Reflexão para o 23º Domingo do Tempo Comum
Padre Cesar Augusto Santos, SJ – Vatican News
Na segunda leitura, Carta de São Tiago 2, 1-5, lemos um fato que constantemente acontece em nossa vida social e, infelizmente, muitas vezes em ambientes religiosos, seja no templo ou em residências ou obras de pessoas referenciais da religião, ou seja, o preconceito social com o subsequente favorecimento do pertencente a uma classe econômica elevada, do bem vestido, daqueles que chamamos de “boa aparência”, do elegante, daquele de corpo sem algum handicap físico ou mental, do portador de um corpo que não deixa dúvidas quanto ao gênero, do pertencente à raça branca, daquele que pertence ao nosso grupo esportivo, nascido em um país do primeiro mundo, do “bem nascido”. Portamo-nos como juízes e prestadores de serviço ao bom senso e discriminamos as pessoas por causa de seu exterior. Como diz o versículo 4: “não vos tornastes juízes com critérios injustos?” Com isso defraudamos aqueles que não se ajustam aos nossos critérios seletivos. E, pode ser exatamente aí, nessas pessoas desprestigiadas por nosso preconceito e discriminação que estejam aqueles valores que almejamos, como está escrito no versículo 5.
A primeira leitura, extraída de Isaías 35, 4-7, se dirige precisamente a essas pessoas relegadas a segundo plano e, por isso, abatidas. O Senhor reverterá a situação desfavorável e a mudança acontecerá. Aí está a justiça de Deus, não castigando o preconceituoso, mas favorecendo sua conversão e libertando o oprimido de tudo aquilo que o oprimia e diminuía diante do olhar limitado do discriminador. Desse modo de agir de Deus, a Sagrada Escritura está repleta. Basta, como amostra, recordarmos das palavras de Maria no Magnificat, Lc 1, 46-55.
Mas vamos pensar grande e intuir se Isaías não usa cegos, surdos e paralíticos no sentido figurado, já que se dirige a um povo deprimido que aguarda a libertação deles mesmos e também da natureza. Ao povo dominado por esses deficientes do bom senso e sem discernimento algum, o Senhor se dirige através da voz de Isaías: “Criai ânimo, não tenhais medo!” Essa possibilidade se torna robusta se olharmos para a segunda leitura e vermos que muitas pessoas marginalizadas pelo preconceito dos dominadores poderosos, possuem uma baixíssima autoestima e concordando com a dominação, nada fazem para se libertar. Também para eles Isaías diz: “Criai ânimo, não tenhais medo!”
O que vemos em situações de opressão seja no âmbito político, laboral, familiar e até no religioso, não nos sugere a necessidade de um Messias? Ora, sem a participação do que sofre a dominação, sem se apropriar do “Criai ânimo”, será muito difícil a libertação, já que Deus pede o desalojamento de nossa acomodação.
O Evangelho, Marcos 7, 31-37 anuncia que a chegada do Messias já aconteceu e confirma tudo o que foi dito anteriormente. Jesus retira um homem da multidão, uma multidão pagã, marginalizado pela surdez e pela consequente dificuldade em falar. Diz-lhe “abre-te”, e o cura, restabelecendo sua saúde e o reconduzindo à multidão com a missão de testemunhar que o Messias, o restaurador do mundo, é Jesus, pois ele “faz bem todas as coisas”.
Tocar os ouvidos primeiro, significa que a fé começa pela audição; depois tocar a língua, a fé provoca o anúncio; finalmente a ordem “abre-te”, todo seu ser está curado e deve anunciar a bondade de Deus, a redenção realizada pelo Verbo. Se a surdez o marginalizava, Jesus não o reintegra simplesmente à vida social, mas o reintegra como um profeta e a missão do profeta especialmente naquela sociedade é testemunhar a ação da Vida. Contudo, Jesus o proíbe de anunciar quem foi que o curou.
Também esse homem pode simbolizar aquele grupo de pessoas, o povo que quer ser curado, mas que a multidão envolvente o manipula e o transforma em massa de manobra. Jesus resgata o povo, e este passa a agir livremente, rompendo com os sistemas que o manipulam. Nesse ínterim surge a famosa proibição, típica do Evangelho de Marcos, de não contar a ninguém a ação maravilhosa de Jesus. Por que? O Senhor não deseja ser confundido como um simples libertador, mas a futura ressurreição irá demonstrar que Messias é Jesus, o libertador de toda e qualquer opressão que sufoca o ser humano. Jesus, a Vida!
A sociedade justa de acordo com o desejo de Deus, é aquela em que os seres humanos se respeitam, se unem para testemunhar a beleza e a grandeza de sermos todos iguais e filhos do mesmo Pai, o Pai de Jesus Cristo, o Messias, o Ungido, aquele que nos liberta do preconceito e nos torna irmãos!
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