Um funcionário do Serviço Estatal de Emergência da Ucrânia é visto no pátio de um hospital destruído por um ataque de míssil russo na cidade de Selydove, região de Donetsk, em meio à invasão russa da Ucrânia em 16 de fevereiro de 2024. (Foto de Anatolii STEPANOV / AFP) Um funcionário do Serviço Estatal de Emergência da Ucrânia é visto no pátio de um hospital destruído por um ataque de míssil russo na cidade de Selydove, região de Donetsk, em meio à invasão russa da Ucrânia em 16 de fevereiro de 2024. (Foto de Anatolii STEPANOV / AFP)  (AFP or licensors)

Justiça e Paz Europa visita a Ucrânia: à ajuda concreta, unir o apoio humano e a oração

Uma delegação da rede das Comissões nacionais das Conferências Episcopais europeias empenhadas na defesa dos direitos humanos, pela paz, pelo desenvolvimento e pelo cuidado da criação, deslocou-se nos últimos dias a Lviv para demonstrar solidariedade ao povo ucraniano, há praticamente dois anos martirizado por guerra. O presidente, dom Herouard, bispo de Dijon: não é possível continuar assim, do ponto de vista humano não há fim à vista.

Tiziana Campisi – Cidade do Vaticano

Solidariedade com o povo ucraniano e os refugiados residentes em alguns países da União Europeia por parte da presidência de Justiça e Paz Europa - a rede europeia das 32 Comissões nacionais Justiça e Paz, encarregadas pelas respectivas conferências episcopais de se manifestarem sobre a pobreza, a defesa dos direitos humanos, paz, reconciliação, desenvolvimento e cuidado da criação - ao visitar a Ucrânia nos últimos dias.

Os dois co-presidentes, dom Antoine Herouard, arcebispo de Dijon e primeiro vice-presidente da Comece, e Maria Hammershoy, foram até a cidade de Lviv a convite do presidente da Comissão para a família e a sociedade da Igreja Greco-Católica Ucraniana, Yuriy Pidlisny. Além de terem se encontrado com o arcebispo greco-católico Ihor Vozniak e os dirigentes da Universidade Católica Ucraniana e a presidente da Caritas Tetiana Stawnychy, puderam constatar os vários danos causados ​​aos edifícios pelos ataques de mísseis russos e pararam em vários cemitérios militares.

Dom Herouard, que realidade o senhor encontrou na Ucrânia?

Nossa jviagem teve duas etapas. A primeira em Berlim com o objetivo de encontrar refugiados ucranianos na Alemanha e compreender melhor a sua situação. Pudemos ouvir testemunhos e sobretudo ter também um momento de oração muito intenso e muito forte diante da embaixada russa em Berlim. Milhões de ucranianos tiveram de deixar o seu país e têm um desejo profundo de regressar para casa, um dia, não muito distante. A segunda parada foi em Lviv, no oeste da Ucrânia, que fica muito longe da linha de combate. Ali, aparentemente, pode-se pensar que a vida é normal, mas se sente que as pessoas acompanham o que acontece na guerra. Vimos também prédios que foram bombardeados, mostraram-nos o cemitério e ao lado um enorme campo com centenas de sepulturas de soldados que morreram nos últimos dois anos. Estavam todos muito adornados com velas, bandeiras, flores. Por meio desta visita, a guerra tornou-se algo muito real também para nós. Não é uma ideia, não é uma luta política, mas é a vida ou a morte das pessoas.

O que mais lhe tocou?

Em primeiro lugar, esta realidade concreta da vida que vivemos fortemente ao ir ao cemitério. Tenho notado, por exemplo, que no final do dia as pessoas que saem do trabalho ou do escritório param ali para rezar no túmulo de alguém conhecido antes de voltar para casa. Isto é muito forte. Outra coisa que me impressionou muito é o fato de todas as pessoas que encontramos, as pessoas com quem falamos, nos terem dito que o comprometimento com a vitória da Ucrânia e a luta pela liberdade, pela democracia, pelo Estado de direito e todos os valores que procuram promover e viver no seu país, não há como voltar atrás e portanto a sua luta durará até ao momento em que o país seja libertado. Em relação às pessoas, e ao seu dia a dia, à primeira vista se vê uma vida quase normal, tem quem vai trabalhar, quem vai ao mercado, mas também sente que a vida não é mais como era. Por exemplo, Lviv era uma cidade muito turística antes da guerra e agora não há turistas. E há também a ameaça de bombardeamentos. Quando chegamos, a primeira coisa que nos mostraram, antes de nos mostrar o quarto onde dormiríamos, foi o lugar para ir em caso de emergência, de bombardeio. Portanto, esta realidade da guerra permanece sempre presente na vida das pessoas.

