinodais de 2018 e de 2019. Nesta linha vão também a recente instituição do ministério laical do catequista e a abertura às mulheres do acesso aos ministérios do leitorado e do acolitado.
8. Não podemos ignorar a variedade das condições em que as comunidades cristãs vivem nas diferentes regiões do mundo. Ao lado dos países em que a Igreja acolhe a maioria da população, representando um ponto de referência cultural para toda a sociedade, existem outros em que os católicos constituem uma minoria; nalguns deles os, católicos, em conjunto com outros cristãos, experimentam formas de perseguição até muito violentas, e não raro o martírio. Se, por um lado, predomina uma mentalidade secularizada que tende a eliminar a religião do espaço público, por outro lado, existe um fundamentalismo religioso que não respeita as liberdades dos outros, alimentando formas de intolerância e de violência que se refletem também na comunidade cristã e nas suas relações com a sociedade. Não raramente, os cristãos adotam as mesmas atitudes, fomentando inclusive divisões e contraposições, até na Igreja. É igualmente necessário ter em consideração o modo como as fraturas que atravessam a sociedade se repercutem no seio da comunidade cristã e nas suas relações com a própria sociedade, por razões étnicas, raciais, de casta ou devido a outras formas de estratificação social ou de violência cultural e estrutural. Tais situações têm um impacto profundo sobre o significado da expressão “caminhar juntos” e sobre as possibilidades concretas de as pôr em prática.
9. Neste contexto, a sinodalidade representa a via mestra para a Igreja, chamada a renovar-se sob a ação do Espírito e graças à escuta da Palavra. A capacidade de imaginar um futuro diferente para a Igreja e para as suas instituições, à altura da missão recebida, depende em grande medida da escolha de encetar processos de escuta, diálogo e discernimento comunitário, em que todos e cada um possam participar e contribuir. Ao mesmo tempo, a escolha de “caminhar juntos” constitui um sinal profético para uma família humana que tem necessidade de um projeto comum, apto a perseguir o bem de todos. Uma Igreja capaz de comunhão e de fraternidade, de participação e de subsidiariedade, em fidelidade ao que anuncia, poderá colocar-se ao lado dos pobres e dos últimos, emprestando-lhes a própria voz. Para “caminhar juntos”, é necessário que nos deixemos educar pelo Espírito para uma mentalidade verdadeiramente sinodal, entrando com coragem e liberdade de coração num processo de conversão, sem o qual não será possível aquela «reforma perene da qual ela [a Igreja], como instituição humana e terrena, necessita perpetuamente» (UR, n. 6; cf. EG, n. 26).
II. Uma Igreja constitutivamente sinodal
10. «Aquilo que o Senhor nos pede, de certo modo está já tudo contido na palavra “Sínodo”»,[8] que «é palavra antiga e veneranda na Tradição da Igreja, cujo significado recorda os conteúdos mais profundos da Revelação».[9] É o «Senhor Jesus que se apresenta a si mesmo como “o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6)», e «os cristãos, na sua sequela, são originariamente chamados “os discípulos do caminho” (cf. At 9, 2; 19, 9.23; 22, 4; 24, 14.22)».[10] Nesta perspetiva, a sinodalidade é muito mais do que a celebração de encontros eclesiais e assembleias de Bispos, ou uma questão de simples administração interna da Igreja; ela «indica o específico modus vivendi et operandi da Igreja, o Povo de Deus, que manifesta e realiza concretamente o ser comunhão no caminhar juntos, no reunir-se em assembleia e no participar ativamente de todos os seus membros na sua missão evangelizadora».[11] Entrelaçam-se assim aqueles que o título do Sínodo propõe como eixos fundamentais de uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão. Neste capítulo explicamos sumariamente algumas referências teológicas essenciais em que esta perspetiva se fundamenta.
