Sínodo: comunhão na diversidade, uma ideia para o futuro que vem dos primeiros cristãos
Rui Saraiva – Portugal
Responder ao mundo globalizado e à variedade cultural através de comunhão na diversidade, é uma ideia revelada por D. Carlos Azevedo, delegado do Comité Pontifício para as Ciências Históricas.
As soluções das comunidades dos primeiros séculos
Em entrevista, a propósito desta fase de reflexão que prepara a segunda sessão da XVI Assembleia do Sínodo, o bispo português alerta para o facto de que as respostas do Sínodo podem ser uma desilusão se não conseguirem “encontrar uma solução de comunhão na diversidade cultural”.
“Eu vou-me convencendo, até pela reflexão que tenho vindo a fazer sobre as comunidades primitivas (cristãs) dos primeiros séculos e dada a diversidade cultural de uma Igreja que no mundo globalizado é confrontada com uma enorme variedade cultural, que as respostas do Sínodo serão uma desilusão se não conseguirmos encontrar uma solução de comunhão na diversidade cultural. Como nos primeiros séculos existia uma resposta diversificada em relação aos problemas da disciplina e aos problemas do culto mantendo intacta a comunhão. Por isso, havia muitos sínodos e era a dimensão sinodal que resolvia as questões em debate”, revela.
O bispo português assinala o exemplo do Concílio de Niceia que teve lugar no ano 325, sendo mesmo referido no Relatório de Síntese do Sínodo, e enfatiza que “muitos sínodos se realizaram nos primeiros séculos” citando o exemplo da Assembleia de Jerusalém dos anos 49 e 50.
“Mas muitos sínodos realizaram-se nos primeiros séculos. Desde o primeiro de 49-50 que se chama Assembleia de Jerusalém para se chegar a um acordo. E a que acordo chegaram? Os judeus continuam a ser circuncidados, mas os pagãos não precisam ser circuncidados para serem batizados. Os pagãos podem comer carnes sacrificadas e os judeus não. Mas quando os pagãos estiverem a comer, não devem ir lá os judeus dizer: ‘nós estamos aqui a comer e vocês não podem’. Ou seja, termos diversidade cultural, mas sem nos pegarmos pelas diversidades de rituais, pelas diversidades de disciplina”, declara.
Organizar à medida das necessidades e dos ministérios
Para o historiador é essencial ir à origem histórica da criação dos vários ministérios na Igreja porque, como o próprio afirma, “Jesus não disse que queria bispos, presbíteros e diáconos”.
“Não vamos obrigar todos à mesma disciplina e ao mesmo nível de ministérios, porque isso foi-se criando. Jesus não disse que queria bispos, presbíteros e diáconos. Foram as comunidades paulinas em conjunto com as comunidades judeo-cristãs que foram fundindo. Umas tinham um colégio de anciãos/senhores que se chamavam presbíteros e outras tinham vigilantes que se chamavam bispos. Depois era preciso alguém que servisse em coisas muito concretas e a palavra serviço em grego era diaconia e surgiram os diáconos. A Igreja foi-se organizando à medida das necessidades e à medida dos ministérios”, afirma D. Carlos Azevedo.
Revela que será muito importante que a XVI Assembleia do Sínodo dos bispos chegue a uma solução na qual seja possível “dizer a todos que estamos em comunhão”.
“O estudo das comunidades primitivas tem-me iluminado muito para uma solução que para mim será talvez a única possível que conseguirá dizer a todos que estamos em comunhão”, declara.
O delegado do Comité Pontifício para as Ciências Históricas tem vindo a investigar e a escrever nesta sua linha de reflexão histórica sobre o Sínodo e diz que poderá vir a publicar em livro o seu estudo.
“Estou a preparar com tempo. É uma coisa que já há uns anos que penso fazer. Já ensinei durante muitos anos história da Igreja antiga, portanto, algumas coisas já vêm de alguns anos. Agora estou a pensar talvez preparar um livro sobre esta questão, mas está ainda a ser construído”, diz o bispo português.
Diálogo para caminhar no ritmo do Evangelho
Para D. Carlos Azevedo “é preciso encontrar capacidade de diálogo entre as diversas sensibilidades que existem na Igreja” para ser possível “caminhar no ritmo do Evangelho”.
“Não foi por acaso que o Papa alargou para duas sessões e não foi por acaso que essas 20 grandes questões vão até 2025. Porque é preciso encontrar essa capacidade de diálogo entre as diversas sensibilidades que existem na Igreja, mas que estas sensibilidades não impeçam a comunhão na diversidade e se possam encontrar soluções diversas em diferentes territórios culturais. Porque hoje nós não caminhamos todos ao mesmo ritmo, mas somos chamados a caminhar no ritmo do Evangelho”, sublinha.
Para abrir à diversidade é preciso proximidade com Deus e o ano de oração, proposto pelo Papa Francisco, que prepara o Ano Santo de 2025, é uma oportunidade para a conversão àquilo “que Deus nos pede”, assinala D. Carlos.
“Será o caminho certo, porque foi o caminho que a Igreja nos primeiros tempos encontrou e que foi reunir-se para debater, para se ouvirem uns aos outros e para encontrarem vias que sejam de comunhão. Mas que também não sejam uns a atrasar os outros e uns a adiantar os outros, que seja no respeito pelo passo de cada um. E este respeito pelo passo de cada um, mantendo a comunhão, é que me parece que é o evitar qualquer cisão, qualquer cisma, qualquer rutura, porque é um apelo essencial. E, por isso, é que o Papa disse que este ano anterior ao Ano Santo (2025) é um ano de oração. Será na proximidade com Deus e com aquilo que Deus nos pede que encontraremos a conversão para aceitarmos despir-nos daquilo que são praxes fixas, para nos abrirmos à diversidade”, conclui o bispo.
O Relatório de Síntese da primeira sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos bispos está a ser objeto de reflexão na Igreja em todo o mundo. A Secretaria Geral do Sínodo lançou para o efeito uma pergunta orientadora: Como ser Igreja sinodal em missão?
A segunda sessão do Sínodo terá lugar em Roma de 2 a 27 de outubro neste ano de 2024.
Laudetur Iesus Christus
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