Gallagher: diplomacia da Santa Sé chamada a garantir a comunhão das diferenças
Tiziana Campisi – Vatican News
Uma cidade que "ao longo de seus mais de dois milênios de história" amadureceu "uma sensibilidade particular para a paz", "aprendendo a resolver os desacordos que emergem das diferenças culturais, linguísticas e étnicas". Palavras do arcebispo Paul Richard Gallagher, secretário para as Relações com os Estados e as Organizações Internacionais, ao descrever Aquileia, onde foi convidado para a comemoração litúrgica dos santos Hermágoras, bispo, e Fortunato, diácono, mártires de Aquileia e patronos da arquidiocese de Gorizia e Triveneto, para proferir uma lectio magistralis sobre o tema "Aquileia Magistra Pacis - Um contraponto à diplomacia da Santa Sé".
Os conflitos de hoje
Uma diplomacia, a da Santa Sé, fortemente empenhada em pôr fim aos "conflitos em curso": da Ucrânia à Palestina, Israel, Azerbaijão, Mianmar, Etiópia, Sudão e Iêmen. O prelado deixou claro que a Santa Sé "sempre se mobiliza como sujeito super partes", buscando "unir ideias divergentes, posições políticas opostas, visões religiosas" e "ideologias diferentes", promove a paz no "respeito às normas internacionais" e aos direitos humanos fundamentais e "é ativa em nível humanitário", por exemplo, "para facilitar a repatriação de crianças ucranianas e a troca de prisioneiros de guerra entre a Rússia e a Ucrânia, bem como para incentivar a libertação de reféns israelenses na Faixa de Gaza". Do presente para o passado, em sua palestra, Gallagher reatou os fios da história começando com a fundação de Aquileia em 181 a.C. Já naquela época, disse, a cidade se distinguia "como uma extraordinária encruzilhada cosmopolita de povos e ideias" e facilitava "a difusão de influências artísticas, culturais e cultuais", que eram "retrabalhadas e readaptadas" ao seu próprio contexto, lembrou o arcebispo, acrescentando que mesmo na era cristã a cidade se distinguia por "sua extraordinária vocação para a concórdia dos povos". Também foi de Aquileia que o cristianismo se espalhou "para as terras vizinhas, entrando gradualmente em contato com povos e culturas heterogêneos", unindo-os e produzindo frutos "em todos os campos do pensamento, da espiritualidade e da arte". Tudo isso gerou "um espírito de acolhimento e coexistência", "a arte do diálogo e do confronto" e "a capacidade de aproveitar ao máximo os estímulos provenientes de fora".
O espírito de Aquileia e a diplomacia do Vaticano
"A longa história de coexistência, encontro e diálogo desta área fronteiriça, apesar das profundas feridas infligidas no coração das pessoas pelos desvios de nacionalismos exasperados", é um "exemplo maduro de fraternidade universal", disse Dom Gallagher, ao qual "a Europa de hoje deveria continuar a se inspirar para semear a paz com paciência e confiança". Gallagher, em seguida, voltou seu olhar "para o atual contexto internacional", onde "diante da violência e do recurso desenfreado às armas como meio de resolver disputas, as diplomacias estão lutando para realizar sua tarefa tradicional de mediação", muitas vezes relacionada aos fatos, mas sem ter trabalhado nas causas ou naquelas "situações culturais, sociais, étnicas e religiosas" que geram conflitos.
Acompanhar os que desejam a paz
Em tal cenário, "a diplomacia do Papa, ao mesmo tempo em que se apresenta como uma realidade estruturada de acordo com as normas do direito internacional, age como uma força moral desprovida de ambições geopolíticas, cuidadosa para não ceder a interesses partidários", explicou o arcebispo, e em todo caso não indiferente "às expectativas e às necessidades concretas das pessoas, ao grito desesperado dos frágeis e dos descartados", dos quais se torna "voz e eco". Portanto o interesse da Santa Sé é acompanhar todos aqueles que aspiram a paz e buscam a reconciliação, e por isso "os traços distintivos do espírito de Aquileia" podem ser encontrados "na atitude do diplomata papal de favorecer o diálogo com todos", sublinhou o Secretário para as Relações com os Estados, "inclusive com aqueles interlocutores considerados inconvenientes ou não legítimos para negociar", ou em sua propensão a usar ao máximo a humildade e a paciência para desatar nós aparentemente inextricáveis". A atividade diplomática da Santa Sé, na prática, por um lado, "intervém para garantir a liberdade da Igreja, por outro", continuou Gallagher, "se propõe a colaborar com os Estados e as organizações internacionais na solução dos grandes problemas da humanidade", trabalhando para salvaguardar os direitos humanos fundamentais e "para a afirmação dos mais altos valores morais e sociais".
Migração ao longo da rota dos Bálcãs Ocidentais
A abertura e a acolhida "de diferentes povos e culturas" que distinguiram Aquileia, nos estimula a refletir sobre a crise migratória ao longo da rota dos Bálcãs Ocidentais", afirmou ainda Dom Gallagher, convidando a refletir sobre as milhares de pessoas que "tentam cruzar as fronteiras" fugindo de perseguições, guerra, conflito ou miséria para encontrar novas oportunidades de existência ou um refúgio seguro". Porém diante delas são construídos muros e não está sendo feito nenhum esforço para considerar as oportunidades que a migração pode oferecer "para o crescimento de sociedades mais inclusivas". A Santa Sé propõe aos governos e à sociedade civil a acolhida, a proteção, a promoção e a integração dos estrangeiros, e isso, concluiu o prelado, requer o envolvimento de "todos os atores envolvidos, inclusive as comunidades religiosas".
Personalidades dedicadas ao diálogo e à mediação
Por fim Dom Gallagher recordou como "o espírito de Aquileia" forjou "personalidades dedicadas ao encontro, ao diálogo e à mediação", entre elas "clérigos brilhantes originários de Friuli Venezia Giulia" que serviram a Santa Sé em diferentes partes do mundo. Deve-se mencionar, entre os séculos XIX e XX, o Dom Luigi Faidutti e o Arcebispo Antonino Zecchini, que viveram "no complexo panorama religioso e político das recém-nascidas Repúblicas Bálticas", o Cardeal Celso Costantini, "cujas marcantes habilidades diplomáticas o tornaram um paciente tecelão das relações entre a Santa Sé e a China", e o Cardeal Guido Del Mestri, que contribuiu "para a chamada Ostpolitik vaticana". Trata-se de figuras que "permitem apreender as consonâncias entre o patrimônio de valores agregadores que remontam ao espírito de Aquileia e os traços da diplomacia da Santa Sé", observou o arcebispo, que em vários contextos é chamada a garantir a "comunhão das diferenças", "desarmando as contendas e tecendo a concórdia", na "convicção de que o fechamento e o isolamento produzem sociedades asfixiadas, incapazes de respirar o oxigênio do diálogo e do encontro, premissas sólidas para a autêntica construção da paz".
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