11. No primeiro milénio, “caminhar juntos”, ou seja, praticar a sinodalidade, era a maneira habitual de proceder da Igreja, entendida como «Povo reunido pela unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo».[12] Àqueles que dividiam o corpo eclesial, os Padres da Igreja opuseram a comunhão das Igrejas espalhadas pelo mundo, que Santo Agostinho descrevia como «concordissima fidei conspiratio»,[13] isto é, o acordo na fé entre todos os Batizados. É aqui que se arraiga o amplo desenvolvimento de uma prática sinodal a todos os níveis da vida da Igreja – local, provincial, universal – que encontrou a sua mais excelsa manifestação no concílio ecuménico. Foi neste horizonte eclesial, inspirado no princípio da participação de todos na vida da Igreja, que São João Crisóstomo pôde dizer: «Igreja e Sínodo são sinónimos».[14] Este modo de proceder não esmoreceu nem sequer no segundo milénio, quando a Igreja evidenciou em maior medida a função hierárquica: se na idade média e na época moderna é bem atestada a celebração dos sínodos diocesanos e provinciais, assim como a dos concílios ecuménicos, quando se tratava de definir verdades dogmáticas, os Papas queriam consultar os Bispos, para conhecer a fé de toda a Igreja, recorrendo à autoridade do sensus fidei de todo o Povo de Deus, que é «infalível “in credendo”» (EG, n. 119).
12. O Concílio Vaticano II ancorou-se neste dinamismo da Tradição. Ele põe em evidência que «aprouve a Deus salvar e santificar os homens, não individualmente, excluída qualquer ligação entre eles, mas constituindo-os em povo que o conhecesse na verdade e o servisse santamente» (LG, n. 9). Os membros do Povo de Deus são irmanados pelo Batismo e «ainda que, por vontade de Cristo, alguns sejam constituídos doutores, dispensadores dos mistérios e pastores em favor dos demais, reina, porém, igualdade entre todos quanto à dignidade e quanto à atuação, comum a todos os Fiéis, a favor da edificação do corpo de Cristo» (LG, n. 32). Por conseguinte, todos os Batizados, participantes na função sacerdotal, profética e real de Cristo, «no exercício da multiforme e ordenada riqueza dos seus carismas, das suas vocações, dos seus ministérios»,[15] são sujeitos ativos de evangelização, quer individualmente quer como totalidade do Povo de Deus.
13. O Concílio ressaltou que, em virtude da unção do Espírito Santo recebida no Batismo, a totalidade dos Fiéis «não pode enganar-se na fé; e esta sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do Povo todo quando este, “desde os Bispos até ao último dos Fiéis leigos”, manifesta o consenso universal em matéria de fé e de moral» (LG, n. 12). É o Espírito que guia os crentes para «toda a verdade» (Jo 16, 13). Pela sua obra, «a Tradição apostólica progride na Igreja», porque todo o Povo santo de Deus cresce na compreensão e na experiência, «tanto das coisas como das palavras transmitidas, quer graças à contemplação e ao estudo dos crentes, que as meditam no seu coração (cf. Lc 2, 19. 51), quer graças à íntima inteligência que experimentam das coisas espirituais, quer graças à pregação daqueles que, com a sucessão do episcopado, receberam o carisma da verdade» (DV, n. 8). Com efeito, este Povo, reunido pelos seus Pastores, adere ao depósito sagrado da Palavra de Deus confiado à Igreja, persevera constantemente no ensinamento dos Apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e na oração, «de tal modo que, na conservação, atuação e profissão da fé transmitida, haja uma especial concordância de espírito entre os Pastores e os Fiéis» (DV, n. 10).
14. Por isso, os Pastores, constituídos por Deus «como autênticos guardiões, intérpretes e testemunhas da fé de toda a Igreja»,[16] não tenham medo de se colocar à escuta da Grei que lhes for confiada: a consulta do Povo de Deus não exige a assunção, no seio da Igreja, dos dinamismos da democracia centrados no princípio de maioria, uma vez que na base da participação em qualquer processo sinodal está a paixão partilhada pela missão comum de evangelização, e não a representação de interesses em conflito. Por outras palavras, trata-se de um processo eclesial, que só pode realizar-se «no seio de uma comunidade hierarquicamente estruturada».[17] É na fecunda ligação entre o sensus fidei do Povo de Deus e a função magisterial dos Pastores que se realiza o consenso unânime de toda a Igreja na mesma fé. Cada processo sinodal, em que os Bispos são chamados a discernir aquilo que o Espírito diz à Igreja, não sozinhos, mas ouvindo o Povo de Deus, que «participa também da função profética de Cristo» (LG, n. 12), constitui uma forma evidente daquele «caminhar juntos» que faz crescer a Igreja. São Bento salienta que «muitas vezes o Senhor revela a melhor decisão»[18] a quem não ocupa posições relevantes na comunidade (neste caso, o mais jovem); assim, os Bispos tenham o cuidado de alcançar todos, a fim de que no desenrolar ordenado do caminho sinodal se realize aquilo que o apóstolo Paulo recomenda às comunidades: «Não extingais o Espírito. Não desprezeis as profecias. Examinai tudo: abraçai o que é bom» (1 Ts 5, 19-21).
