Beneditinos com o Santo Padre na Audiência Geral de 18 de setembro de 2024. Beneditinos com o Santo Padre na Audiência Geral de 18 de setembro de 2024.  (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

"Um mosteiro beneditino é sempre um laboratório de sinodalidade", diz prior de Fonte Avellana

"Eu penso que uma das riquezas da Ordem de São Bento é a sinodalidade. Um mosteiro beneditino é sempre um laboratório de sinodalidade. São Bento coloca na Regra que toda decisão deve partir de uma escuta, inclusive escutar os mais novos, aqueles que chegam, porque o Espírito Santo pode falar por meio dele também", diz dom Cristiano Souza OSB, prior do Mosteiro de Fonte Avellana, na região italiana das Marcas.

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

A Igreja de Santo Anselmo no Aventino, em Roma, sediou em setembro o Congressus OSB 2024, que reuniu por duas semanas aproximadamente 215 abades, priores e superiores da Confederação Beneditina mundial para seu congresso quadrienal. A eles se uniram 22 representantes da Communio Internationalis Benedictinarum, que representam os mosteiros e institutos beneditinos. Na ocasião foi eleito o novo Abade Primaz, o alemão dom Jeremias Schröder, que sucede o estadunidense dom Gregory Polan.

Entre os participantes, dom Cristiano de Oliveira Souza OSB, prior do Mosteiro de Fonte Avellana, aqui na Itália. Em visita à Rádio Vaticano, o religioso natural de Guaratinguetá, interior de São Paulo, falou de diversos temas, desde a descoberta e o amadurecimento de sua vocação ("decidi por Aquele que decidiu por mim"), passando pela Regra de São Bento e a espiritualidade beneditina, o Congresso dos Abades, o encontro com o Papa Francisco na Audiência Geral, que pediu que "os monges fossem promotores de paz, segundo a própria vocação monástica" e na conclusão da entrevista ,um pedido de oração: "Reze também pela vida monástica, reze por aqueles que escolheram esse caminho, nós precisamos muito do apoio e do apoio espiritual de tantos leigos e leigas, para que possamos ser fiéis à nossa promessa, ao nosso chamado".

Ouça a entrevista completa com dom Cristiano de Oliveira Souza

Uma vocação cultivada, elaborada, trabalhada...

O Cristiano é filho de uma história de amor, história de amor de um homem e de uma mulher, meu pai e minha mãe, o Gui e a Graça como são conhecidos lá em Guaratinguetá e que cultivaram dentro de mim desde o início a fé cristã, bem autêntica, e já quando era menino, já manifestei o desejo de ser sacerdote. Mas o meu pai foi muito sábio, muito iluminado. Até o bispo que me ordenou, dom Darci Nicioli – ele veio do Brasil para me ordenar aqui na Itália - ele recordou na homilia isso, essas palavras do meu pai foram importantes para mim. Eu tinha mais ou menos 8 anos quando ele disse: “Tudo bem, você quer ser padre, mas agora não! Primeiro você vai crescer, você vai ser homem, vai trabalhar, e só depois você vai decidir”. E ele tinha razão! Porque somos muito católicos, aquela região do Vale do Paraíba é muito católica e na nossa casa havia uma frequência muito grande dos padres, então, o Cristiano é aquele que foi e permitindo. E eu fui crescendo, e passei pelas etapas normais da adolescência e da juventude, com suas crises e conquistas, com seus amores, mas também com seus dissabores, também no mundo do trabalho, dos estudos e das paixões, do amor bem vivido. Mas essa chama permaneceu. Ela foi cultivada, ela foi trabalhada, mesmo namorando ela foi cultivada, trabalhada, elaborada. E assim, com 29 anos, eu deixei tudo e decidi por Aquele que decidiu por mim. Escolhi aquele que já tinha me escolhido, e não foi fácil! Eu escutava agora, vindo para cá, um podcast de um padre muito conhecido no Brasil, um padre do Opus Dei, ele dizia que o Céu é para aqueles que sabem sofrer, o Céu é habitado por pessoas que sabem sofrer, o sofrimento de toda espécie, e o sofrimento de um amor, que precisa ser renunciado por um Amor maior, é importante, e eu sou muito feliz e hoje estou aqui na Itália, eu fiz os meus votos perpétuos no Mosteiro de Camaldoli em 2017, durante a Solenidade de São Bento, fiz meu no viciado em 2010, no Eremitério de Camaldoli, fiz meus estudos de Teologia e me especializei em Teologia Sacramentária e Teologia Espiritual Monástica e depois eu estudei Psicologia aqui em Roma, e em 2020 eu fui para o Mosteiro de Fonte Avellana. Não esperava que depois de 2 anos ali, depois de três anos, eu seria eleito Prior do Mosteiro de Fonte Avellana. Depois de mil anos de história, o primeiro estrangeiro, o primeiro não italiano a ser o pior daquele mosteiro, que é importante não só para Itália, não só para Igreja, mas para civilização ocidental, para a Europa.

