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Guerrero: reduzimos os custos, mostraremos nossas contas

Entrevista com o prefeito da Secretaria para a Economia: o perímetro do orçamento da Santa Sé aumenta com a inclusão de novas entidades. O déficit total previsto para 2022 é de 33 milhões em comparação com os 42 milhões orçados para 2021: "Contenção de despesas, sem reduzir a caridade do Papa, mas ao contrário, aumentando-a". Em breve, uma prestação de contas sobre o Óbolo, que se prevê tenha diminuído em 15% em 2021

Andrea Tornielli

"Ajudar a economia da Santa Sé a satisfazer suas necessidades, cuidando para que a atividade econômica não se distancie ou tire credibilidade da missão de ajudar a unidade na caridade, e da missão evangelizadora da Igreja." É assim que o prefeito da Secretaria para a Economia, padre Juan Antonio Guerrero Alves, descreve a tarefa do dicastério que ele dirige há dois anos. Nesta entrevista concedida à mídia vaticana, Guerrero oferece alguns dados sobre o novo orçamento da Santa Sé, que aumentou consideravelmente este ano devido à inclusão de novas entidades. A contenção de custos continua (ulteriormente reduzida em 4 milhões de euros). O déficit orçado é menor do que o orçado no ano passado, e o prefeito espera em breve poder fornecer dados sobre as receitas e despesas do Óbolo de São Pedro, antecipando que as ofertas dos fiéis também este ano diminuíram.

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O orçamento da Santa Sé este ano passou de 300 para 800 milhões. Pode nos explicar em detalhes por que este aumento?

A novidade deste ano é que o número de entidades incluídas no orçamento da Santa Sé aumentou. Em julho, o Conselho de Economia (CpE) aprovou um novo perímetro para o orçamento da Santa Sé. No ano passado foram 60 entidades e este ano são 90. A razão pela qual o CpE tomou esta decisão é que este novo perímetro permite uma visão mais completa da situação econômica da Santa Sé. Mais visibilidade, mais transparência e mais controle. A Secretaria para a Economia (SpE) trabalhou para tornar isso possível, pois estamos preocupados em não ter uma visão dos riscos fora do orçamento, que quando há problemas caem sobre a Cúria.

Pode especificar melhor o novo perímetro do orçamento? E o que pode nos dizer sobre a inclusão neste orçamento da Casa Sollievo della Sofferenza, o grande hospital de San Giovanni Rotondo construído por São Pio de Pietrelcina?

Foram incluídas as entidades que, embora não sejam propriamente dicastérios ou a Cúria Romana, são propriedade da Santa Sé ou dependem e estão sob a responsabilidade financeira da Santa Sé. Por exemplo, o hospital pediátrico Bambino Gesù (Menino Jesus) ou o hospital Casa Sollievo della Sofferenza (Alívio do Sofrimento), algumas fundações instrumentais para os dicastérios ou o fundo de pensão, o Fundo de Saúde, as quatro principais basílicas romanas e os santuários de Loreto, Pompéia e Pádua. Isto significa que passamos de um orçamento de cerca de 300 milhões de euros para um orçamento que superará um bilhão de euros. O hospital de que você menciona em sua pergunta e algumas outras entidades ainda não estão incluídas neste orçamento que estamos apresentando, elas serão incluídas no orçamento do próximo ano. A aprovação da incorporação de novas entidades no orçamento é de julho de 2021, as novas entidades fizeram um esforço para se adaptarem em tão pouco tempo ao calendário proposto pela SpE e esta integração é um processo quase completo: faltam apenas três entidades. É por isso que o orçamento deste ano permanece em torno de 800 milhões de euros. Também, se você se lembra, no ano passado o orçamento foi aprovado em fevereiro, este ano o CpE o aprovou em dezembro. Estamos progredindo também nestas pequenas coisas.

Pode nos descrever brevemente quais foram as cifras principais quando as contas foram fechadas em dezembro passado?