15. O sentido do caminho ao qual todos somos chamados consiste, antes de mais nada, em descobrir o rosto e a forma de uma Igreja sinodal, em que «cada um tem algo a aprender. Povo fiel, Colégio episcopal, Bispo de Roma: cada um à escuta dos outros; e todos à escuta do Espírito Santo, o “Espírito da verdade” (Jo 14, 17), para conhecer aquilo que Ele “diz às Igrejas” (Ap 2, 7)».[19] O Bispo de Roma, como princípio e fundamento de unidade da Igreja, pede que todos os Bispos e todas as Igrejas particulares, nas quais e a partir das quais existe a Igreja católica una e única (cf. LG, n. 23), entrem com confiança e coragem no caminho da sinodalidade. Neste “caminhar juntos”, peçamos ao Espírito que nos leve a descobrir como a comunhão, que compõe na unidade a variedade dos dons, dos carismas e dos ministérios, tem em vista a missão: uma Igreja sinodal é uma Igreja “em saída”, uma Igreja missionária, «com as portas abertas» (EG, n. 46). Isto inclui a chamada a aprofundar as relações com as outras Igrejas e comunidades cristãs, com as quais estamos unidos mediante o único Batismo. Além disso, a perspetiva de “caminhar juntos” é ainda mais ampla e abrange toda a humanidade, da qual compartilhamos «as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias» (GS, n. 1). Uma Igreja sinodal é um sinal profético sobretudo para uma comunidade de nações incapaz de propor um projeto partilhado, através do qual perseguir o bem de todos: praticar a sinodalidade é, hoje para a Igreja, a maneira mais evidente de ser «sacramento universal da salvação» (LG, n. 48), «sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano» (LG, n. 1).
III. À escuta das Escrituras
16. O Espírito de Deus, que ilumina e vivifica este “caminhar juntos” das Igrejas, é o mesmo que atua na missão de Jesus, prometido aos Apóstolos e às gerações de discípulos que ouvirem a Palavra de Deus e que a puserem em prática. Em conformidade com a promessa do Senhor, o Espírito não se limita a confirmar a continuidade do Evangelho de Jesus, mas iluminará as profundidades sempre novas da sua Revelação e inspirará as decisões necessárias para sustentar o caminho da Igreja (cf. Jo 14, 25-26; 15, 26-27; 16, 12-15). Por este motivo, é oportuno que o nosso caminho de construção de uma Igreja sinodal se deixe inspirar por duas “imagens” da Escritura. Uma sobressai na representação da “cena comunitária” que acompanha constantemente o caminho da evangelização; a outra refere-se à experiência do Espírito, em que Pedro e a comunidade primitiva reconhecem o risco de colocar limites injustificados à partilha da fé. A experiência sinodal do caminhar juntos, no seguimento do Senhor e em obediência ao Espírito, poderá receber uma inspiração decisiva da meditação a respeito destes dois momentos da Revelação.
Jesus, a multidão, os apóstolos
17. Na sua estrutura fundamental, uma cena original aparece como a constante do modo como Jesus se revela ao longo de todo o Evangelho, anunciando o advento do Reino de Deus. Os atores em jogo são essencialmente três (mais um). Naturalmente, o primeiro é Jesus, o protagonista absoluto que toma a iniciativa, semeando as palavras e os sinais da vinda do Reino, sem «preferência de pessoas» (cf. At 10, 34). De várias maneiras, Jesus presta especial atenção aos “separados” de Deus e aos “abandonados” pela comunidade (na linguagem evangélica, os pecadores e os pobres). Com as suas palavras e as suas ações, oferece a libertação do mal e a conversão à esperança, em nome de Deus Pai e na força do Espírito Santo. Não obstante a diversidade das chamadas e das respostas de acolhimento do Senhor, a caraterística comum é que a fé emerge sempre como valorização da pessoa: a sua súplica é ouvida, à sua dificuldade presta-se ajuda, a sua disponibilidade é apreciada, a sua dignidade é confirmada pelo olhar de Deus e restituída ao reconhecimento da comunidade.