O prior do Mosteiro de Fonte Avellana na entrevista à Rádio Vaticano
O prior do Mosteiro de Fonte Avellana na entrevista à Rádio Vaticano

Uma leitura sobre a presença de brasileiros à frente de Congregações e Ordens religiosas.....

Olha eu vou responder com uma forma muito simples de uma de uma decisão que tivemos que tomar durante o Congresso dos Abades e dali surgiu uma pergunta feita por um abase colombiano. Houve uma discussão sobre o Jubileu de 2029, que será o Jubileu dos 1.500 anos da Abadia de Monte Cassino. E foi feita a proposta de transferir o próximo Congresso dos Abades, que será 2028, para 2025. E surgiu uma grande discussão. Sabe, monge estuda muito e por isso complica tudo, né? Aí começaram muitas discussões. Vamos fazer assim, assim, até que se chegou a uma conclusão de antecipar o início do Jubileu. Fazemos sempre no mês de setembro, e o início do Jubileu de Monte Cassino será em setembro de 2028, iniciando com Congresso dos Abates. Mas antes de terminar essa discussão, levantou-se com muita simplicidade dom Guillermo e fez a seguinte colocação: tudo bem, discutimos os pormenores, discutimos os monumentos, discutimos a história, mas temos que pensar no conteúdo desse Jubileu, porque Monte Cassino tem sete monges, metade são velhos. 2029, vai ter monges lá? Então, nós estamos vivendo uma situação de queda demográfica muito grande na Itália e na Europa. Papa Francisco insiste em dizer que a periferia está iluminando o centro - baseado na experiência da Assembleia de Aparecida, e é verdade - mas só isso não é suficiente. Nós brasileiros, nós latino-americanos, estamos assumindo lugares, não porque está faltando europeus, mas é porque a Igreja está se abrindo à sua universalidade. Com a eleição de Papa Francisco, se percebeu que a Igreja ela não é italiana, e nem europeia. Então as duas coisas estão juntas. Temos o problema demográfico, uma queda do número de jovens, de pessoas com uma idade para a resposta a determinados serviços e ministérios na Igreja europeia. Mas por outro lado, isso está fazendo ver, enxergar, que a igreja é muito mais ampla, ela saiu do centro, que é a Europa, e sobretudo o Vaticano, né? Então isso tá sendo bastante positivo.

Na Audiência Geral da quarta-feira, 18 de setembro o Papa saiu do texto escrito e falando de forma espontânea, observou que a Igreja é muito eurocêntrica, ao constatar toda a vivacidadade e dinamismo que encontrou na Igreja na Oceania e Ásia durante sua recente Viagem Apostólica. E já falou em diversas outras ocasiões que se vê melhor a realidade a partir da periferia do que do centro...

