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O V Dia Mundial dos Pobres e as desigualdades

Francisco, em sua mensagem aos 13 de junho de 2021 para o V Dia Mundial dos Pobres afirma que não devemos esperar que batam a nossa porta, mas que devemos, urgentemente, “ir ter com eles às suas casas, aos hospitais e casas de assistência, à estrada e aos cantos escuros onde, por vezes, se escondem”.

Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves – Professor e Teólogo

O V Dia Mundial dos Pobres é marcado, no país, por uma série de ações que vão do lançamento, em 14 de setembro, até o Dia Mundial dos Pobres, dia 14 de novembro, com o lançamento do Manifesto pela Vida.

No Brasil, adotou-se o tema: “Sentes compaixão?”, um convite a não ter indiferença frente ao sofrimento das pessoas em situação de vulnerabilidade e à crescente pobreza socioeconômica que assola mais 51,9 milhões de brasileiros e brasileiras. O lema bíblico que inspira a celebração desta edição é: “Sempre tereis pobres entre vós”, extraído de Mt. 14, 7.

Francisco, em sua mensagem aos 13 de junho de 2021 para o V Dia Mundial dos Pobres afirma que não devemos esperar que batam a nossa porta, mas que devemos, urgentemente, “ir ter com eles às suas casas, aos hospitais e casas de assistência, à estrada e aos cantos escuros onde, por vezes, se escondem, aos centros de refúgio e de acolhimento”

Esse acolhimento é necessário para refletir sobre o caminho ético de Cristo com os que mais sofriam e viviam a margem da sociedade. Francisco pede que nos coloquemos ao lugar dos mais fragilizados e destaca a importância de “compreender como se sentem, o que estão a passar e quais os desejos que têm no coração”.

Infelizmente, nas últimas décadas a questão das desigualdades deixou de ser um tema apenas tratado no âmbito social e político. Hoje é observado a questão da economia e, principalmente, a gravidade da crise educacional que compromete o entendimento da realidade e a construção ética de indivíduos.

No dia 25 de maio de 2021, o dia em que o Brasil supera a marca de 450 mil mortos pela COVID-19, uma notícia que tem por título “Não é doença, é fome”! Chamou-me a atenção. A ler a reportagem me coloquei na reflexão para entender, o que de fato, ali estava descrito. Na notícia apresentam-se três cenários de famílias que perderam seus empregos e passam por situações de pobreza em meio a pandemia. A reportagem ainda afirma que: “Além da perda de renda durante a maior crise sanitária do planeta, há outro desastre que une esses três moradores de Brasília: eles estão doentes de fome.”

Essa afirmação é cruel, pois sabemos que é preciso observar a fome, algo que não mata de uma vez, mas vai matando aos poucos. Entrevistas inseridas na notícia afirma que: “Médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde relatam que, nos últimos meses, têm percebido um aumento no número de pessoas que dão entrada em centros de saúde pública com sintomas que acreditam ser de alguma doença, mas, na verdade, estão famintas.”

O Papa Francisco apresenta o desejo de um mundo mais humano e coerente com o Evangelho, sendo ético nas suas ações e preocupado com suas realidades e crises. É preciso reafirmar a dignidade do trabalho e do trabalhador todos os dias. “A crise do nosso tempo, que é econômica, social, cultural e espiritual, pode constituir para todos um apelo a redescobrir o valor, a importância e a necessidade do trabalho para dar origem a uma nova ‘normalidade’, em que ninguém seja excluído”, afirma Francisco na Carta Apostólica Patris Corde.

O Grupo de Análise de Conjuntura – CNBB, aos 8 de novembro de 2021, publicou o artigo

 A conjuntura brasileira e a crise social, no referido texto clama por uma realidade complicada sobre a distribuição de renda, pois “a situação de desigualdades e exclusão social foi intensificada pela experiência da concentração de renda. Somos um país gerador de riquezas imensas, ao mesmo tempo em que figuramos nos últimos lugares nas estatísticas sérias sobre qualidade de vida da população. Em termos de riqueza material e qualidade de vida do povo, há altíssima taxa de concentração de riqueza nas mãos de poucos.”

