As crônicas dos tempos passados: Santo Vladymir de Kiev
Padre Douglas Freitas Ferreira
O Príncipe, Santo Vladymir de Kiev, Володимир Святославич, do século X, antes da conversão ao cristianismo era pagão e inescrupuloso. No livro que conta a fundação do povo Rus: As crônicas dos tempos passados, se diz que Vladymir era devasso, possuía cinco mulheres, mais de 800 concubinas, não tinha limites para o desejo de poder e estava em permanente guerra com os povos vizinhos. Após a conversão - que não foi do dia para noite - Vladymir percorreu um caminho ascético e se tornou um homem bom, generoso e manso. No dia do seu batizado, nas margens do Rio Dnepr, em Kiev, convocou todos os seus súditos do povo rus, também, para o batismo. Um dos motivos da sua conversão foi o contato com beleza e o esplendor da liturgia e da Igrejas bizantinas. Com povo batizado, São Vladymir trouxe para suas terras arquitetos e pintores bizantinos que construíram igrejas, padres e monges para a instrução cristã e social do povo, assim nasceu na Ucrânia a Rússia e a cultura daquele povo.
A conversão de Vladymir criou uma nação, modelou e ordenou uma inteira cultura segundo o Evangelho. Ele retirou a trave do próprio olho e, por causa disso, tirou a trave do olho de toda uma nação. Como Príncipe neste mundo, Vladymir se revestiu de discípulo de Cristo e, podemos afirmar sem exagero que assumiu o seu ser como o do mestre, que está no evangelho de hoje: «Todo discípulo bem formado será como o mestre». Vladymir amou e deu o melhor para o seu povo, não era mais um cego que guiava outros cegos, era um homem que ao ver Deus em Cristo, soube conduzir o seu povo naquela direção.
Infelizmente nessa semana assistimos o início de uma guerra na terra de São Vladimir. Não é uma guerra qualquer. Como afirmou Draghi - o premier italiano - é uma guerra no coração da Europa. Podemos pensar esse coração geograficamente, mas o problema não é geográfico, mas é uma guerra no coração da identidade cultural da Europa. Essa razão não encontraremos nos jornais. Os governantes do ocidente depois da segunda guerra, negaram as raízes cristãs europeias, e abraçaram os valores ou do liberalismo americano, ou do sistema político baseado no marxismo-lenismo. A Europa, por isso, perdeu a identidade, a força e as tradições. Acreditou, no Oeste, que o wellfair state resolveria o problema humano. A outra parte do ocidente, a do Leste, por sua vez, imaginou que a doutrina marxista-lenista de uma paz social coordenada pelo deus-estado que prega a igualdade humana sem liberdade individual resolveriam os problemas humanos. Nem uma nem outra. O Papa João Paulo II, de maneira profética, alertou na ONU a necessidade da Europa retomar as próprias raízes cristãs, o que não foi feito pelos líderes europeus. Assim, o denominador comum, seja da escolhas político-sócio-culturais Europa do Oeste que do Leste ao negar as próprias raizes cristãs, afastou a cultura dos desígnios de Deus e privou, ou dificultou, ao coração do homem o acesso a Ele que passa também pela cultura.
A guerra de hoje é fruto da distância que o homem marca em relação a Deus e que revela claramente da sua boca. No Evangelho, hoje, Jesus diz que o homem «fala do que o coração está cheio». Dessa maneira constatamos que a nossa cultura ocidental está vazia de Deus. Basta observar os dizeres dos homens - de poder ou não - Deus não aparece, tudo é reduzido a ideologia, sociologia, psicologia e economia. A posição de Cristo é clara: ora, como poderá então um cego guiar outro cego? Sem o coração que contempla e está em Deus, não conseguiremos ver o próximo, e assim a guerra está instaurada em todos os níveis da existência, e que começa no íntimo do coração de cada homem que se esqueceu e que não vê Deus.
Por isso, irmãos caríssimos, para nós hoje vale as palavras de São Paulo no final da segunda leitura: «sede firmes e inabaláveis, empenhando-vos cada vez mais na obra do Senhor, certos de que vossas fadigas não são em vão», procuremos dar os frutos próprios de um cristianismo enraizado fortemente na nossa vida e assim, seremos construtores de paz verdadeira, como o São Vladimir.
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