Exatamente! A Igreja aqui ainda está muito estruturada, e também no Brasil - vamos falar a experiência do Brasil - está se correndo o risco de retornar a recopiar esta eurocentricidade - nem sei se existe essa palavra -, ao passo que, por exemplo, a Igreja brasileira deu passos importantes na inculturação da liturgia, na inculturação da fé, na inculturação até mesmo da doutrina, porém, nós temos agora o risco de um rosto dos novos presbíteros e de novas comunidades que, dizendo-se retornar à fidelidade da fé, à pureza da fé, não estão fazendo outra coisa da coisa que retornar à centralidade da Europa, e o que não é! O Evangelho é muito mais amplo, o Evangelho é experiência. Então o Papa Francisco tem sido genial nesse ponto de mostrar que a periferia está iluminando o centro e o centro está espantado. Sabe, me fez recordar um evento - eu não sei se você já estava presente aqui naquele período - foi na segunda vez que o Papa celebrou a Nossa Senhora de Guadalupe. Não a primeira Missa, a segunda Missa. Naqueles dias, aqueles quatro cardeais escreveram uma carta muito mal criada ao Papa, e em resposta - achei tão bonito aquilo  - em resposta aquela Missa de Guadalupe, 12 de dezembro, teve quase 300 concelebrantes latino-americanos. E nós, latino-americanos, éramos todos ali cantando felizes, alegres, com a alegria latino-americana. E terminou a Missa, os padres não foram para a Sacristia tirar os paramentos, os padres continuaram na igreja se abraçando, abraçando os outros, conversando, e aquela alegria contagiou todos nós. Diante de mim, tinha um grupo de europeus e perguntava: “Mas vocês são assim?”. “Sim, nós somos assim”. É por isso que a igreja é viva na América Latina. Então eles começam a perceber que esse modo de ser latino-americano, ele é iluminante, ele iluminador, e a gente tá ali falta ver lá tentando ser brasileiro, tentando ser latino-americano, dentro de uma história de mil anos, que a gente também não pode agredir, tentando com a ajuda da graça de Deus iluminar, não só a comunidade monástica, mas aquela comunidade mais ampliada que é toda aquela região das Marcas.

A presença na Audiência Geral por ocasião do Congresso dos Abades da Congregação beneditina e o encontro com o Papa Francisco.....

Então, a praxi é sempre uma audiência privada, com o grupo dos abades, mas como o Papa está no meio de duas viagens e chegou dessa viagem cansativa ali da Ásia e Oceania, acharam por bem, pela sua saúde, de não ter essa audiência privada. Porém, nós tivemos aquele lugar privilegiado e a primeira coisa que ele fez, quando passou por nós, ele olhou assim e disse: “Nunca estive no meio de tantos abades. Ai que medo!”. Depois ele fez uma brincadeira com o novo abade,  dom Jeremias, na saudação olhou assim, deu uma risadinha e disse: “E é jovem, hein!”. E depois ele fez uma foto conosco, estávamos todos ali, e nos disse dom Jeremias, quando foram saudá-lo, ele, o abade de Monte Cassino e o abade emérito, abade primaz emérito, dom Gregory Polan, que ele insistiu muito em sermos homens de paz e promotores da paz, já que é o lema da ordem de São Bento, a Pax. E estava muito preocupado com a cultura de guerra porque, a guerra está em todo lugar....Até ontem eu falava no jantar com os meus confrades monges, que comentavam somente sobre a Rússia e Ucrânia. Eu disse: “Vocês não fazem ideia do que tá acontecendo na América Latina, não fazem ideia do que acontece na África, vocês são por demais europeus”. Veja, nós brasileiros podemos dizer: o Rio de Janeiro e aquela periferia de São Paulo, o número de mortes por tiros não é diferente da Faixa de Gaza, se fizermos uma estatística, uma contagem, né? Então a coisa é muito grave. Então o Santo Padre solicitou que rezássemos muito pela paz e que ele estava muito preocupado, que os monges fossem promotores de paz, segundo a própria vocação monástica.

 

Ao final da Audiência, em sua saudação aos beneditinos, o Papa Francisco disse: “Encorajo todos a se empenharem com zelo caritativo e missionário para tornar o espírito beneditino sempre mais atual no mundo”. Na mesma linha do lema Pax e desta exortação do Santo Padre, como tornar esse espírito beneditino atual no mundo de hoje ...