Desta maneira, Francisco assevera sobre as questões vividas e o caráter evangélico de nossas ações, ele afirma que Evangelho “impele a ter uma atenção muito particular para com os pobres e requer que se reconheça as múltiplas, demasiadas, formas de desordem moral e social que sempre geram novas formas de pobreza”. Além disso é preciso  compreender a adesão concreta  e convicta em abrir os corações para as diversas pobrezas existentes.

Francisco alerta para uma realidade em que hoje, diante da ganância, do narcisismo e do individualismo há uma desordem moral e social que agravam a pobreza e não colabora para se falar de uma autonomia e crescimento social. Assim, Francisco apresenta a realidade de que “Um mercado que ignora ou discrimina os princípios éticos cria condições desumanas que se abatem sobre pessoas que já vivem em condições precárias. Deste modo assiste-se à criação incessante de armadilhas novas da miséria e da exclusão, produzidas por agentes econômicos e financeiros sem escrúpulos, desprovidos de sentido humanitário e responsabilidade social”.

Para tanto, frente aos desafios de nosso tempo é preciso lançar o olhar frente às realidades vividas e o contexto inserido. Há uma grade confusão ao pensar na realidade da esmola e da partilha, Francisco nos ensina que “A esmola é ocasional, ao passo que a partilha é duradoura.” Por isso, é urgente falar de relações duradouras e ações concretas e não apenas ações para estancar as “sangrias” ou apenas o que é urgente; devemos buscar uma constante renovação da realidade humana.

No documento oficial da Igreja do Brasil sobre o Dia Mundial dos Pobres acrescenta a realidade do rosto e Deus que revê a sua face para os pobres e que deseja estar próximo aos pobres. Essa afirmação está presente no evangelho, como Francisco recorda: “os pobres são verdadeiros evangelizadores, porque foram os primeiros a ser evangelizados e chamados a partilhar a bem-aventurança do Senhor e o seu Reino (cf. Mt 5, 3)”.

Para tanto Francisco na Evangelii Gaudium afirma que “Por isso, desejo uma Igreja pobre para os pobres. Estes têm muito para nos ensinar. Além de participar do sensus fidei, nas suas próprias dores conhecem Cristo sofredor. É necessário que todos nos deixemos evangelizar por eles. A nova evangelização é um convite a reconhecer a força salvífica das suas vidas, e a colocá-los no centro do caminho da Igreja. Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a misteriosa sabedoria que Deus nos quer comunicar através deles.” (Evangelii Gaudium, n. 198).

Assim é necessário que saibamos que nossa relação deve ser de constante entrega para que possamos viver a caridade como sendo nossa grande proposta para a vida. Como nos apresenta bento XVI no documento Caritas in veritate sobre o desenvolvimento humano integral na caridade e na verdade, de 2009: “A caridade é o dom maior que Deus concedeu aos homens; é sua promessa e nossa esperança.” Diante deste cenário do aumento da vulnerabilidade social é preciso cuidar da vida, especialmente de quem mais precisa. (n.2)

Atrelado a este aspecto é preciso apresentar de forma coerente o que o Evangelho nos apresenta, principalmente observar que a “doutrina social da Igreja é anúncio e testemunho de fé; é instrumento e lugar imprescindível de educação para a mesma.” (Caritas in veritate, n. 15). Sendo assim é urgente refletir a forma mais ética para o anúncio da Boa Nova de Cristo e o Projeto de Deus para a humanidade.

Atrelada as desigualdades é urgente haver uma reorganização na destruição de renda e de alimentos, além de uma política a serviço do bem comum. No entanto, uma realidade nova e um contexto humano diferente, só serão possíveis se, de maneira coletiva, estivermos dispostos a colaborar nos processos de transformações sociais.

Francisco ao terminar a sua mensagem sobre o Vº Dia Mundial dos Pobres assevera que nossas Igrejas devem abrir-se a um movimento de evangelização que, busque os pobres e onde eles estão para que possamos fazer algo mais. Cada um fazendo a sua parte, agindo com solidariedade e buscando um mundo justo e mais fraterno colaborará para a realização de uma mudança na sociedade atual. Assim, o zelo pelo outro e a alteridade para com ele, seja mais coerente com nosso caminho e a propagação do Evangelho.

*Robson Ribeiro de Oliveira Castro Chaves – Professor de Ensino Religioso do Colégio Santa Catarina - Juiz de Fora (MG) e Teólogo

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12 novembro 2021, 13:44