Bangladesh: a destituição de Sheikh Hasina afeta interesses da Índia na região
A destituição de Sheikh Hasina Wazed, ex-primeira-ministra que esteve no poder durante 15 anos em Bangladesh, tem importantes repercussões geopolíticas regionais. Em uma primeira leitura, a Índia parece ter perdido um precioso aliado.
A ex-primeira-ministra, de fato, provém de uma família que reivindica a primogenitura da independência do então Paquistão oriental daquele ocidental, para formar o atual Bangladesh em 1971.
O pai de Sheikh Hasina, Sheikh Mujibur Rahman, foi o líder do governo provisório do recém-nascido Estado, cujo nascimento havia sido apoiado pela Índia, promovendo guerra em Karachi (esta foi a terceira guerra indo-paquistanesa depois daquela de 1948 e 1965).
O Xeque Mujibur Rahman havia estabelecido estreitas relações com a Índia, mas foi morto em 1975 num golpe militar que resultou no extermínio da sua família. Apenas Sheikh Hasina e sua irmã Sheikh Rehana, que visitavam a República Federal da Alemanha, escaparam da morte.
Sheikh Hasina encontrou refúgio temporário na Índia (país que a acolheu novamente após a sua destituição em 5 de agosto) e depois regressou ao Bangladesh, onde alternou o papel de líder da oposição com o de primeira-ministra.
Nos seus últimos 15 anos como primeira-ministra, Sheikh Hasina tentou adotar uma política de boa vizinhança tanto com a Índia como com a China, os dois gigantes vizinhos. A premier foi forçada a demitir-se com a revolta que seguiu-se quando, em 6 de junho, a Suprema Corte dr Bangladesh decidiu reintroduzir o sistema de quotas nos cargos públicos, que atribui 30% dos cargos aos descendentes dos "freedom fighters” (“combatentes pela liberdade”) da guerra em 1971.
A sua destituição do poder é vista na Índia como um enfraquecimento da influência de Nova Deli no país, em benefício do Paquistão e da China.
A confirmar as preocupações indianas está a violência contra a minoria hindu alegadamente instigada pelo Jamaat-e-Islami, um partido islâmico inspirado na Irmandade Muçulmana, que se opôs à divisão do Paquistão e à consequente independência do Bangladesh. O partido, por meio do seu movimento estudantil (Islami Chhatra Shibir, ICS), participou nos protestos sobre as quotas e foi banido pelo governo de Hasina em 1° de agosto.
A filial bengali do Jamaat-e-Islami (existe de fato uma filial paquistanesa e outra indiana) manteve laços importantes com o governo em Islamabad. A imprensa indiana, em particular, acusa o ISI, o poderoso serviço secreto paquistanês, de ter transmitido os seus próprios fundos de origem chinesa aos estudantes revoltosos (e especialmente aos do ICS) para alimentar os protestos e derrubar Sheikh Hasina. As acusações ainda não foram provadas, mas o governo indiano está certamente preocupado com a violência contra a comunidade hindu bengali e teme que o seu vizinho possa tornar-se uma base para atividades desestabilizadoras nos Estados orientais da Federação.
Mas as suspeitas de Nova Deli não se limitam ao Paquistão e à China. A atitude dos Estados Unidos também é vista com certa desconfiança pelo lado indiano; desde o denunciar as eleições de Bangladesh no início deste ano (vencidas por Hasina) como "não livres e justas" até uma declaração oficial de "boas-vindas ao governo interino em Dhaka" poucas horas depois de Hasina ter fugido do país. E também ao próprio fato de a antiga primeira-ministra ter tido o seu visto de entrada revogado tanto na Grã-Bretanha como nos Estados Unidos. Se para Londres, que enfrenta confrontos internos entre extremistas supremacistas brancos e extremistas islâmicos, esta medida pode ter sido tomada para evitar jogar mais lenha na fogueira na frente interna, para Washington isto pode ser enquadrado na política tradicional de círculos ligados às administrações democráticas de buscar entendimento com movimentos islâmicos, não só nos países árabes, mas também no resto do mundo.
*Agência Fides
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