18. Com efeito, a ação de evangelização e a mensagem de salvação não seriam compreensíveis sem a abertura constante de Jesus ao interlocutor mais vasto possível, que os Evangelhos indicam como a multidão, ou seja, o conjunto de pessoas que o seguem ao longo do caminho, e às vezes até o perseguem, na esperança de um sinal e de uma palavra de salvação: eis o segundo ator da cena da Revelação. O anúncio evangélico não se dirige unicamente a poucos iluminados ou escolhidos. O interlocutor de Jesus é “o povo” da vida comum, o “qualquer um” da condição humana, que Ele coloca diretamente em contacto com o dom de Deus e a chamada à salvação. De um modo que surpreende e às vezes escandaliza as testemunhas, Jesus aceita como interlocutores todos aqueles que sobressaem da multidão: ouve a lamentação apaixonada da mulher cananeia (cf. Mt 15, 21-28), que não pode aceitar ser excluída da bênção que Ele traz; abandona-se ao diálogo com a Samaritana (cf. Jo 4, 1-42), não obstante a sua condição de mulher social e religiosamente comprometida; solicita o ato de fé livre e reconhecido do cego de nascença (cf. Jo 9), que a religião oficial tinha descartado como alheio ao perímetro da graça.
19. Alguns seguem Jesus mais explicitamente, experimentando a fidelidade do discipulado, ao passo que outros são convidados a regressar à sua vida quotidiana: no entanto, todos dão testemunho da força da fé que os salvou (cf. Mt 15, 28). Entre aqueles que seguem Jesus, destaca-se nitidamente a figura dos apóstolos, aos quais Ele próprio chama desde o início, destinando-os à mediação autorizada da relação da multidão com a Revelação e com o advento do Reino de Deus. A entrada em cena deste terceiro ator não se verifica graças a uma cura ou conversão, mas coincide com o chamamento de Jesus. A eleição dos apóstolos não é o privilégio de uma posição exclusiva de poder e de separação, mas sim a graça de um ministério inclusivo de bênção e de comunhão. Graças ao dom do Espírito do Senhor ressuscitado, eles devem salvaguardar o lugar de Jesus, sem o substituir: não para colocar filtros à sua presença, mas para facilitar o seu encontro.
20. Jesus, a multidão na sua variedade, os apóstolos: eis a imagem e o mistério a contemplar e aprofundar continuamente, a fim de que a Igreja se torne cada vez mais aquilo que é. Nenhum dos três atores pode abandonar a cena. Se Jesus não estiver presente e outra pessoa ocupar o seu lugar, a Igreja tornar-se-á um contrato entre os apóstolos e a multidão, cujo diálogo acabará por seguir o enredo do jogo político. Sem os apóstolos, autorizados por Jesus e instruídos pelo Espírito, a relação com a verdade evangélica interrompe-se e a multidão permanece exposta a um mito ou a uma ideologia a respeito de Jesus, quer o aceite quer o rejeite. Sem a multidão, a relação dos apóstolos com Jesus corrompe-se numa forma sectária e autorreferencial de religião, e a evangelização perde a sua luz, que provém da revelação de si que Deus dirige a quem quer que seja, diretamente, oferecendo-lhe a sua salvação.
21. Além disso, há o ator “extra”, o antagonista, que traz à cena a separação diabólica dos outros três. Diante da perspetiva inquietadora da cruz, há discípulos que vão embora e multidões que mudam de humor. A ameaça que divide e, por conseguinte, impede um caminho comum, manifesta-se indiferentemente sob as formas do rigor religioso, da injunção moral, que se revela mais exigente que a de Jesus, e da sedução de uma sabedoria política mundana, que se julga mais eficaz que um discernimento dos espíritos. Para evitar os enganos do “quarto ator”, é necessária uma conversão contínua. A este propósito, é emblemático o episódio do centurião Cornélio (cf. At 10), precedente ao “concílio” de Jerusalém (cf. At 15), que constitui um ponto de referência crucial para uma Igreja sinodal.
Uma dupla dinâmica de conversão: Pedro e Cornélio (At 10)
22. O episódio narra antes de mais nada a conversão de Cornélio, que chega a receber uma espécie de anunciação. Cornélio é pagão, presumivelmente romano, centurião (oficial de baixa patente) do exército de ocupação, que exerce uma profissão baseada na violência e no abuso. No entanto, dedica-se à oração e à esmola, ou seja, cultiva a relação com Deus e cuida do próximo. De modo surpreendente, o anjo entra precisamente nele, chama-o pelo nome e exorta-o a enviar – o verbo da missão! – os seus servos a Jafa para chamar – o verbo da vocação! – Pedro. Então, a narração torna-se a da conversão deste último, que naquele mesmo dia recebeu uma visão em que uma voz lhe ordena que mate e coma animais, alguns dos quais impuros. A sua resposta é decisiva: «De modo algum, Senhor!» (At 10, 14). Reconhece que é o Senhor quem fala com ele, mas opõe-se-lhe com uma clara rejeição, dado que aquela ordem destrói preceitos da Torá que são irrenunciáveis para a sua identidade religiosa, e que exprimem um modo de entender a eleição como diferença que implica separação e exclusão em relação aos outros povos.