Vocês se encontraram com vários representantes da Igreja, da Igreja Greco-Católica, da Caritas, o que é mais necessário na Ucrânia?

Mesmo que a Ucrânia tenha necessidade de uma ajuda muito concreta, o apoio humano, a proximidade, a oração, a fraternidade são muito importantes neste momento. A Caritas faz um excelente trabalho e tem uma excelente organização, mas as necessidades são enormes. Há que considerar que 40% da população teve que abandonar a sua casa, quer para fora do país, quer como refugiada noutros países europeus, especialmente na Polônia, Alemanha e outros países da Europa de Leste, ou dentro da Ucrânia. Muitas pessoas que viviam no leste tiveram que ir para o oeste.  É necessária ajuda material, alimentos, locais de acolhimento, mas também é necessária ajuda psicológica, ajuda humana, porque o trauma é muito forte para muitas pessoas. A Caritas calculou, mais ou menos, que em dois anos foram ajudadas mais de 3 milhões de pessoas. É algo enorme, e pontanto têm necessidade de ajuda de outros países neste aspecto humanitário.

Em 24 de fevereiro completam dois anos desde o início da guerra na Ucrânia. O que se pode fazer para acabar com o conflito?

É difícil, porque do ponto de vista humano não há fim à vista. Penso que todas as pressões possíveis foram exercidas sobre a Rússia pelos países ocidentais, tanto a nível diplomático como econômico, e são importantes. Os nossos amigos ucranianos disseram-nos para continuarmos, mas vemos que o futuro da guerra e a possibilidade de encontrar um caminho para a paz também depende dos líderes. E por isso há também um apelo à consciência: não é possível continuar assim. Devemos responder à determinação dos ucranianos, que consideramos muito forte, talvez pedindo aos russos que respeitem a dignidade e a integridade do país vizinho.

O empenho da Igreja na Ucrânia

 

No final da visita, a delegação Justiça e Paz Europa rezou pelas vítimas da guerra, pelas quais também foi celebrada uma Missa, e no regresso foram recebidas em Przemysl, na Polônia, na fronteira com a Ucrânia, pelo arcebispo Adam Szal e dom Josef Michalik. Como recordou Dom Herouard, a visita à Ucrânia foi precedida de um encontro com os secretários-gerais nacionais das Comissões que integram a rede, que decorreu em Berlim, de 9 a 11 de fevereiro, durante o qual foi cedido espaço a alguns refugiados.

Num comunicado publicado no final dos três dias foi sublinhado que a invasão russa da Ucrânia, “com bombardeamentos terroristas contra a população civil, crimes de guerra e ocupação brutal, obrigou mais de 6 milhões de pessoas a abandonar a sua terra natal e a procurar refúgio no estrangeiro”. , embora existam 3,6 milhões de pessoas deslocadas internamente, e que dois anos após o início da guerra “a Federação Russa não parou de infligir sofrimento e morte à população ucraniana”. Daí o convite para apoiar os ucranianos “que arriscam as suas vidas pela liberdade e segurança do resto da Europa”.

A declaração saudou “a decisão do Conselho Europeu de abrir negociações com a Ucrânia sobre a adesão à UE” com grande satisfação, com a esperança de que “este processo também conduza a um fortalecimento das relações culturais, econômicas e pessoais”.

Os secretários-gerais das Comissões de Justiça e Paz também exortam a oferecer ajuda e acolhimento aos refugiados, para que possam ser integrados pelos países de acolhimento, e recordar, como diz o Papa Francisco na encíclica Fratelli tutti, que “o amor não se preocupa se um irmão ou irmã necessitado vier de um lugar ou de outro.” Por fim, são feitos apelos a “todos os meios diplomáticos disponíveis ao nível da cooperação multilateral” para que a Federação Russa “ponha fim ao derramamento de sangue e ao sofrimento” e pare os seus “ataques aos fundamentos do direito internacional, dos direitos humanos e da ordem internacional".

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17 fevereiro 2024, 14:27