Estamos falando mais do orçamento do que do balanço de final de ano, que apresentaremos em meados de 2022. No novo perímetro, a receita é de 770 milhões de euros e as despesas de 803 milhões de euros, o que significa um déficit total de 33 milhões de euros em comparação com os 42 milhões de euros orçados no ano passado. Se considerarmos o orçamento das 60 entidades, como fizemos no ano passado, o déficit seria de 45,8 milhões de euros.  No ano passado, orçamos um déficit de 49,7 milhões de euros para 2021. Compreensivelmente, o CpE teve dificuldade de aprovar um orçamento com tal déficit por mais um ano e nos pediu que fizéssemos planos adicionais para reduzir as despesas e aumentar a receita. De acordo com nossas previsões, esperamos um déficit um pouco menor do que o orçado em 2021. Não ouso dar números para o encerramento de 2021, como você me pede, porque ainda não fechamos o ano e, embora tenhamos introduzido o encerramento trimestral das contas este ano, as previsões ainda podem ser melhoradas. Não temos os números do último trimestre: estamos testando um novo sistema de estimativa, e não sabemos ainda o quão confiável ele é até que o tenhamos testado por mais de um ano.

Quais são os resultados mais importantes que foram alcançados nos últimos doze meses?

Os mesmos do novo orçamento. Contenção de despesas, sem reduzir a caridade do Papa, mas ao contrário, aumentando-a, com vacinação para os sem-teto; aumento da ajuda às Igrejas necessitadas, etc., e ao mesmo tempo uma diminuição ulterior das entradas. Creio que os dicastérios estão cientes da situação econômica e reduzem suas despesas o máximo possível, às vezes pedimos a eles que reduzam ainda mais. É claro que há um limite para a redução, a missão deve ser cumprida. Em geral, isso é feito com muito sacrifício pessoal por parte de muitos.

O senhor enfatiza, como dado positivo predominante, o aspecto fundamental do controle: como se pode conjugar isso com a necessidade de agilizar os procedimentos burocráticos para tornar o sistema mais eficiente?

Não devemos confundir burocracia com procedimento e disciplina. Novos procedimentos e maior disciplina nos processos foram introduzidos e isso leva tempo para se adaptar, levará tempo para se acostumar, pois é uma mudança cultural. O simples fato de as transações econômicas serem vistas e examinadas por outro órgão, ou de haver uma separação de funções no mesmo dicastério, introduz um passo ulterior. No que diz respeito à burocratização, cada um de nós deve reconhecer a parte da tarefa que lhe resta a ser feita. Tomemos como exemplo o caso das licitações, onde temos uma nova lei há mais de um ano. Devemos reconhecer humildemente que existe alguma verdade nisto e que produzimos um excesso de burocracia desnecessária. Como um órgão de supervisão nos encontramos com uma nova lei a ser aplicada, além de nossa inexperiência em aplicá-la, queremos fazer um bom trabalho e aplicá-la bem, provavelmente nos pesam demasiadamente os poucos erros do passado que nos tiraram tanta credibilidade como Igreja e podemos ser muito escrupulosos por medo de cair na arbitrariedade que levou a esses erros. Estamos tentando simplificar os processos e padronizá-los para facilitar a aplicabilidade da lei. Por outro lado, os órgãos e os dicastérios que contratam, também devem reconhecer que devem tomar medidas e mudar muitas práticas há muito consolidadas. As dificuldades e complexidades do novo processo, ao qual ainda não estamos acostumados, são muitas vezes superestimadas, talvez para continuar fazendo as coisas como de costume e evitando os novos procedimentos.

Pode nos dar um exemplo do que acabou de dizer?

Suponhamos que uma instituição, ou um Dicastério, tenha que enfrentar uma grande despesa - o complexo processo é feito por grandes somas - para uma compra ou um contrato. A primeira coisa a fazer é pedir autorização. Mas uma vez obtida, não pode ir - digamos - a um amigo e dar-lhe a ordem ou comprar dele. Naturalmente, este seria o método mais imediato e menos burocrático. Mas isto eu posso fazer em minha casa e com meu próprio dinheiro, não no Vaticano e com dinheiro do qual eu não sou o proprietário, mas o custódio. No processo projetado pela nova lei, é preciso definir qual é a necessidade, abrir um concurso público para os diversos proponentes, no qual até mesmo um amigo pode participar fazendo uma oferta, mas em conjunto com outros distribuidores e marcas. Uma vez recebidas todas as ofertas, elas são avaliadas técnica e economicamente por uma comissão independente e a melhor oferta é escolhida. Tudo isso tem que ser registrado por escrito ou eletronicamente. Foram introduzidas mais formalidades, necessárias para evitar o clientelismo, comissões extras, etc. Isto levou a mais burocracia. Isto levou a mais burocracia ou melhor, procedimento e disciplina, mas também a mais transparência e economia.  O tempo de fazer negócios individualmente e sem prestar contas acabou. Hoje, acima de um certo montante, é necessário dar uma explicação detalhada da operação para obter a autorização, bem como seguir os procedimentos para os contratos, que devem deixar um rastro das ações realizadas e sua justificativa.