23. O apóstolo permanece profundamente consternado e, enquanto se interroga sobre o sentido do que tinha acontecido, chegam os homens enviados por Cornélio, que o Espírito lhe indica como seus enviados. Pedro responde-lhes com palavras que evocam as de Jesus no horto: «Eu sou aquele a quem procurais» (At 10, 21). Trata-se de uma verdadeira conversão, uma passagem dolorosa e imensamente frutuosa para sair das próprias categorias culturais e religiosas: Pedro aceita alimentar-se com pagãos da comida que sempre tinha considerado proibida, reconhecendo-a como instrumento de vida e de comunhão com Deus e com o próximo. É no encontro com as pessoas, acolhendo-as, caminhando com elas e entrando nas suas casas, que ele se dá conta do significado da sua visão: nenhum ser humano é indigno aos olhos de Deus e a diferença instituída pela eleição não é preferência exclusiva, mas sim serviço e testemunho de alcance universal.
24. Tanto Cornélio como Pedro envolvem outras pessoas no seu percurso de conversão, fazendo delas companheiros de caminho. A ação apostólica cumpre a vontade de Deus, criando comunidade, derrubando barreiras e promovendo o encontro. A palavra desempenha um papel central no encontro entre os dois protagonistas. Cornélio começa a compartilhar a experiência que viveu. Pedro ouve-o e em seguida toma a palavra, comunicando por sua vez o que lhe aconteceu e testemunhando a proximidade do Senhor, que vai ao encontro de cada pessoa para a libertar daquilo que a torna prisioneira do mal e mortifica a sua humanidade (cf. At 10, 38). Esta maneira de comunicar é semelhante àquela que Pedro adotará quando, em Jerusalém, os fiéis circuncidados o repreenderão, acusando-o de ter transgredido as normas tradicionais, nas quais toda a atenção deles parece estar concentrada, menosprezando a efusão do Espírito: «Por que entraste na casa de incircuncisos e comeste com eles?» (At 11, 3). Naquele momento de conflito, Pedro descreve o que lhe aconteceu, assim como as suas reações de consternação, incompreensão e resistência. É exatamente isto que ajudará os seus interlocutores, inicialmente agressivos e refratários, a ouvir e a aceitar o que aconteceu. A Escritura contribuirá para interpretar o sentido disto, como sucessivamente acontecerá no “concílio” de Jerusalém, num processo de discernimento que é uma escuta em comum do Espírito.
IV. A sinodalidade em ação:
roteiros para a consulta do Povo de Deus
25. Iluminado pela Palavra e fundamentado na Tradição, o caminho sinodal enraíza-se na vida concreta do Povo de Deus. Com efeito, apresenta uma peculiaridade que é igualmente um recurso extraordinário: o seu objeto – a sinodalidade – é também o seu método. Em síntese, constitui uma espécie de estaleiro de obras ou experiência-piloto, que permite começar a colher imediatamente os frutos do dinamismo que a progressiva conversão sinodal introduz na comunidade cristã. Por outro lado, não pode deixar de se referir às experiências de sinodalidade vivida, a vários níveis e com diferentes graus de intensidade: os seus pontos fortes e os seus sucessos, assim como os seus limites e as suas dificuldades, oferecem elementos preciosos para o discernimento sobre a direção na qual continuar a caminhar. Aqui, certamente, faz-se referência às experiências ativadas pelo presente caminho sinodal, mas também a todas aquelas em que já se experimentam formas de “caminhar juntos” na vida do dia a dia, mesmo quando o termo sinodalidade nem sequer é conhecido ou utilizado.
A questão fundamental
26. A interrogação fundamental que orienta esta consulta do Povo de Deus, como já foi recordado no início, é a seguinte:
Anunciando o Evangelho, uma Igreja sinodal “caminha em conjunto”: como é que este “caminhar juntos” se realiza hoje na vossa Igreja particular? Que passos o Espírito nos convida a dar para crescermos no nosso “caminhar juntos”?
