“O Papa acredita na ONU, desde que siga uma lógica planetária”
Francesca Sabatinelli - Vatican News
Francisco e a impotência das Nações Unidas: após as palavras do Papa na Audiência geral da última quarta-feira (06), no Vaticano, tenta-se interpretar a função da ONU. No entanto, as palavras do Pontífice, segundo alguns observadores, não pretendem ser uma crítica, mas "um auspício de Nações Unidas".
A este respeito, Roberto Morozzo, docente de história contemporânea na Universidade de Roma3 e membro da Comunidade romana de Santo Egídio, explica: "A ONU, nesta guerra (Rússia-Ucrânia), parece não ter nenhuma função, mas, o Papa acredita fortemente nas Nações Unidas, porque considera esta Organização uma Assembleia suprapartidária, como se pode deduzir das suas palavras. O Papa é difidente das grandes potências, que devem ser citadas pelo próprio nome: Rússia, Estados Unidos, China. Ele prefere uma assembleia multinacional, como as Nações Unidas, que parecem mais equilibradas”. A visão de Francisco de uma política mundial multipolar não é uma novidade, na opinião do professor, mas deve ser “encarnada pela própria ONU; o Papa prefere uma lógica planetária, que corresponda à que deveria ser adotada pelas Nações Unidas. Embora o Conselho de Segurança ainda seja composto pelas potências vitoriosas da II Guerra Mundial, não significa que a Assembleia Geral não representa o mundo inteiro”.
O grito de Paulo VI: “Guerra, nunca mais”!
Em 1965, o Papa Paulo VI interveio na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque. Era a primeira vez de um Pontífice. Depois dele, também João Paulo II falou duas vezes, seguido de Bento XVI e Papa Francisco, em 2015. O grito do Papa Montini, na sede da ONU, ficou indelével na história: “Guerra, nunca mais”! No entanto, hoje, o Papa enfatiza a sua impotência, segundo o Prof. Morozzo: "Houve uma expansão nas operações de paz e intervenções sobre a paz, mas também, sem dúvida, um maior compromisso e também uma mudança, devido ao fim da lógica da Guerra Fria, em 1989. Entretanto, hoje, parece que a guerra fria tenha sido retomada, mais uma vez, com maior força, tanto nas relações entre EUA-China e EUA-Rússia. Todavia, nas últimas décadas, as principais guerras, como no Iraque, Afeganistão e agora Ucrânia, não contaram com uma intervenção determinante da ONU; mas, não é fácil também para as nações prevenir e domar os surtos de guerra”.
A ONU de Trastevere
A Comunidade de Santo Egídio, situada no bairro romano de Trastevere, foi definida, muitas vezes, como a “ONU de Trastevere” pelo seu papel de mediação em conflitos dramáticos, sobretudo naquele de Moçambique, como afirma o professor Roberto Morozzo: “Santo Egídio sempre foi mediadora de paz entre as partes em conflito, levando-as a uma negociação e um desfecho positivo. Se transferirmos esta lógica à ONU, para que seja reconhecido seu papel de mediadora e de artífice da paz, teríamos que nos perguntar: como induzir ambas as partes a chegar a um compromisso de paz? Isso é algo realmente difícil”. Para se construir a paz, segundo a tese do Prof. Morozzo, é preciso evitar a lógica de uma paz ligada a uma vitória: "A paz é paz e não necessariamente uma vitória! Isso, porém, deve ser entendido por todos os que se preocupam com as vítimas, sobretudo com os civis desta guerra".
Ocidente contra a Rússia
Enfim, um acordo de paz, - neste caso entre a Ucrânia e a Rússia, - só será possível quando “ambas as partes quiserem, legitimamente”, pois, enquanto apenas uma das partes estiver ciente da vitória, não se chegará a nenhum acordo. Neste caso, para exercer uma mediação de paz, as Nações Unidas “precisam, fortemente, ser apoiadas por todas as potências, começando pela China e Estados Unidos e, depois, também pela Grã-Bretanha e França, que também fazem parte do Conselho de Segurança da ONU. Mas, isso não é um dado de fato, infelizmente, porque, neste momento, parece que estamos assistindo um conflito entre o Ocidente e a Rússia”.
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