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O promotor de Justiça, Alessandro Diddi, durante a audiência do processo sobre fundos da Santa Sé (Vatican Media) O promotor de Justiça, Alessandro Diddi, durante a audiência do processo sobre fundos da Santa Sé (Vatican Media)

Processo vaticano, troca de cartas entre o Papa e Becciu sobre casos Londres e Marogna

Na 50ª audiência do processo sobre a gestão de fundos da Santa Sé, o promotor de Justiça Diddi depositou uma correspondência entre Francisco e o cardeal, na qual este pediu ao Pontífice que o eximisse das acusações, retirando seu pronunciamento negativo sobre a aquisição do imóvel de Londres e sobre o fornecimento de quantias à administradora sarda para a libertação de uma freira sequestrada, confirmando que tinha sido ele mesmo quem havia autorizado as duas operações

Salvatore Cernuzio – Vatican News

Ouça a reportagem

Duas cartas do Papa e uma do cardeal Angelo Becciu, na qual o purpurado pediu a Francisco que o eximisse da acusação de tê-lo "enganado", declarando que era ele mesmo quem tinha autorizado o então substituto no que diz respeito aos assuntos de Londres e Marogna, e pediu ao Pontífice que retratasse suas declarações anteriores nas quais reiterou "o pronunciamento negativo" para ambas as operações. Este foi o material depositado na quinta-feira, 9 de março, pelo promotor de Justiça, Alessandro Diddi, na Sala dos Museus Vaticanos, durante a 50ª audiência do processo pela gestão dos fundos da Santa Sé. A correspondência ocorreu no mesmo período do conhecido telefonema do cardeal ao Papa, que Becciu gravou em 24 de julho, com a ajuda de sua amiga Maria Luisa Zambrano e sem o conhecimento do Pontífice (durante o período, entre outras coisas, da convalescença de Francisco após sua operação de cólon).

As palavras do promotor Diddi

A documentação surgiu do telefone celular apreendido de Zambrano como parte da investigação da Polícia Financeira de Sassari. Na mesma investigação, transmitida pelo rogatório, houve "uma alusão a esta correspondência, mas sem encontrá-la", disse Diddi. "Perguntei à defesa de Becciu se pretendiam produzi-la, mas eles se reservaram, justamente, o direito de depositá-la. Agi junto à Autoridade Soberana", acrescentou o promotor, anunciando que havia recebido do Papa uma cópia das cartas no início do mês e a autorização para colocá-las à disposição. Apesar da oposição de algumas defesas, a correspondência foi admitida às atas pelo Tribunal vaticano, presidido por Giuseppe Pignatone.

A primeira carta assinada pelo Papa

O conteúdo foi lido na íntegra e projetado na parede da sala do Tribunal. A primeira carta é assinada pelo Papa e tem a data de 21 de julho de 2021. É uma resposta a uma carta de Becciu de 20 de julho, na qual o cardeal, em vista do processo que deveria começar alguns dias depois, no dia 27, pediu ao Papa para confirmar que ele mesmo havia endossado a negociação do imóvel da Sloane Avenue, proposta pelo ilustre Giancarlo Innocenti Botti. Ao mesmo tempo, Becciu pediu ao Papa para confirmar o segredo pontifício sobre o 'caso Marogna', a administradora sarda que havia se oferecido para atuar como intermediária para a libertação de uma freira colombiana sequestrada por jihadistas em Mali. Uma operação para qual a mulher teria recebido somas da Santa Sé, depois gastas em bens de luxo.

Pronunciamento negativo" sobre Londres

"Sua carta me surpreendeu", escreveu o Papa, afirmando que não queria entrar "nos propósitos subjacentes a suas afirmações e suas 'consequentes' estratégias processuais". "Em espírito de verdade", o Pontífice esclarece em primeiro lugar que desde quando Becciu lhe apresentou a hipótese de aquisição do imóvel de Londres, "esta proposta me pareceu imediatamente estranha por causa de seu conteúdo, forma e momento; ao ponto que, não tendo outros elementos de avaliação, sugeri que se procedesse a uma consulta prévia com o Secretário de Estado, o cardeal Pietro Parolin, e o padre Juan Antonio Guerrero Alves, Prefeito da Secretaria para a Economia, para os aprofundamentos de respectiva competência. De fato, era necessário esclarecer o conteúdo e as perspectivas desta operação". A "perplexidade original", escreve Francisco, foi ainda mais reforçada "quando entendi que a iniciativa em questão pretendia, entre outras coisas, interferir, com efeitos prejudiciais, nas investigações do Gabinete do Promotor de Justiça". Daí, o pronunciamento "num sentido negativo".

A confirmação do segredo sobre Marogna

Sobre a confirmação do segredo pontifício em relação ao "caso Mali e ao caso Eslovênia", onde se encontrava registrada a empresa de cooperação internacional de Marogna, o Papa apontou duas "diferenças no caso em questão": "A primeira diz respeito às atividades institucionais realizadas por pessoas competentes e sem dúvida profissionais dentro de suas respectivas funções; a segunda, como o senhor bem sabe, caracterizada pela entrega extemporânea e incauta de recursos financeiros desviados dos propósitos típicos e destinados, de acordo com a tese acusatória, a satisfazer inclinações pessoais supérfluas". "Entenderá bem que não é possível nenhum segredo pontifício", escreveu o Papa a Becciu. "Remeto ao senhor a avaliação de qual perspectiva beneficie objetivamente a Santa Sé".