Para dar uma resposta, sois convidados a:
- perguntar-vos que experiências da vossa Igreja particular a interrogação fundamental vos traz à mente?
- reler estas experiências mais profundamente: que alegrias proporcionaram? Que dificuldades e obstáculos encontraram? Que feridas fizeram emergir? Que intuições suscitaram?
- colher os frutos para compartilhar: onde, nestas experiências, ressoa a voz do Espírito? O que ela nos pede? Quais são os pontos a confirmar, as perspetivas de mudança, os passos a dar? Onde alcançamos um consenso? Que caminhos se abrem para a nossa Igreja particular?
Diferentes articulações da sinodalidade
27. Na oração, reflexão e partilha suscitadas pela interrogação fundamental, é oportuno ter em consideração três níveis em que a sinodalidade se articula como «dimensão constitutiva da Igreja»:[20]
· o plano do estilo em que a Igreja normalmente vive e atua, que exprime a sua natureza de Povo de Deus a caminho em conjunto e que se reúne em assembleia, convocado pelo Senhor Jesus na força do Espírito Santo para anunciar o Evangelho. Este estilo realiza-se através «da escuta comunitária da Palavra e da celebração da Eucaristia, da fraternidade da comunhão e da corresponsabilidade e participação de todo o povo de Deus, nos seus vários níveis e na distinção dos diversos ministérios e funções, na sua vida e na sua missão»;[21]
· o plano das estruturas e dos processos eclesiais, determinados inclusive dos pontos de vista teológico e canónico, em que a natureza sinodal da Igreja se manifesta de maneira institucional a nível local, regional e universal;
· o plano dos processos e eventos sinodais em que a Igreja é convocada pela autoridade competente, em conformidade com procedimentos específicos, determinados pela disciplina eclesiástica.
Embora sejam distintos de um ponto de vista lógico, estes três planos referem-se uns aos outros e devem manter-se unidos de maneira coerente, caso contrário transmite-se um contratestemunho, minando a credibilidade da Igreja. Com efeito, se não se encarnar em estruturas e processos, o estilo da sinodalidade degrada-se facilmente do nível das intenções e dos desejos para aquele da retórica: enquanto processos e eventos, se não forem animados por um estilo adequado, não passam de formalidades vazias.
28. Além disso, na releitura das experiências, é necessário ter em consideração que “caminhar juntos” pode ser entendido de acordo com duas perspetivas diferentes, fortemente interligadas. A primeira diz respeito à vida interna das Igrejas particulares, às relações entre os indivíduos que as constituem (em primeiro lugar, aquela entre os Fiéis e os seus Pastores, também através dos organismos de participação previstos pela disciplina canónica, incluindo o sínodo diocesano) e às comunidades em que se subdividem (de modo particular as paróquias). Em seguida, considera as relações dos Bispos entre si e com o Bispo de Roma, inclusive através dos organismos intermediários de sinodalidade (Sínodos dos Bispos das Igrejas patriarcais e arquiepiscopais maiores, Conselhos de Hierarcas e Assembleias de Hierarcas das Igrejas sui iuris, Conferências Episcopais, com as suas expressões nacionais, internacionais e continentais). Por conseguinte, estende-se à maneira como cada uma das Igrejas particulares integra em si mesma a contribuição das várias formas de vida monástica, religiosa e consagrada, de associações e movimentos laicais, de instituições eclesiais e eclesiásticas de diferentes tipos (escolas, hospitais, universidades, fundações, instituições de caridade e de assistência, etc.). Para finalizar, esta perspetiva abrange também as relações e as iniciativas comuns com os irmãos e as irmãs das demais Confissões cristãs, com os quais partilhamos o dom do mesmo Batismo.
29. A segunda perspetiva tem em consideração o modo como o Povo de Deus caminha em conjunto com toda a família humana. Assim, o olhar contemplará o estado das relações, do diálogo e das eventuais iniciativas comuns com os crentes de outras religiões, com as pessoas afastadas da fé e igualmente com ambientes e grupos sociais específicos, com as respetivas instituições (mundo da política, da cultura, da economia, das finanças, do trabalho, sindicatos e associações empresariais, organizações não governamentais e da sociedade civil, movimentos populares, minorias de vários tipos, pobres e excluídos, etc.).