Sabe, se fizemos uma leitura da vida de São Bento, escrita por São Gregório Magno, podemos ver duas coisas muito interessantes. O primeiro elemento do espírito beneditino é a unificação do homem. Bento nos deixou uma Regra com mais de 70 capítulos, que não é uma Regra religiosa. Ela se tornou a Regra dos Mosteiros do Ocidente por causa de Carlos Magno. Mas no fundo, no fundo, é uma indicação que aponta para um tipo de homem. É verdadeiramente uma escola antropológica. Quem é este homem? É o homem que está à procura de si mesmo, o homem unificado. Até na história de São Bento, e que está aqui muito próximo de nós, se nós andamos aqui uns dois, três quilômetros, temos a pequenina Basílica de San Benedetto in Piscinula, lá onde ele morou. Ele sai dali, porque Roma se tornou muito rumorosa, promíscua - ele era jovem – e sai dali e vai em direção ao silêncio, porque a promiscuidade, o rumor, o barulho, a distração, tudo isso divide o homem, tudo isso divide o ser humano - eu falo homem no sentido de ser humano -, divide o homem. E é muito interessante que ele vai em direção e se faz uma pequena parada na cidade de Enfield e leva consigo a sua empregada e um dia ela quebra uma vasilha que custava muito cara. Essa vasilha é quebrada no meio, em duas partes, e ele quando volta para casa encontra ela chorando. Essa parte feminina está ferida. E Bento, que coisa ele faz? Ele se debruça sobre aquela vasilha, no gesto de oração, e essa vasilha é unificada novamente. Então esse é o primeiro, o primeiro elemento do espírito beneditino, a unificação do homem, sermos homens unificados. Um dos grandes problemas que temos hoje é de relacionamentos entre casais, relacionamentos entre pai e filho, relacionamentos de diversos tipos ,é porque o homem estava por demais fragmentado, o homem não suporta mais viver dividido dentro de si. As guerras que estão acontecendo fora, elas acontecem primeiro dentro do homem. Então o primeiro ponto do espírito beneditino que precisa ser atualizado é o caminho de unificação, buscar juntar esses pedaços, reconciliar-se consigo mesmo. Esse é o caminho.  

E o segundo é a hospitalidade. Bento é um homem da hospitalidade. É comum os Mosteiros da nossa Ordem ter sempre uma hospedaria. Receber o outro, porque aquele que que está no caminho de unificação, ele propõe para o outro também essa mesma estrada. Carl Gustav Jung, diz que o homem, quando se permite ser curado, cura também o outro. Então a hospedaria de um mosteiro é a oportunidade de que o outro possa ser recebido na mesma estrada, de cura, de unificação. Então essa hospitalidade também pode ser pensada e atualizada numa forma de olhar o outro. Esse mundo hoje tão egoísta, egocêntrico, narcisista, não é? Parece que estamos numa cultura onde o narcisismo, não só ele é cultuado, mas ele é o centro se tudo, e se você não olha para si mesmo, não cultua a si mesmo, você não é ninguém na sociedade. São Bento, fala da hospitalidade, ele diz na Regra que todos os hóspedes devem ser recebidos como Cristo. É interessante que na nossa Regra São Bento não fala dos Sacramentos. Para ele o sacramento é o hóspede, é o Cristo que chega, que deve ser recebido, deve ser lavados os pés. Sacramento é o monge velhinho que precisa ser cuidado, precisa curar as feridas, dar atenção. Sacramento é cuidar das ferramentas do mosteiro, linha da vassoura para que o recinto seja limpo, porque o outro passa pelo corredor. Então veja que para Bento o outro, isso é, a hospitalidade, é o sacramento. Então eu diria que esses dois elementos são importantes para ser atualizado o espírito beneditino hoje, e é urgente isso.

O Jubileu, a Ordem Beneditina, a Regra de 529, que foi feita para a Abadia de Monte Cassino.... Olhando para o futuro, qual a perspectiva da espiritualidade de uma Ordem tão antiga ...