Quanto a pandemia afetou e o quanto ela continua a afetar nas entradas da Santa Sé?

Este ano, estamos apresentando o balanço do terceiro ano da pandemia, que continua a ser restritivo. A característica mais notável, dado que as receitas ainda são menores do que no período pré-pandêmico, é a contenção de custos. Em comparação com o orçamento do ano passado, para as mesmas 60 entidades - aquelas que podemos dizer que compõem a Cúria - as despesas deste ano atingem um novo mínimo histórico, orçando 289 milhões de euros em comparação aos 293 milhões do ano passado: uma redução de 4 milhões de euros. No orçamento do novo perímetro, as despesas aumentam em 10 milhões de euros, dos quais 9,5 milhões são um aumento nos custos de pessoal devido a um ajuste extraordinário em um hospital. Este ano, tentando ser otimistas, orçamos 13 milhões de euros a mais em entradas ordinárias do que no ano passado. Veremos como a pandemia se comporta.

No ano que acaba de terminar, quanto os fiéis de todo o mundo ajudaram a Santa Sé?

Estamos muito dependentes de receitas incertas que vemos diminuir a cada ano nesta época de pandemia. Isto deve ser assim, já que a maneira de recebermos a maior parte das doações dos fiéis é através da coleta do Óbolo nas Igrejas e a presença em tempos de COVID foi reduzido. Isto deve nos fazer pensar em outros métodos para solicitar a ajuda dos fiéis e receber doações. Mas para responder mais precisamente à sua pergunta, temos que esperar que eu apresente as contas do Óbolo, que ainda não estão fechadas: vamos fechá-las no final de fevereiro. As doações para a coleta de 2021 ainda estão chegando de alguns países através das nunciaturas. Em síntese, posso dizer que em 2021 houve novamente uma queda em relação ao ano anterior, que eu ousaria quantificar em não menos de 15%. Se em 2020 a arrecadação total do Óbolo foi de 44 milhões de euros, em 2021 eu não acho que será mais de 37 milhões de euros. A diminuição em 2021 se soma à diminuição de 23% entre 2015 e 2019 e à diminuição de 18% em 2020, o primeiro ano da pandemia.

Como pensam em lidar com a falta de recursos a curto e médio prazo?

Certamente precisamos de um plano para aumentar a receita. Há um limite para a redução de despesas. A curto prazo, estamos reduzindo as atividades. A médio prazo, antes de tudo, temos planos para melhorar a eficiência interna, otimizando o retorno sobre os ativos. No lado imobiliário - estamos sempre falando do grande patrimônio da Santa Sé - há muitos prédios a serviço da missão da Igreja, cerca de 60 templos em Roma, vários prédios a serviço de instituições universitárias, hospitais e outras instituições a serviço da missão da Igreja. Esta grande parte do imóvel não tem um retorno econômico, apenas um retorno social, e às vezes tem custos. Outra parte deste patrimônio é para uso institucional: os escritórios do Vaticano, as estruturas dos Dicastérios, que só têm custos. Apenas 20% dos bens imóveis permanecem para um retorno econômico. Um plano que está sobre a mesa da APSA é aumentar esta área de superfície com uma redução do uso institucional. Outro aspecto é a centralização dos investimentos financeiros, que esperamos que seja finalmente concluída este ano.

Quais são suas previsões?

Nossa previsão é que não somos sustentáveis apenas com uma maior eficiência interna. Também precisamos procurar maneiras de atrair mais doações. A primeira exigência é transparência e relatórios limpos, e acho que demos muitos passos nessa direção. Além de prestar contas anuais do orçamento e do balanço, este ano esperamos prestar contas das receitas e despesas do Óbolo, e enviar as contas da Santa Sé às Conferências Episcopais para conhecimento. Devemos tornar as Igrejas locais mais conscientes das necessidades da Santa Sé, a Cúria está a seu serviço e deve ser mantida em grande parte por elas. Há uma grande diferença no compromisso das diversas Igrejas para a sustentação da Cúria Romana. E também para atrair a ajuda dos fiéis, que querem apoiar o Papa em sua missão de unidade na caridade, que é afinal o que a Cúria Romana faz.