Dez núcleos temáticos a aprofundar
30. Para ajudar a fazer emergir as experiências e a contribuir de maneira mais rica para a consulta, em seguida indicamos também dez núcleos temáticos que abordam diferentes aspetos da “sinodalidade vivida”. Deverão adaptar-se aos diferentes contextos locais e, periodicamente, ser integrados, explicados, simplificados e aprofundados, prestando atenção particular a quantos têm mais dificuldade em participar e responder: o Vade-mécum que acompanha este Documento Preparatório oferece instrumentos, percursos e sugestões, a fim de que os diferentes núcleos de interrogações inspirem concretamente momentos de oração, formação, reflexão e intercâmbio.
I. OS COMPANHEIROS DE VIAGEM
Na Igreja e na sociedade, estamos no mesmo caminho, lado a lado. Na vossa Igreja local, quem são aqueles que “caminham juntos”? Quando dizemos “a nossa Igreja”, quem é que faz parte dela? Quem nos pede para caminhar juntos? Quem são os companheiros de viagem, inclusive fora do perímetro eclesial? Que pessoas ou grupos são, expressa ou efetivamente, deixados à margem?
II. OUVIR
A escuta é o primeiro passo, mas requer que a mente e o coração estejam abertos, sem preconceitos. Com quem está a nossa Igreja particular “em dívida de escuta”? Como são ouvidos os Leigos, de modo particular os jovens e as mulheres? Como integramos a contribuição de Consagradas e Consagrados? Que espaço ocupa a voz das minorias, dos descartados e dos excluídos? Conseguimos identificar preconceitos e estereótipos que impedem a nossa escuta? Como ouvimos o contexto social e cultural em que vivemos?
III. TOMAR A PALAVRA
Todos estão convidados a falar com coragem e parrésia, ou seja, integrando liberdade, verdade e caridade. Como promovemos, no seio da comunidade e dos seus organismos, um estilo comunicativo livre e autêntico, sem ambiguidades e oportunismos? E em relação à sociedade de que fazemos parte? Quando e como conseguimos dizer o que é deveras importante para nós? Como funciona a relação com o sistema dos meios de comunicação social (não só católicos)? Quem fala em nome da comunidade cristã e como é escolhido?
IV. CELEBRAR
“Caminhar juntos” só é possível se nos basearmos na escuta comunitária da Palavra e na celebração da Eucaristia. De que forma a oração e a celebração litúrgica inspiram e orientam efetivamente o nosso “caminhar juntos”? Como inspiram as decisões mais importantes? Como promovemos a participação ativa de todos os Fiéis na liturgia e o exercício da função de santificar? Que espaço é reservado ao exercício dos ministérios do leitorado e do acolitado?
V. CORRESPONSÁVEIS NA MISSÃO
A sinodalidade está ao serviço da missão da Igreja, na qual todos os seus membros são chamados a participar. Dado que somos todos discípulos missionários, de que maneira cada um dos Batizados é convocado para ser protagonista da missão? Como é que a comunidade apoia os seus membros comprometidos num serviço na sociedade (na responsabilidade social e política na investigação científica e no ensino, na promoção da justiça social, na salvaguarda dos direitos humanos e no cuidado da Casa comum, etc.)? Como os ajuda a viver estes compromissos, numa lógica de missão? Como se verifica o discernimento a respeito das escolhas relativas à missão e quem participa? Como foram integradas e adaptadas as diferentes tradições em matéria de estilo sinodal, que constituem a herança de muitas Igrejas, especialmente as orientais, em vista de um testemunho cristão eficaz? Como funciona a colaboração nos territórios onde estão presentes diferentes Igrejas sui iuris?
VI. DIALOGAR NA IGREJA E NA SOCIEDADE
O diálogo é um caminho de perseverança, que inclui também silêncios e sofrimentos, mas é capaz de recolher a experiência das pessoas e dos povos. Quais são os lugares e as modalidades de diálogo no seio da nossa Igreja particular? Como são enfrentadas as divergências de visão, os conflitos, as dificuldades? Como promovemos a colaboração com as Dioceses vizinhas, com e entre as comunidades religiosas no território, com e entre associações e movimentos laicais, etc.? Que experiências de diálogo e de compromisso partilhado promovemos com crentes de outras religiões e com quem não crê? Como é que a Igreja dialoga e aprende com outras instâncias da sociedade: o mundo da política, da economia, da cultura, a sociedade civil, os pobres...?
VII. COM AS OUTRAS CONFISSÕES CRISTÃS
O diálogo entre cristãos de diferentes confissões, unidos por um único Batismo, ocupa um lugar particular no caminho sinodal. Que relacionamentos mantemos com os irmãos e as irmãs das outras Confissões cristãs? A que âmbitos se referem? Que frutos colhemos deste “caminhar juntos”? Quais são as dificuldades?
