A caravana, composta por representantes do CNDH, de organizações da sociedade civil e universidades, percorreu cerca de 1.200 km, com visitas a cinco comunidades de Pernambuco e Paraíba. A caravana, composta por representantes do CNDH, de organizações da sociedade civil e universidades, percorreu cerca de 1.200 km, com visitas a cinco comunidades de Pernambuco e Paraíba.   (Caritas)

Comunidades impactadas por mega projetos visitadas pela Cáritas NE2, CNDH e outras organizações

Após visita às comunidades afetadas em Pernambuco e na Paraíba, o Conselho Nacional de Direitos Humanos recomenda regulamentação do setor e revisão imediata dos contratos.

Empreendedores de parques eólicos e solares deverão apresentar estudos de impacto social, modelos de contrato e um plano de adequação à Resolução nº 5/2020 do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, que estabelece diretrizes para uma política pública sobre direitos humanos e empresas. Estas são apenas algumas das recomendações do Conselho Nacional de Direitos Humanos – CNDH em relatório publicado após constatar diversas violações aos direitos das comunidades e ao Meio Ambiente em parques de geração de energia renovável de Pernambuco e da Paraíba.

Realizada entre o final de agosto e o início de setembro, a Missão CNDH é mais um passo importante na luta das comunidades que têm sido impactadas pelos empreendimentos de geração de energia renovável e é consequência direta de denúncia apresentada pela mo no Cáritas Brasileira Regional Nordeste 2 e Comissão Pastoral da Terra Regional Nordeste 2. O relatório produzido também incorpora, entre suas recomendações, propostas que, há vários anos, vêm sendo pautadas pelas organizações sociais, com destaque para a necessidade de regulamentação da atividade.

Para Daniel Lins, assessor jurídico e de incidência política da Cáritas Brasileira Regional Nordeste 2, as normativas que regulamentam o processo de licenciamento de empreendimentos de geração energia renovável precisam ser reformadas. “A resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA que estabelece as regras para a instalação desse tipo de empreendimento é ultrapassada e extremamente simplificada. Foi elaborada em um contexto em que se pretendia atrair as empresas desse ramo diante das riquezas naturais do Brasil e desconsidera os impactos que isso geraria para as comunidades e os biomas, considerando, na altura, como empreendimentos de baixo impacto ambiental”, afirma.

A Missão CNDH é mais um passo importante na luta das comunidades que têm sido impactadas pelos empreendimentos de geração de energia renováve
A Missão CNDH é mais um passo importante na luta das comunidades que têm sido impactadas pelos empreendimentos de geração de energia renováve

Impactos socioambientais

 

A caravana, composta por representantes do CNDH, de organizações da sociedade civil e universidades, percorreu cerca de 1.200 km, com visitas a cinco comunidades de Pernambuco e Paraíba. Em todos os territórios, foi possível perceber o que já vinha sendo denunciado pelas organizações: a forma predatória com que os parques de energia renovável têm avançado sobre as comunidades. Um caso muito emblemático acontece no município de Caetés, em Pernambuco.

Pesquisa realizada pela UFPE e Fiocruz com 105 moradores, impactados por 83 torres, revela que 63% tomam alguma medicação para dormir ansiolítico ou para hipertensão e 49% relatam alergias causadas pelo material particulado branco que é liberado pelas torres. Os pesquisadores citam ainda vários outros impactos aos sistemas cardíaco, respiratório e nervoso causados pela exposição aos ruídos, inclusive infrassônicos.

Somem-se a esses os efeitos ambientais, alterações na água, na fauna e na vegetação, bem como na agricultura e criação de animais – o que afeta a segurança alimentar das famílias. “A galinha não choca mais, os animais ficaram atormentados, mudaram o comportamento. As vacas não dão mais leite. Acabou com a nossa vida”, relata um dos moradores.

No município, a licença para operação de algumas empresas já expirou e outras estão prestes a encerrar. A do Complexo Eólico de Santa Brígida, por exemplo, expirou em outubro de 2023. A do complexo Ventos de São Clemente está expirando. A de Serra das Vacas expira em janeiro de 2025. Todas continuam atuando. “Para a renovação dessas licenças, é fundamental que os órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental façam uma análise criteriosa e obriguem as empresas a resolverem as irregularidades constatadas”, opina Daniel.

Contratos abusivos

 

É que, além dos danos à saúde e ambientais causados pelos empreendimentos, a visita evidenciou o desequilíbrio da relação contratual entre as empresas e os arrendatários. Segundo expõe o relatório, “os contratos são formulados com cláusulas de sigilo e de renovação automática, sem informação e orientação jurídica para quem assina e sem clareza quanto à responsabilidade de indenizar e compensar as comunidades pelos prejuízos e impactos”.

Além disso, os contratos apresentam dispositivos que restringem parcial ou totalmente o acesso à propriedade, não havendo previsão de ressarcimento do que o produtor deixou de produzir. As indenizações oferecidas pelas empresas são irrisórias, sobretudo diante dos impactos relatados pelas comunidades afetadas.

O CNDH recomenda que os contratos sejam revisados de imediato. Solicita que não tenham longo prazo de duração nem cláusula de renovação automática e que seja garantida revisão a cada cinco anos. Também orienta que deverão prever contrapartida pelo uso da terra do agricultor a um percentual de pagamento mensal, ao menos em 6%, além de um piso mínimo fixo. Os agricultores também devem ser indenizados, enquanto durar o contrato, por lucros cessantes em função das restrições ao uso da terra. E parte da produção da energia deve ser destinada às comunidades.

O relatório produzido também destaca entre suas recomendações, a necessidade de regulamentação da atividade.
O relatório produzido também destaca entre suas recomendações, a necessidade de regulamentação da atividade.

É hora de regulamentar

 

As recomendações também se dirigem a diversos agentes e instituições públicas. Ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), sugere a revisão e regulamentação da atividade, fundamentada em estudos técnicos e com ampla participação da sociedade. À Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), solicita a regulamentação e fiscalização na instalação de parques eólicos e solares.

Aos órgãos ambientais federais e estaduais, solicita que sejam exigidos, como condição para a concessão de Licença Prévia, o “Processo Administrativo Especial de Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado”; Estudo do Componente Quilombola, Indígena e de Comunidades Tradicionais; Matriz de Impactos; e Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).

Para garantir o cumprimento das recomendações, o relatório solicita a intervenção dos órgãos de justiça, incluindo o Ministério Público Federal e estaduais e defensorias públicas, para que sejam apuradas as violações, fiscalizados os danos socioambientais e ajuizadas ações de reparação. Também recomenda que sejam ajuizadas ações anulatórias e revisionais dos contratos de arrendamento celebrados de forma violadora aos direitos das comunidades, além de que sejam implementadas medidas para coibir novas abordagens assediadoras.

Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, assine a nossa newsletter clicando aqui e se inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui

20 novembro 2024, 14:53