Dois anexos

O cardeal respondeu em 24 de julho, agradecendo ao Papa "pelo telefonema de hoje à noite", o gravado: "Eu o senti como um verdadeiro Pai disposto a ouvir a dor de um filho". Resumindo as acusações contra o próprio, o cardeal escreve: "Eu deveria citá-lo como testemunha no processo, mas não me permitiria fazer isso". Entretanto, ele diz que precisa de duas declarações do Papa "que confirmem como os fatos ocorreram".

Trata-se de dois anexos nos quais o purpurado busca a confirmação do Papa de que foi ele quem deu o placet para "proceder pela libertação da irmã Gloria Narvaez Argoti" e que ele autorizou o então substituto "a ir a Londres para contatar uma agência especializada em intermediação". Becciu também solicitou que o Papa confirmasse "que ele havia aprovado a quantia necessária para pagar os intermediários e a quantia fixada para o resgate". Quanto a Londres, Becciu apelou ao Pontífice para que afirmasse que ele havia considerado "a proposta interessante".

Essencialmente, Becciu pediu ao Papa que anulasse o que foi declarado na carta de 21 de julho, colocando uma nota no texto: "Por favor, não leve em conta esta carta que considero nula", com assinatura e data, para que ela pudesse ser apresentada em tribunal. Em relação à libertação da freira, Becciu disse que se sentia "obrigado pelo Segredo de Estado por razões de segurança internacional" e escreveu ao Papa: "Diga-me o senhor, porém, se devo considerá-lo como tal ou se me desobriga dele tornando-me livre para responder a quaisquer perguntas que me forem feitas no Tribunal". Como é sabido, Francisco então dispensou o cardeal do segredo para que ele pudesse depor em 7 de abril do ano passado.

A segunda carta do Papa

Mas não termina aí. A terceira carta depositada por Diddi também é assinada pelo Papa e datada de 26 de julho de 2021. O Papa faz entender que não queria escrevê-la pensando já ter esclarecido sua "posição negativa" sobre as declarações que Becciu "pretende que eu assine": "Evidentemente e surpreendentemente, fui mal compreendido pelos senhor", diz ele. O Pontífice reitera que sobre a questão do vínculo de segredo, "a entrega de dinheiro a um intermediário, devido aos aspectos opacos que surgiram de acordo com a tese acusatória, não pode ser coberta pelo Segredo de Estado por razões de segurança, nem suscetível ao segredo pontifício". "Lamento informá-lo - acrescenta - que não posso atender ao seu pedido de declarar formalmente 'nulo' e, portanto, de 'não levar em consideração' a carta que lhe escrevi".

O comandante da Gendarmaria testemunha em tribunal

Ao final da audiência, o gerente financeiro Antonio Mauceri, o comandante da Gendarmaria Gianluca Gauzzi Broccoletti e o comissário Stefano De Santis, que concluiu o contra-interrogatório, foram ouvidos como testemunhas. Gauzzi, em particular, confirmou a "visita" dele e De Santis à casa do cardeal Becciu em 3 de outubro de 2020, quando a campanha midiática contra o cardeal se tornou "intensa". Eles falaram com Becciu por cerca de "uma hora e meia" em particular sobre a acusação de ter financiado testemunhas na Austrália do julgamento do falecido cardeal George Pell por abuso de menores. Mas enquanto sobre este e outros assuntos, Becciu se mostrava "pouco interessado", disse o comandante, quando lhe falaram sobre alguns "papéis da Eslovênia" que demonstravam a diferente utilização do dinheiro da parte de Marogna, "o cardeal se curvou e colocou as mãos no rosto, disse: 'Se esta coisa sair, será um grande dano para mim e para minha família". Em duas outras ocasiões, novamente a respeito do caso Marogna, Becciu "disse que se isto fosse publicado, 'me matariam'" (acrescentou o purpurado referindo-se a si mesmo), afirmou Gauzzi, enfatizando que o cardeal tinha, no entanto, "expressado sua disposição de pagar a soma usada por Cecilia Marogna com uma doação voluntária de sua própria conta corrente a uma conta corrente do Ior". O comandante também garantiu que nunca disse a Becciu para manter segredo sobre o encontro.

Declaração espontânea de Becciu

Em uma declaração espontânea, o cardeal, dizendo-se "amargurado" pelas palavras de Gauzzi, afirmou que o próprio chefe da Gendarmaria lhe repetiu para que mantivesse reserva sobre o encontro: "Ele também me disse que eu é que tinha sido enganado e que não era justo para mim pagar as despesas pessoais feitas por Marogna. Não é verdade que eu só fiquei agitado com a questão Marogna. Eu certamente mostrei preocupação porque era um segredo que tínhamos que guardar". Estas novas declarações, concluiu o cardeal, são "uma nova ferida que foi acrescentada".

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