Veja bem, a Ordem de São Bento tem uma característica muito interessante. Nós somos 19 Congregações, isto é, 19 Ordens. Cada uma delas é independente, tem o seu Superior Geral, o Superior Maior, como diz o Direito Canônico, que é o Abade Presidente ou Prior Geral ou Abade Geral, cada um tem lá o seu título, e desses 19, temos como cabeça o Abade Primaz, que não tem poder de governo, mas só de representação, que nós elegemos um novo, dom Jeremias Schröder. Então, a perspectiva principal que nós temos, é cultivar a paz e atualizar a Regra dentro da característica e do carisma de cada Congregação. Porque nós não somos uniformes, isso é o que faz o diferencial da Ordem de São Bento. Já começamos pelo uso do hábito. Então se você estivesse ali no Congresso, você ia ver uma um mosaico de várias cores. Por exemplo, eu que pertenço à Congregação de Camaldole (Ordem dos Camaldulenses, ndr) uso branco com o cinto por fora. Tinha os Olivetanos que usam branco, mas o cinto por dentro; tinha a Congregação inglesa, que usa um capuz que parecia - eles brincam - orelha de elefante, é um capuz enorme; a Congregação austríaca, que não usa capuz. Então tem vários, e começa por aí a diferença. Também tem os mosteiros autônomos, que usam o rito tridentino. A Congregação de Solesmes, que é uma das maiores, boa parte conserva o rito anterior ao Concílio, é a forma extraordinária. O importante para nós é conservar essa unidade, em torno a Regra de nosso pai São Bento, cujo Jubileu vamos celebrar. Essa é a grande perspectiva, cultivar esta fraternidade, esta unidade, e ser para o mundo essa luz de paz. Essa é a perspectiva, no caminho de conversão, porque nós monges, não fazemos os votos religiosos em si, fazemos o voto de estabilidade, ser  externamente estável no mosteiro, mas sobretudo ser estável consigo mesmo, no coração de Deus - se o homem não tem essa estabilidade não pode ser monge -. O segundo voto é o voto de obediência ao Abade que é o pai e o terceiro voto que é o mais importante, o da conversão dos costumes. O monge entra na comunidade monástica, entra porque essa comunidade teve misericórdia dele e o acolheu, para seguir essa estrada de conversão dos costumes. E todos nós, segundo o carisma próprio de cada Congregação, dessas 19 Congregações, segundo os costumes próprios de cada mosteiro, segundo a interpretação que se dá à localidade - porque cada mosteiro vai ter a sua a sua interpretação local -, vivemos essa conversão dos costumes, e damos testemunhos no mundo, promovendo a paz, e atualizando este espírito de São Bento, que é a unificação do homem, e a hospitalidade, saber olhar o outro, ter essa capacidade de olhar o outro.

O Congresso dos Abades da Confederação Beneditina realizado em setembro de 2024 ....

