Fraternidade e amizade social: “somos todos irmãos”
Padre Ricardo Fontana - Reitor do Santuário Nossa Senhora de Caravaggio
O tempo da Quaresma, é o tempo de conversão exigida por Jesus: “Arrependei-vos e crede no Evangelho” (Mc1,15). Três práticas de indicação bíblica são enaltecidas no ciclo litúrgico quaresmal: jejum, oração e esmola. “A penitência do Tempo Quaresmal não deve ser apenas interna e individual, mas também externa e social...” (SC, n.110). No Brasil, há 60 anos, essas práticas vêm se fortalecendo, para que tenhamos uma conversão pessoal e comunitária pela Campanha da Fraternidade. O Papa Francisco, na Encíclica Fratelli Tutti, anuncia uma proposta de responsabilidade coletiva que pudesse levar a “fraternidade e amizade social”, perante os males que ameaçam a paz no mundo. “Fratelli tutti” (Somos todos irmãos), escrevia São Francisco de Assis, dirigindo-se a seus irmãos e irmãs para lhes propor uma forma de vida com o sabor do Evangelho. Dos conselhos que ele oferecia, vale destacar o convite a um amor que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço; nele, declara feliz quem ama o outro, ‘o seu irmão, tanto quando está longe, como quando está junto de si’. Com poucas palavras, explica o essencial de uma fraternidade aberta, que permite reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas, independentemente da sua proximidade física, do ponto da terra em que cada uma nasceu ou habita. (FT, n.1).
O livro de Rute traz a simplicidade e a beleza da amizade que é a escolha quando Rute decide ficar em companhia de Noemi, sua atitude é também uma aliança com de irmã, mesmo sendo nora de povo estrangeiro: “teu povo é meu povo, teu Deus é meu Deus. Onde morreres lá morrerei e lá serei sepultada.” (RT 1,16-17). Porém, os efeitos da compaixão de Rute são claros: ela devolve a vida a Noemi e lhe permite reencontrar a benção de Deus, que se manifesta na descendência. A amizade social, portanto, é reconstrução de relações que superam a dominação e a exploração. “Todos vós sois irmãos” (cf. M 23,8) é o que Jesus indica como resposta à conduta dos fariseus; é a escolha da fraternidade. A lei do Senhor não é desconhecida nem para os Discípulos, nem para a multidão que a escuta, nem para os fariseus e escribas que a anunciam. É Jesus o próprio horizonte a partir do qual o discípulo deve se aproximar da Lei. Portanto, encontramos no próprio Jesus, o sentido de sua fala: “todos vós sois irmãos”. Interpelado a respeito de sua família, Jesus dissera: “eis minha mãe e meus irmãos. Todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,49-50). Em Jesus, os laços gerados a partir da fé são mais fortes que os laços de sangue. “Já não vos chamo servos (...). Eu vos chamo amigos” (Jo 15,15). A amizade cristã, está no discurso de Jesus no capítulo 15 de João. Primeiro, Jesus utiliza uma imagem ensinando os discipulos o seu lugar no Reino de Deus: o discípulo é ramo da videira verdadeira que é Jesus. Não lhe cabe o lugar do caule ou da seiva que nutre e prove a vida, mas sua vocação é a união à videira verdadeira que é Jesus: só nele há vida. Essa união é possível se o discípulo guarda o mandamento do Mestre, que é um único: “que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei” (Jo 15,12), o convite para qual tal amor se expresse no serviço. O desejo de Jesus é o amor-serviço, a amizade pela qual Ele mesmo esteve unido ao que o Pai lhe dera. Segundo Bento XVI a amizade é um grande bem humano... os amigos devem sustentar-se e encorajar-se no desenvolvimento dos seus dons e na sua colocação ao serviço da comunidade.
A amizade social parece ser o caminho que o Espírito tem indicado a Igreja, indicando o retorno ao modelo das primeiras comunidades que viviam em profunda comunhão e espiritualidade. São Leonardo Murialdo, santo que se dedicou às causas sociais e grande precursor da Encíclica Social Rerum Novarum (15.05.1891), do Papa Leão XIII, dizia em plena era da Revolução Industrial junto aos meninos órfãos e de rua: “a amizade é o eco do Divino sobre a terra, e o testemunho mais certo da presença de Deus e de sua graça na vida do ser humano”. A opção pela cultura do encontro verdadeiro e pessoal com Jesus e com os irmãos, na compaixão e no anúncio da esperança, são sinais que antecipam a salvação.
Fonte: SANTUÁRIO DE N. SRA. DE CARAVAGGIO
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