O senhor pode dizer como funcionou o grupo de trabalho sobre recursos econômicos envolvendo SpE, APSA e a Secretaria de Estado?

O grupo de trabalho trabalhou muito bem até maio-junho de 2021, quando seu papel terminou. Os bens foram entregues imediatamente à APSA, ainda havia alguns detalhes, algumas procurações a serem assinadas, relações e papéis a serem definidos, informações a serem compartilhadas e os passos legais para tornar tudo isso efetivo: esse foi o trabalho desse grupo. Em seguida, continuamos a trabalhar na atualização e padronização dos procedimentos contábeis e administrativos nos departamentos da Secretaria de Estado, incluindo as nunciaturas, mas isso já fazia parte da comunicação e colaboração usuais entre os três Dicastérios. A gestão de ativos foi transferida para a APSA, sob o controle da SpE, e continuamos a trabalhar em estreita colaboração com ambos os Dicastérios sobre este assunto.

Como terminou a questão do edifício de Sloane Avenue em Londres?

Foi uma transação realizada com total transparência e de acordo com as novas regras dos contratos do Vaticano. Um corretor em Londres e um escritório de advocacia foram contratados, ambos em um concurso restrito, como também uma pessoa de confiança em Londres para acompanhar o processo e representar nossos interesses. O processo foi acompanhado por uma equipe da Santa Sé com alguma ajuda profissional externa de Roma. Foram recebidas 16 ofertas, quatro foram pré-selecionadas e, após uma segunda rodada de ofertas, a melhor foi escolhida. O contrato de venda foi assinado, recebemos 10% do depósito e tudo será concluído em junho de 2022. A perda da suposta fraude, que tem sido muito falada e agora está sendo julgada pelos tribunais do Vaticano, já havia sido levada em conta no orçamento. O edifício foi vendido acima da avaliação que tínhamos no orçamento e da avaliação feita por instituições especializadas. Tanto a transferência dos ativos da SdS para a APSA como a venda de Sloane 60, assim como outras operações econômicas especiais da Santa Sé, foram e são um esforço interno de equipe com alguma ajuda de profissionais externos que precisávamos. Aprendemos muito uns com os outros e encontramos um método de trabalho em equipe que não era muito praticado na Santa Sé. E isto ajuda.

Após dois anos como Prefeito da SpE, como o senhor vê a economia da Santa Sé hoje?

A Cúria Romana é formada por centros de gastos que têm pouca renda em troca do serviço que prestam. A renda do patrimônio ajuda, mas, como já dissemos, é insuficiente para tornar a Cúria sustentável. Se vivemos de doações, não é para ter um “surplus”, mas para usá-las para o propósito para o qual foram doadas. Nosso objetivo é ser sustentável, não ter um excedente. Estamos bem cientes de que cometemos erros na gestão financeira, que prejudicaram a credibilidade da Santa Sé. Tentamos aprender com eles e acreditamos tê-los remediado para que não se repitam.

Nos últimos anos, encorajados pelo Santo Padre, demos passos importantes na gestão financeira na direção certa: mais profissionalização, mais trabalho em equipe, mais transparência e menos sigilo, o estabelecimento de procedimentos de controle, mais reconhecimento de nossas fraquezas e tentativas de corrigi-las... Mudanças importantes foram feitas com a publicação de algumas leis e, mais lentamente, a cultura está mudando. Estamos trabalhando na direção certa. À economia da Santa Sé foi dada muita importância: não é grande, nem é uma atividade importante entre as realizadas aqui. Não me parece que, se fizermos as coisas bem, isso seja de interesse objetivo para o público. Como me disse um jornalista depois de apresentar o último orçamento: "não há notícias aqui". E é verdade, porque só há novidades quando há erros, fraudes ou corrupção. Nosso dever é informar com transparência, talvez as contas da Santa Sé sejam de interesse para os contribuintes, que podem então ver como o dinheiro com o qual eles ajudam é gasto.

Para concluir, como o senhor vê seu Dicastério?

Se eu tivesse que resumir qual para mim é o propósito mais importante de um Dicastério dedicado à economia como a SpE, eu diria: ajudar a economia da Santa Sé a satisfazer suas necessidades, cuidando para que a atividade econômica não distraia ou tire credibilidade da missão da Santa Sé de ajudar a unidade na caridade, e da missão evangelizadora da Igreja, que é o que conta.

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28 janeiro 2022, 13:00