A Confederação Beneditina nasce já há muitos anos, há mais de 100 anos, com o Papa Leão XIII, porque precisava representar a Ordem de São Bento perante a Santa Sé. Agora, como ela é articulada. Ela tem como cabeça o Abade Primaz, que é eleito entre nós. Nós éramos 226 votantes. Todos são candidatos, todos são candidatos. E uma vez eleito, se aceito, deixa o seu próprio mosteiro para se dedicar durante aquele período ao cuidado da Confederação, nós chamamos Confederação, e ele passa a residir aqui em Roma na Abadia Primacial de Santo Anselmo. O Abade Primaz faz a ligação da Ordem de São Bento com as suas - é uma Ordem de 19 Ordens, uma Ordem de 19 Congregações - faz esta ligação com a Igreja e com o Papa, e faz a ligação do Papa e da igreja com os mosteiros. Muitas vezes ele recebe a incumbência de fazer visitas, seja da parte da Santa Sé - quando existe uma situação conflituosa, uma situação delicada em um mosteiro, a Santa Sé recorre primeiramente a ele -, ou muitas vezes ele vai a convite para visitar determinados mosteiros, e isso é contínuo. Eu mesmo já o convidei, ele vai durante o período Pascal a Fonte Avellana e ele vai encontrar monges e monjas da região das Marcas e da Úmbria, faremos o encontro, para nos confirmar no caminho de São Bento, caminho da fé. Então ele tem essa tarefa, também de supervisionar, supervisionar todas as entidades que estão ligadas à Ordem de São Bento. Então nós temos entidades de diálogo ecumênico, a área da educação, escolas de mosteiros. Então tudo isso forma um ente, e que está sob a sua jurisdição de supervisão. Embora tenham presidentes próprios, mas ele é aquele que está “à frente e sobre”, então ele tem que articular, tem que estar sabendo de tudo, então é um homem de governo em nível geral. Então pensa que não é fácil, né? Ele mora em uma Abadia, nessa Abadia reside um colégio, de monges que vem do mundo todo para estudar em Roma, tem um Ateneu com Mestrado e Doutorado, embora pertença à Ordem de São Bento, mas não está sob sua ....., tem um reitor que cuida. Geralmente na Abadia de Santo Anselmo, são entorno às vezes mais de 100 monges estudantes só em Roma né? Então é toda essa articulação. Nesses dias nós discutimos tudo que envolve a nossa a nossa Ordem de São Bento, discutimos a parte educativa, discutimos a parte econômica, a solidariedade com os mosteiros mais pobres, escutamos também as dores e feridas. Por exemplo a mim, me tocou muito escutar alguns mosteiros, alguns abades falando das realidades em alguns lugares de conflitos da África, terríveis, abades da Terra Santa contando coisas inimagináveis. Depois também a presença das mulheres, que elas formam uma sociedade a parte, mas participam conosco, e de como criar, e assim também discutimos outras questões mais jurídicas, porque recentemente o Papa Francisco fez um Rescrito que permite que monges não sacerdotes possam ser abades ou priores ou até mesmo Abade-presidente. Só que o Rescrito é só uma permissão. Aí tem uma série de situações canônicas que precisam ser resolvidas. Então tudo isso é colocado ali para nós conversarmos, temos um canonista, e depois temos que votar, autorizando o Abade a vir a Santa Sé, nos dicastérios responsáveis por isso, para tentar resolver essas questões. Tudo é em forma sinodal, colegial. Eu penso que uma das riquezas da Ordem de São Bento é a sinodalidade. Um mosteiro beneditino é sempre um laboratório de sinodalidade. São Bento coloca na Regra que toda decisão deve partir de uma escuta, inclusive escutar os mais novos, aqueles que chegam, porque o Espírito Santo pode falar por meio dele também. É lógico que nós temos o Capítulo, com os professos solenes, mas outras decisões devem ser ouvidos os mais novos, não podem ser desprezados e o Congresso dos Abades também aproveita para escutar essas situações, essas feridas, mas também tomar essas decisões. E nesse Capítulo a parte principal foi a eleição do novo Abade e a partir disso, esses outros por menores jurídicos, questões internas, que precisa ter, aproveitar que estamos todos ali, e também escutar as experiências de outras comunidades que ajudam muito a gente.

Da Abadia Primacial de Santo Anselmo parte a Procissão na Quarta-feira de Cinzas, início da Quaresma, que se se dirige até a Basílica Santa Sabina...

A Quaresma aqui na cidade de Roma, na Diocese de Roma, ela começa justamente ali em Santo Anselmo. O penitenciero-mor impõe a Cinza sobre o Papa na Basílica de Santa Anselmo e depois segue um pequeno trajeto, mas muito simbólico, com monges e com os padres dominicanos, iniciando esse período de preparação para a Páscoa. São Bento, diz que que a vida do monge deve ser uma eterna Quaresma. Não porque deve ser uma dimensão negativa de fazer penitência, mas uma contínua Quaresma quer dizer um contínuo caminho verso a Páscoa, em direção à Páscoa. Então só para rebater aqueles dois pontos do espírito beneditino, da unificação e da hospitalidade, isso não é outra coisa, senão pascalização da vida. O monge é um homem que busca a unificação e a unificação só é possível quando a minha vida ela é pascalizada em todas as suas dimensões, em todas as suas áreas, sem nenhuma cisão sem nenhuma separação de corpo e de alma, porque tudo foi redimido. Então o monge é aquele que vai absorver na Páscoa em tudo, na sua vida.

Um pedido: rezar pela vida monástica...

Olha, eu só peço aos ouvintes que rezem também pelos monges, né? Porque as pessoas têm aquela ideia do monge é aquele que fica trancado no mosteiro e reza pelos outros, né? É uma coisa coletiva, mas eu acho que nós precisamos, vivemos em comunhão dos Santos, então reze também pela vida monástica, reze por aqueles que escolheram esse caminho, nós precisamos muito do apoio e do apoio espiritual de tantos leigos e leigas, para que possamos ser fiéis à nossa promessa, ao nosso chamado. É isso que eu gostaria de pedir.

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03 outubro 2024, 09:56