VIII. AUTORIDADE E PARTICIPAÇÃO
Uma Igreja sinodal é uma Igreja participativa e corresponsável. Como se identificam os objetivos a perseguir, o caminho para os alcançar e os passos a dar? Como se exerce a autoridade no seio da nossa Igreja particular? Quais são as práticas de trabalho em grupo e de corresponsabilidade? Como se promovem os ministérios laicais e a assunção de responsabilidade por parte dos Fiéis? Como funcionam os organismos de sinodalidade a nível da Igreja particular? São uma experiência fecunda?
IX. DISCERNIR E DECIDIR
Num estilo sinodal, decide-se por discernimento, com base num consenso que dimana da obediência comum ao Espírito. Com que procedimentos e com que métodos discernimos em conjunto e tomamos decisões? Como podem eles ser melhorados? Como promovemos a participação na tomada de decisões, no seio de comunidades hierarquicamente estruturadas? Como articulamos a fase consultiva com a deliberativa, o processo do decision-making com o momento do decision-taking? De que maneira e com que instrumentos promovemos a transparência e a accountability?
X. FORMAR-SE NA SINODALIDADE
A espiritualidade do caminhar juntos é chamada a tornar-se princípio educativo para a formação da pessoa humana e do cristão, das famílias e das comunidades. Como formamos as pessoas, de maneira particular aquelas que desempenham funções de responsabilidade no seio da comunidade cristã, a fim de as tornar mais capazes de “caminhar juntas”, de se ouvir mutuamente e de dialogar? Que formação oferecemos para o discernimento e o exercício da autoridade? Que instrumentos nos ajudam a interpretar as dinâmicas da cultura em que estamos inseridos e o seu impacto no nosso estilo de Igreja?
A fim de contribuir para a consulta
31. A finalidade da primeira fase do caminho sinodal é favorecer um amplo processo de consulta, para recolher a riqueza das experiências de sinodalidade vivida, nas suas diferentes articulações e aspetos, envolvendo os Pastores e os Fiéis das Igrejas particulares em todos os diversificados níveis, através dos meios mais adequados, em conformidade com as realidades locais específicas: a consulta, coordenada pelo Bispo, destina-se «aos Presbíteros, Diáconos e Fiéis leigos das suas Igrejas, individualmente ou associados, sem transcurar a valiosa contribuição que pode vir dos Consagrados e das Consagradas» (EC, n. 7). De maneira particular, solicita-se a contribuição dos organismos de participação das Igrejas particulares, especialmente do Conselho presbiteral e do Conselho pastoral, a partir dos quais verdadeiramente «pode começar a tomar forma uma Igreja sinodal».[22] Será igualmente preciosa a contribuição das outras realidades eclesiais às quais o Documento Preparatório for enviado, assim como daqueles que quiserem enviar diretamente a própria contribuição. Finalmente, será de importância fundamental que encontre espaço também a voz dos pobres e dos excluídos, e não somente daqueles que desempenham alguma função ou responsabilidade no seio das Igrejas particulares.
32. A síntese que cada Igreja particular elaborar na conclusão deste trabalho de escuta e discernimento constituirá a sua contribuição para o percurso da Igreja universal. Para tornar mais fáceis e sustentáveis as fases sucessivas do caminho, é importante conseguir condensar os frutos da oração e da reflexão, no máximo, em dez páginas. Se for necessário, para as contextualizar e explicar melhor, poderão ser anexados outros textos como apoio ou integração. Recordamos que o objetivo do Sínodo, e por conseguinte desta consulta, não consiste em produzir documentos, mas em «fazer germinar sonhos, suscitar profecias e visões, fazer florescer a esperança, estimular confiança, faixar feridas, entrançar relações, ressuscitar uma aurora de esperança, aprender uns dos outros e criar um imaginário positivo que ilumine as mentes, aqueça os corações, restitua força às mãos».[23]
Índice
I. Apelo a caminhar juntos
II. Uma Igreja constitutivamente sinodal
III. À escuta das Escrituras
Jesus, a multidão, os apóstolos
Uma dupla dinâmica de conversão: Pedro e Cornélio (At 10)
IV. A sinodalidade em ação: roteiros para a consulta do Povo de Deus
A questão fundamental
Diferentes articulações da sinodalidade
Dez núcleos temáticos a aprofundar
A fim de contribuir para a consulta
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