A OSCE está em uma encruzilhada. Santa Sé defende retomada do diálogo
Salvatore Cernuzio – Cidade do Vaticano
Nestes cinquenta anos da "Ata Final de Helsinque", foram registrados muitos sucessos, bem como superados muitos desafios. O que temos assistido, no entanto, nos últimos anos no âmbito da OSCE é "uma ruptura crescente na confiança recíproca entre alguns Estados participantes, um aumento da agressividade ideológica e um evidente desrespeito pelos princípios fundamentais" contidos na própria Ata Final de Helsinque.
O arcebispo Paul Richard Gallagher não poupa denúncias e repreensões aos membros da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, aos quais reitera o convite a recuperar um espírito de diálogo e colaboração. Sob pena de “autoaniquilação” do próprio organismo.
“A OSCE está inegavelmente em uma encruzilhada e o seu futuro é responsabilidade de cada Estado participante”, afirma o arcebispo no seu pronunciamento nesta quinta-feira, 5 de dezembro, no 31º Conselho de Ministros em andamento em Malta, país que assumiu em 2024 o presidência anual do organismo (a próxima é a Finlândia).
Crescentes divisões
Aos ministros das Relações Exteriores dos 57 Estados participantes de três continentes, Gallagher leva a saudação do Papa a a gratidão pelas muitas metas alcançadas, sempre com o compromisso de buscar a “paz”, a “segurança” e a “justiça”, mas ao mesmo tempo apresenta a “preocupação” da Santa Sé em observar “a crescente fragmentação e as divisões que obscurecem as próprias raízes da OSCE e influenciam o seu trabalho quotidiano”.
O risco de se dividir em “clubes”
A tal propósito, o secretário para as Relações com os Estados recorda no seu pronunciamento o alerta do Papa Francisco que, falando de cooperação internacional, alertou para “o risco de dividir-se em ‘clubes’ que admitem somente Estados considerados ideologicamente compatíveis”. “Mesmo as agências dedicadas ao bem comum e às questões técnicas, que até agora se revelaram eficazes, correm o risco de paralisia devido à polarização ideológica e à exploração por parte de cada Estado”, afirmou Francisco, o que foi reiterado por Gallagher.
O espírito de Helsinque
A principal referência é à Ata Final de Helsinque, o acordo do verão de 1975 que, assinado por trinta e cinco Estados, pôs fim à Guerra Fria. O mesmo acordo tantas vezes invocado pelo Papa Francisco e pelo cardeal secretário de Estado, Pietro Parolin, nesta época marcada por conflitos e dilacerações.
A OSCE é fruto precisamente do “espírito” de Helsinque, isto é, como recordou o arcebispo Gallagher, “o entendimento comum de todos os Estados participantes de que a paz não é simplesmente a ausência de guerra ou a manutenção de um equilíbrio de poder, mas antes o fruto de relações amigáveis, de um diálogo construtivo e da cooperação entre os Estados no cumprimento das obrigações decorrentes do direito internacional e do respeito por todos os direitos humanos universais”.
Desafios e credibilidade
E estas relações, este diálogo, esta vontade de cooperar hoje parecem estar diminuindo dentro da Organização. O arcebispo reitera ao Conselho de Ministros, como principal órgão de decisão e de governo da OSCE, a preocupação em observar tais fraturas, bem como “a falta de consenso de procedimento”. Exemplo disso, afirma, é “o fato de terem sido necessários diversos meses para nomear os primeiros quatro cargos”. Sem esquecer que “não houve qualquer discussão formal sobre a presidência em exercício para 2026”.
Malta assumiu a Presidência com o objetivo de fortalecer a resiliência e a eficácia da Organização. Mas "infelizmente - observa Gallagher - os atuais desafios à eficácia e à credibilidade da OSCE refletem a situação geopolítica mais ampla, em particular a guerra na Ucrânia".
Decisões baseadas no consenso
Como organismo de Estados alinhados que atua por consenso, é preciso então restaurar “o paciente trabalho de diálogo e de negociação, antes que a imposição pela força”. “Seria profundamente deplorável se os Estados participantes renunciassem à esperança e comprometessem a própria essência da OSCE, renunciando a buscar decisões baseadas no consenso para transformá-la em um fórum apenas para Estados que pensam da mesma forma.”
O futuro está em risco
O risco é, de fato, de uma verdadeira “autoaniquilação” ou pelo menos de uma “mudança de forma” da Organização, cuja força e unicidade residem na “diversidade de perspectivas” que enriquecem diálogo e processos de tomada de decisão. “Permaneçamos, portanto, firmes no nosso compromisso de levar todas as partes à mesa de negociações”, é a exortação do arcebispo Gallagher.
Diálogo e desescalada
“A Santa Sé está convencida de que a OSCE continua a ser um fórum único e indispensável para um diálogo autêntico e negociações frutíferas, onde as decisões necessárias e urgentes podem ser tomadas com base no consenso”, acrescenta Gallagher. “É essencial preservar a nossa Organização, sobretudo em um momento em que são necessários o diálogo, a desescalada e a distensão.”
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